Pergunta ao Governo N.º 2399/XII/2

Apropriação pelo sector financeiro de extensas áreas de vinha na Região Demarcada do Douro

Apropriação pelo sector financeiro de extensas áreas de vinha na Região Demarcada do Douro

«Para o pequeno agricultor, a hipoteca é já, muitas vezes, o caminho da ruína. Por um lado, uma hipoteca esgota-lhe geralmente as possibilidades de crédito. Por outro lado, os juros elevadíssimos criam-lhe obrigações, para satisfazer as quais fica irremediavelmente ligado à miséria e às dificuldades. O empréstimo, que fora a última esperança de salvação, torna-se um
encargo insuportável e maldito. Na célebre frase atribuída a um rei de França, ele "aguenta a agricultura como a corda aguenta o enforcado".»
«Contribuição para o estudo da questão agrária», Álvaro Cunhal Todas as informações recolhidas no terreno evidenciam a crescente transferência da propriedade de pequenas e, sobretudo, médias explorações da mão dos seus proprietários para
o sector financeiro, como resultado da execução de dívidas hipotecadas pelos bancos. Notícia recente (Expresso, de 15 de Junho) refere que a empresa de consultoria imobiliária Golden Estate Douro Valley, criada em 2012, tem “mais de 60 quintas em carteira para vender ou para procurar investidores (…) para parcerias com os seus atuais proprietários”.
Esta situação, traduzindo bem a degradação dos rendimentos agrícolas da viticultura duriense, seguramente superior a 60% na última década, decorrente da convergência de um conjunto de fatores, entre os quais:
(i) A redução absoluta de preços de uvas/vinho de pasto e beneficiado;
(ii) Processo de redistribuição do benefício, decorrentes de transferências e novas plantações de vinha a favor das grandes empresas vitícolas e exportadoras;
(iii) Do significativo agravamento dos preços da generalidade dos fatores de produção: gasóleo, pesticidas, fertilizantes, material vegetativo, e até da própria mão-de-obra;
(iv) Agravamento dos serviços da dívida, decorrente de aumentos de juros, spreads, comissões e de prazos desadequados.
O resultado deste estrangulamento financeiro acaba no incumprimento do serviço da dívida, e logo, na execução hipotecária, que sem dó nem piedade, o sector financeiro concretiza.
Acabando assim por ser a banca intermediária na transferência dessa terra para quem tem meios financeiros suficientes, que a compra a baixos preços (a banca o que quer é realizar os custos do crédito!) progredindo assim, inflexivelmente, a concentração fundiária na região e aconcentração do direito (benefício) a fabricar «Vinho do Porto» por expropriação de pequenos e médios viticultores.Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, solicitamo ao Governo que, por intermédio dos Ministros da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território edas Finanças, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
1) Que avaliação faz o Ministério da Agricultura da situação referida? Quais as informações que o CEVD, sob tutela do Ministério, pode dar?
2) Qual o número e volume das execuções hipotecas verificadas na Região Demarcada do Douro nos últimos 10 anos? Qual a dimensão média das explorações hipotecadas?
3) Qual o número e volume das hipotecas fundiárias, suportando empréstimos do sector bancário, existindo na Região Demarcada do Douro em fins de 2012?
4) Quais as principais entidades financeiras com crédito cedido na Região e agentes deste processo de concentração fundiária?
5) Tem o governo em curso o lançamento de alguma linha de crédito a longo prazo (20/30 anos), a juros bonificados e alargamento de prazos de carência, que permitam a reestruturação de inúmeros empréstimos, e sem a qual crescerá significativamente o número e volume de execuções hipotecárias?

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