Projecto de Lei N.º 517/XI/2.ª

O uso do subsolo do domínio público

O uso do subsolo do domínio público

Proíbe a cobrança a munícipes, utentes ou consumidores, de encargos sobre o uso do subsolo do domínio público

Preâmbulo

A Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, (Lei das Comunicações Electrónicas) veio criar, genericamente, a taxa municipal de direitos de passagem e estabeleceu a possibilidade de os municípios a criarem em concreto para ter aplicação nos seus territórios.
Esta taxa, tanto pela forma de cálculo e, em consequência, pela sua total independência da contraprestação oferecida pelos entes públicos titulares do direito à sua arrecadação, como pelos sujeitos da relação tributária, não os directos beneficiários do direito a dispor de parcelas do domínio público municipal, mas os utilizadores finais, os cidadãos em geral que e porque façam uma comunicação telefónica através da respectiva rede fixa, é, em verdade, um imposto da mais duvidosa constitucionalidade.

Por outro lado, a sua aplicação ficou, desde logo, inquinada e, mesmo nos casos em que certos municípios dela lançaram mão, há sinais de recuo recente.

É justa a reivindicação de há muito dos municípios, aliás consagrada na Lei das Finanças Locais, no sentido de serem ressarcidos dos ónus gerados sobre os seus territórios e da livre utilização do seu domínio público pelas concessionários de serviços que utilizem infra-estruturas de subsolo. Nesse sentido, há que tomar as medidas adequadas para que a taxa de direitos de passagem se conforme minimamente com o quadro constitucional e se transforme em algo que os municípios possam aplicar sem reservas outras que não sejam as suas opções de políticas financeiras.

Alterar a estrutura da taxa parece ser uma necessidade a satisfazer a prazo tão breve quanto possível, restabelecendo uma relação mais directa com a fonte que legitima a sua cobrança, mas, necessitando maior ponderação, não se coaduna com a urgência no saneamento do quadro descrito e, além disso, não é imperioso para que ela se possa manter no ordenamento jurídico, venha a obter mais ampla concretização e cessem os justos protestos de que tem sido alvo.

Basta, para tanto, repor a relação tributária nos seu precisos termos, a saber, consagrar que o seu sujeito é quem, de facto, directamente beneficia da apropriação parcial do domínio público municipal, cuja natureza, a este respeito, não difere da do proprietário de um estabelecimento de restauração com esplanada em espaço público – ele é o devedor efectivo da taxa e esta será, quando muito, um custo da sua actividade.

As concessionárias dos serviços que utilizam infra-estruturas no subsolo, após anos de processos em Tribunal, até ao Supremo Tribunal Administrativo, foram condenadas a pagar a taxa municipal de direito de passagem, no entanto conseguiram do Governo a inserção nos contratos de concessão, a introdução de mecanismos que permitem repercutir os montantes pagos sobre o consumidor final, conforme fixado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 8 de Abril. Os consumidores não só pagam o serviço que lhes é prestado, como também os custos internos associados, da responsabilidade dos próprios concessionários.

Algumas concessionárias de serviços essenciais estão já a cobrar aos consumidores, na respectiva facturação, uma taxa referente à utilização do subsolo, responsabilizando os Municípios. Não é aceitável que por exemplo concessionárias de serviços como a PT ou a EDP, que anualmente obtém lucros escandalosos, a taxa municipal de direito de passagem aos consumidores, exigindo um maior esforço no acesso a serviços essenciais.

Assim, o PCP propõe que seja proibido repercutir sobre os consumidores os custos associados à actividade das concessionárias de serviços e proibir a cobrança de qualquer outro encargo, independentemente da sua designação, que permita às concessionárias a obtenção de receitas pela utilização do uso do subsolo do domínio público.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei tem como objecto:

a) Proibir que recaiam sobre os utentes e consumidores, a cobrança de taxas municipais de direitos de passagem (TMDP) devidas aos municípios por entidades e empresas que ofereçam redes e serviços essenciais.
b) Proibir a cobrança de qualquer outro encargo que vise a obtenção de vantagem pecuniária por parte das entidades ou empresas referidas na alínea anterior pelo encargo da utilização do uso do subsolo do domínio público no âmbito da sua actividade e prestação de serviço.

Artigo 2.º
Cobrança

É vedado às entidades ou empresas que ofereçam redes e serviços essenciais cobrar aos utentes e consumidores qualquer tipo de taxa ou encargo relativo à taxa municipal de direitos de passagem ou de qualquer uso do subsolo do domínio público devida por estes ao município.

Artigo 3.º
Responsabilidade contra – ordenacional

1- A violação do disposto na presente lei é punida com coima nos montantes e nos limites referidos nos n.º s 1 e 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na sua redacção actual.
2- A tentativa e a negligência são puníveis sendo, nesses casos, reduzidos a metade os limites mínimo e máximo das coimas previstas no número anterior.

Artigo 4.º
Fiscalização e aplicação das coimas

1- A fiscalização do disposto na presente lei, a instrução dos processos de contra-ordenação e a aplicação das respectivas coimas são da competência da Autoridade da Concorrência.
2- O valor das coimas reverte 60% para o Estado e 40% para a Autoridade da Concorrência.

Artigo 5.º
Direito subsidiário

Em tudo o que não se encontra previsto na presente lei é aplicável o Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na sua redacção actual, que aprovou o regime geral das contra-ordenações.

Artigo 6.º
Alteração à Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro

É alterado o artigo 106.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicações Electrónicas), que passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 106.º
[…]
1- […].
2- […].
3- Nos municípios em que seja cobrada a taxa municipal de direitos de passagem (TMDP), as empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público em local fixo são responsáveis pelo seu pagamento não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.
4- […].»

Artigo 7.º
Aditamentos à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho e à Lei n.º 24/96, de 31 de Julho

1- É aditado o artigo 10.º C à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro (Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais), com a seguinte redacção:
«Lei n.º 23/96, de 26 de Julho
Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais
(…)
Artigo 10.º C
Taxa municipal de direito de passagem ou de uso do subsolo do domínio público

Nos municípios em que seja cobrada a taxa municipal de direitos de passagem (TMDP), ou qualquer encargo pelo uso do subsolo do domínio público, as empresas ou entidades concessionárias, que oferecem redes e serviços essenciais são responsáveis pelo encargo e respectivo pagamento não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.»

2- É aditado o artigo 9.º A à Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, alterada pela Lei n.º 8/98, de 16 de Dezembro e pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril (Lei de Defesa do Consumidor), com a seguinte redacção:
«Lei n.º 24/96, de 31 de Julho
Lei de defesa do consumidor
(…)
Artigo 9.º C
Taxa municipal de direito de passagem ou de uso do subsolo do domínio público

Nos municípios em que seja cobrada a taxa municipal de direitos de passagem (TMDP), ou qualquer encargo pelo uso do subsolo do domínio público, as empresas ou entidades concessionárias, que oferecem redes e serviços essenciais são responsáveis pelo encargo e respectivo pagamento não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.»

Assembleia da República, em 9 de Fevereiro de 2011

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