Intervenção de Padre Constantino Alves, Seminário «Direitos dos trabalhadores e contratação colectiva»

Contratação colectiva e direitos dos trabalhadores

Saúdo todos os presentes neste colóquio e agradeço o convite que me foi formulado.

Este tema é muito importante. Nele se incluem direitos básicos para a vida e dignidade dos trabalhadores.

Guardo a lembrança muito gratificante de uma dezena de anos em que assumi funções sindicais no âmbito do Sindicato dos metalúrgicos do sul na década 80.

Nesses tempos também muito difíceis a contratação colectiva e as convenções colectivas de trabalho expressões de liberdade de associação e negociação, frutos da revolução do 25 de Abril de 1974 ainda enquadravam a maior parte dos trabalhadores e consignavam direitos laborais e sociais relevantes e a correlação de forças permitia em certas empresas desenvolver processos reivindicativos complementares.

1- Traços de caracterização do estado actual da negociação colectivas

A negociação colectiva elemento central da democracia e um mecanismo de justiça social está a ser posta em causa pela desestruturação das dimensões colectivas associadas ao trabalho e pelas politicas de austeridade.

A vaga de austeridade neoliberal observada na Europa na sequência da crise financeira internacional e as politicas implementadas em Portugal no período de intervenção da troika visaram a desvalorização salarial desregulação da legislação social e enfraquecimento significativo das componentes do regime de emprego e do sistema de relações laborais que em Portugal se distinguiam para melhor, do modelo liberal.

Paradoxalmente os ricos ficaram mais ricos e os pobres mais pobres.Um dos factores do aprofundamento das desigualdades sociais está na transferência de cerca de 2 mil milhões de euros dos rendimentos dos trabalhadores e das suas familias para o capital, em parte devido aos bloqueios à contratação colectiva e à não publicação das convenções colectivas de trabalho.

Todos os dias conheço trabalhadores e suas famílias incapazes de fazerem face às necessidades primárias da alimentação, água, luz, rendas de casa, saúde...uma precarização generalizada.

Alguns dados:

No ano 2000, 1 milhão e oitocentos trabalhadores estavam enquadrados em convenções colectivas de trabalho e em 2013 cerca de 343000.

Desrespeito pela autonomia negocial entre as partes tendo o governo congelado a publicação de convenções colectivas celebradas com 350 entidades.

Reduz-se a sobrevigência das convenções colectivas de 5 para 3 anos e abre-se a possibilidade da sua suspensão em situação de crise das empresas.

Descentraliza-se a negociação colectiva para as comissões de trabalhadores e a possibilidade das convenções colectivas de trabalho derrogarem a fixação das normas em certas matérias incluindo as salariais para a negociação ao nivel das empresas.

Por via destas politicas e das medidas de reconfiguração das relações de trabalho já detalhadas no memorandum de 2011 operou-se não só uma significativa transferência dos rendimentos do trabalho para o capital mas também um alteração das relações de poder capital/trabalho a favor do capital.

Algumas das medidas:

Reduções:

- tempo e duração do subsidio de desemprego.

- número de trabalhadores abrangidos pela negociação colectivas

- compensação por despedimento e por facilitação do despedimento.

- flexibilização do tempo de trabalho e embaratecimento do tempo extra.

- fixação de salários e congelamento de remunerações e carreiras.

Consequências:

- empobrecimento dos portugueses enfraquecimento do Estado social e a fragilização negocial dos trabalhadores.

Sinais de esperança:

- as lutas sociais.

- 5 greves gerais de 2010 - 2013 e outras formas de luta enquanto nos 35 anos anteriores se realizaram só 5.

Esta era marcada pela vaga de austeridade e empobrecimento tem vindo acompanhada duma Nova era uma era de mudança com a emergência de novos movimentos sociais que abrem a possibilidade de novas alianças, como vimos em grandes lutas nacionais como por ex “Que se lixe a troika”.

Desafios:

O Movimento sindical deve desenvolver um debate muito profundo no seu seio sobre a contratação colectiva mas articulado com a agenda politica ou partidária com a academia e com a sociedade para que possa aprofundar e credibilizar os seus projectos e potenciar a cooperação com a sociedade civil movimentos sociais, culturais ou religiosos. Refiro por exemplo a opção pelos pobres está no centro do Evangelho.

Temas como a dignidade da pessoa humana e a centralidade do trabalho digno poderão facilmente aglutinar estas diferentes entidades e constituirem-se como centro de alianças.

A contratação colectiva alicerçada na centralidade do trabalho e na dignidade da pessoa humana deverá defender os direitos à vida familiar ao descanso à cultura evitando-se o risco de cair numa lógica individual ou corporativa, economicista e consumista.

A construção da unidade dos trabalhadores com a convergência sempre que possível em interesses e denominadores comuns.

Uma palavra final:

Este sistema capitalista neoliberal que faz a idolatria do dinheiro e a lógica do lucro egoísta com a autonomia absoluta dos mercados já não se consegue aguentar já não é capaz de criar trabalho. Temos de mudá-lo. Continuemos a sonhar e a lutar por uma sociedade de seres humanos livres e iguais.

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