Protecção contra a violência de género
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Gostaria de começar por um aspecto que me parece óbvio, que é dizer que este projecto de lei (projecto de lei n.º 406/X) representa uma proposta construtiva e positiva no sentido da adopção de medidas para o combate à violência doméstica, fenómeno que continua a flagelar a nossa sociedade a um nível e com uma dimensão que nos deve encher de vergonha.
Dito isto, é evidente que todas as soluções jurídicas são discutíveis e certamente que o projecto de lei merece, em sede de especialidade, ter contributos, apreciações e uma discussão adequada para que a lei que sair da Assembleia, caso seja aprovada, seja a melhor possível e a mais adequada à realidade concreta.
É verdade que há uma série de matérias que já estão previstas, por exemplo, no Plano Nacional Contra a Violência Doméstica, mas isso não pode ser argumento para que não haja, do ponto de vista legislativo, uma concretização e um aprofundamento daquilo que, estando num Plano, precisa em alguns aspectos de ser concretizado, coisa que, julgo, neste projecto de lei se faz em certa medida.
Entendo que merece discussão e uma melhor ponderação a questão das unidades especiais para a violência de género em relação à coordenação com a rede judiciária, não porque não seja precisa uma especialização e atenção específica a este fenómeno mas porque é preciso enquadrar uma unidade deste tipo, proposta para cada tribunal de instrução criminal, com o funcionamento geral da rede judiciária. De qualquer forma, esta é uma matéria que pode e deve ser discutida e aprimorada em sede de especialidade.
Julgo, portanto, que este projecto de lei vem num sentido positivo.
O PCP tem tido sempre uma posição muito activa na defesa de medidas no combate contra a violência doméstica. Posso referir, por exemplo, que já em 1989 foi apresentado pelo PCP um projecto de lei que, aliás, deu origem à Lei n.º 61/91, que já previa medidas de protecção adequada às mulheres vítimas de violência - isto há quase 20 anos! - e depois disso foram apresentados projectos de resolução no mesmo sentido nas VIII e IX Legislaturas.
Gostaria de dizer ainda que, para além da questão legislativa e programática, é preciso dar atenção à questão concreta e real.
A rede pública de casas de acolhimento está prevista na lei, mas continua a ser escassa a resposta na prática e no terreno, quando essas casas de acolhimento são tão necessárias para as situações de violência doméstica.
Depois, é preciso também dizer que a maioria aprovou, nesta Casa, o Código de Processo Penal, que teve, entre outros efeitos negativos, também o de os inquéritos destes processos de violência doméstica passarem a poder estar disponíveis e acessíveis aos arguidos, isto é, à parte agressora, mais cedo, desprotegendo assim as mulheres ou aqueles que forem vítimas de violência doméstica, abrindo a possibilidade da continuação dessa violência e podendo dificultar a investigação no sentido de poder obter condenações quando elas se justifiquem. Como já referi, trata-se de mais um efeito (talvez até agora menos visível) da forma precipitada como foi aprovado o último Código de Processo Penal.
Finalmente, uma última referência para a questão do apoio judiciário. O PCP propôs - e, aliás, este projecto de lei retoma esta questão - que as vítimas de violência doméstica tivessem direito ao apoio judiciário.
Ora, o que acontece é que isso não foi consagrado, e hoje temos muitas mulheres que têm dificuldades económicas sérias e que, com a situação da violência na sua própria união de facto ou casamento, não têm os 196 € para pagar as taxas de justiça e, cúmulo dos cúmulos, vêem considerado como rendimento do agregado familiar também o rendimento do agressor, facto que as impede de ter acesso ao patrocínio judiciário.
Isto é um escândalo, e deve ser corrigido!