Declaração de João Oliveira, Presidente do Grupo Parlamentar, Conferência de Imprensa

Combater o Orçamento do Estado, derrotar o governo, construir uma política patriótica e de esquerda

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A proposta de Orçamento do Estado para 2014 apresentada pelo Governo PSD/CDS constitui um passo significativo na agudização da crise, mantendo intocáveis os objectivos de agravamento do roubo dos trabalhadores e reformados e reconfiguração do Estado à medida da banca e dos grandes grupos económicos.

Esta proposta de OE assume, tal como as duas anteriores, o confronto com a Constituição e a conceção de democracia nela inscrita.

Ao contrário do que a propaganda do Governo procura fazer crer, não há nesta proposta de Orçamento do Estado qualquer repartição equitativa de sacrifícios entre o Trabalho e o Capital. Não há sequer distribuição de sacrifícios.

Todos os sacrifícios resultantes desta proposta de Orçamento recaem sobre os trabalhadores e o povo, continuando o produto do saque a ser distribuído pela banca, os especuladores e os grandes grupos económicos.

Agravam-se as medidas de roubo nos salários e nas pensões adotadas nos orçamentos do Estado de 2012 e 2013. Se no OE 2013 o roubo de salários e pensões foi agravado pelo “enorme” aumento da carga fiscal em sede de IRS (cerca de 3.000 milhões de euros adicionais relativamente a 2012), em 2014 o agravamento é consumado através de um corte adicional de salários e pensões (que se acumula ao roubo por via do IRS – 3.300 milhões de euros a mais do que em 2012).

A par disso, agravam-se as medidas de ataque aos trabalhadores da administração pública, correndo em paralelo com o Orçamento do Estado um conjunto de outras medidas gravosas para os trabalhadores e reformados como o aumento do horário de trabalho para as 40 horas, o corte das pensões da CGA através da designada convergência e os despedimentos, diretamente ou por intermédio da designada requalificação.

Cerca de dois terços (2.211 milhões de euros) do valor das chamadas medidas de consolidação orçamental são suportadas diretamente por cortes nos salários e nas pensões dos funcionários públicos, trabalhadores das empresas públicas e aposentados da CGA, afetando 685.000 trabalhadores do Estado (90%) e 302.000 aposentados da CGA (50%). Se a estes cortes somarmos as medidas que afetam as funções sociais do Estado, então 82% (3.200 milhões de euros) da consolidação orçamental é obtida à custa dos trabalhadores, reformados e pensionistas.

Ao mesmo tempo, o esforço adicional exigido à banca (50 milhões de euros) e ao setor energético (100 milhões de euros) representa apenas cerca de 4% dessa consolidação orçamental, um pretenso sacrifício certamente mais que compensado com as medidas relativas à reforma do IRC e outras prebendas em preparação.

Esta proposta de Orçamento do Estado constitui ainda um passo agravado na reconfiguração do Estado à medida dos interesses da banca e dos grandes grupos económicos, à custa dos rendimentos dos trabalhadores e em prejuízo dos direitos sociais – saúde, educação e segurança social - e laborais e da própria democracia. É um novo desrespeito pela Constituição.

Este é um Orçamento que impõe um Estado mínimo para os trabalhadores e as famílias e um Estado máximo para o grande capital.

A pretexto da necessidade de redução do défice, impõem-se cortes brutais nas funções sociais do Estado, particularmente na saúde (-9,4%, menos 848 milhões de euros) e na educação (-7,1%, menos 570 milhões de euros) que acumulam aos já efectuados nos últimos dois anos.

Em sentido contrário a estes cortes regista-se a evolução dos juros da dívida pública que aumentam para 7.324 milhões de euros.

A confrontação destes números demonstra claramente que, contrariamente ao que afirma a propaganda governamental, o Pacto de Agressão foi assinado, não para evitar que o Estado ficasse sem dinheiro para pagar salários e pensões, mas para garantir que os credores nacionais e estrangeiros receberiam o capital e os juros da dívida pública até ao último cêntimo.

Anuncia-se um corte de mais 1.000 milhões de euros no investimento público, no que pode ser considerado uma política de marcha atrás no desenvolvimento das infra-estruturas, bens e equipamentos públicos. Com a agravante de, para além das consequências imediatas - desemprego, recessão -, condicionar fortemente o futuro do país que ficará ainda mais atrasado e dependente.

Mantém-se a intenção de prosseguir o programa de privatizações/concessões, designadamente nos sectores dos transportes, água e saneamento, resíduos, energia e portos e outros benefícios continuarão a ser canalizados para o grande capital.

Aumentam os encargos líquidos com as PPPs que quase duplicam (de 869 para 1.645 milhões de euros), a que se somarão eventuais encargos com os contratos swap celebrados entre empresa públicas e o Banco Santander.

É de salientar que o acréscimo de encargos com as PPPs (776 milhões de euros) é superior à redução da despesa resultante do corte das pensões a 302.000 aposentados da CGA (728 milhões de euros).

A alteração ao Código do IRC é apresentada com o argumento do apoio às MPME's mas tem, de facto, apenas a preocupação de isentar o grande capital de impostos. Se a intenção fosse apoiar as MPME teriam tomado a decisão de baixar, por exemplo, a taxa do IVA para a restauração, sobre a qual nada se diz.

A redução da taxa do IRC sucessivamente ao longo de 4 anos traduzir-se-á numa diminuição acentuada da receita fiscal (em 2014 de, pelo menos, 70 milhões de euros) mas os benefícios dessa redução da taxa do imposto far-se-ão sentir nos lucros dos grandes grupos económicos e da banca, não beneficiando a generalidade das MPME.

É de salientar que esta descida do IRC ocorre em paralelo com a manutenção em valores muito elevados do IRS. Se em 2011 os trabalhadores portugueses já pagavam de IRS quase o dobro do IRC pago pelas empresas, em 2014 o IRS será quase o triplo do IRC. Esta é também uma marca da política de classe deste Governo.

Acresce ainda, no que diz respeito aos benefícios à banca, que o OE dá ao Governo autorização para garantir emissões de dívida realizadas pelas instituições de crédito no montante de 24.670 milhões de euros, mais 2,28% do que em 2013 (+550 milhões de euros), quando o stock da dívida garantida pelo Estado à banca é já de 14.475 milhões de euros.

A proposta de Orçamento do Estado constitui ainda um logro programado nos objetivos que aponta em relação à evolução da situação económica e social do país.

O sucessivo incumprimento dos objetivos de consolidação orçamental – a redução do défice orçamental e da dívida pública –, quase que proclamados pelo Memorando da Troica como um desígnio nacional, não constitui um problema para o Governo e para a Troica. Na realidade, a manutenção do défice acima dos 3% e da dívida pública (muito) acima dos 60% constitui o pretexto ideal para se ir impondo a política de saque
aos rendimentos do povo português, com a cobertura do Pacto de agressão ou com a mesma cobertura numa diferente designação de programa cautelar ou segundo resgate. Esta leitura é sustentada pelo facto de, desde a assinatura do Pacto de Agressão, terem sido impostos 20.000 milhões de euros de medidas de austeridade contra os trabalhadores e portugueses em geral, sem que o défice tenha diminuído significativamente (de -4,4% em 2011 para -4,0% em 2014).

Na proposta de OE 2014, o Governo prevê um crescimento do PIB de 0,8%. Tal como em 2013, esta estimativa é propositadamente otimista ao não ter devidamente em conta os efeitos recessivos da austeridade.

Igualmente não parece ter fundamento a perspetiva de crescimento do investimento, nem a procura externa líquida parece justificar a passagem da recessão de -1,8% para um crescimento de 0,8%, já que o crescimento das exportações desacelera e o das importações acelera.

Ainda que se verificasse o crescimento previsto pelo Governo, esse crescimento sempre seria anémico e não se traduziria nem em mais emprego, nem num acréscimo da qualidade de vida dos trabalhadores, sobretudo se acompanhado de duríssimas medidas de redução dos rendimentos e dos direitos desses mesmos trabalhadores. Num quadro de aprofundamento do desequilíbrio na distribuição de riqueza entre o trabalho e o capital – a favor deste último – um crescimento do PIB continuaria a reverter a favor do capital.

Tal como em 2013 – em que, apesar do enorme aumento de impostos e demais medidas de austeridade, a redução do défice se deverá cifrar em apenas 863 milhões de euros – o objetivo de redução do défice não será provavelmente atingido, mas permitirá ao Governo justificar mais uma brutal redução de rendimentos dos trabalhadores, e em especial dos trabalhadores e aposentados da Administração Pública, assim como cortes adicionais nas funções sociais do Estado.

Quanto à dívida, o próprio Governo reconhece que vai continuar a aumentar em termos nominais, embora aponte para uma redução em percentagem do PIB, previsão sem qualquer credibilidade.

Constata-se ainda que as previsões do Governo estimam um agravamento do desemprego face a 2013 para 17,7%, certamente subestimadas mas ainda assim mantendo-se num nível muito elevado, com todas as consequências que essa realidade acarreta em termos sociais mas também de desaproveitamento de capacidade produtiva do país.

Propostas a apresentar pelo PCP

Recusando as opções políticas assumidas pelo Governo PSD/CDS, o PCP apresentará um conjunto de propostas de alteração ao Orçamento do Estado que afirmem a política alternativa, patriótica e de esquerda de que o país necessita para sair da grave situação em que se encontra, assumindo como elemento indispensável para a sua concretização a ruptura com o Pacto de agressão e a política de direita.

Propostas que defendam os salários, as pensões e as prestações sociais, que defendam as funções sociais do Estado como elemento essencial para a concretização de uma democracia nas suas múltiplas dimensões política, económica, social e cultural.

Propostas que apontem uma outra política económica mas também uma mais justa redistribuição da riqueza.

Recusando o condicionamento da redução do défice acordada entre o Governo e a troica, e reafirmando que essa meta para o défice de 4% do PIB é apenas o pretexto para impor uma política de gravíssimas consequências económicas e sociais, o Grupo Parlamentar do PCP terá ainda assim em conta a necessidade de compensar propostas de aumento da despesa com o correspondente aumento da receita ou a substituição de despesa.

É nesse sentido que afirmamos, desde já, o compromisso de apresentar 3 propostas que permitam a redução substancial da despesa do Estado, não à custa dos trabalhadores e do povo como faz o Governo mas travando o escoamento de dinheiro público para os cofres da banca e dos grandes grupos económicos, nacionais e estrangeiros:

1 – Renegociação da dívida

Proporemos um regime de renegociação da dívida pública que, assumindo apenas o pagamento da dívida pública legítima e considerando a necessidade de alargamento dos prazos de pagamento, estabeleça como limite para o pagamento de juros, em 2014, um montante máximo correspondente a 2,5% do valor das exportações de bens e serviços, no caso um limite máximo de 1.660 milhões de euros.

A proposta deste mecanismo parte da constatação de que pagar aos credores todos os juros da dívida até ao último cêntimo, como pretendem a troica e os partidos que subscreveram o Pacto, é impossível sem o colapso económico e mesmo a bancarrota.

Com esta proposta assegura-se que o país paga a dívida sem empobrecer, assumindo esse compromisso de pagamento na medida das possibilidades que resultem da situação económica em que se encontra.

Esta proposta será acompanhada da exigência de que essa renegociação não atinja os pequenos aforradores nem as entidades do sector público administrativo e empresarial do Estado que sejam detentoras de dívida pública.

Com esta proposta estima-se uma poupança de 5.664 milhões de euros na despesa do Estado.

2 – Objetivo encargos 0, extinção e reversão das Parcerias Público-Privadas (PPP)

Apresentaremos igualmente uma proposta destinada a assegurar, em 2014, o objetivo de o Estado anular os encargos com as PPP, garantindo apenas a transferência para as entidades concessionárias das receitas obtidas com a exploração e assegurando, excepcionalmente, os recursos adicionais necessários à prestação dos serviços e a manutenção dos postos de trabalho quando aquelas receitas não sejam suficientes para o efeito.

Esta medida transitória será acompanhada do recurso aos meios legais disponíveis e adequados a desencadear o processo de extinção das PPP e obter a consequente reversão para o Estado.

Com esta proposta estima-se obter uma poupança máxima de 1.645 milhões de euros na despesa do Estado

3 – Anulação dos contratos swap e respectivas perdas potenciais

Apresentaremos ainda uma proposta no sentido de promover a anulação dos contratos swap ainda existentes entre entidades e empresas públicas e o Banco Santander, eliminando as perdas potenciais que lhes estão associadas.

Com esta proposta estima-se obter uma poupança máxima de 1.225 milhões de euros na despesa do Estado.

Com o efeito acumulado destas propostas, a despesa do Estado seria reduzida num montante global entre 6.100 e 8.600 milhões de euros.

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