Artigo de Bernardino Soares no «A Capital»

«Um outro jornalismo é possível!»

As notícias e os comentários publicados a propósito da realização do Fórum Social Português (FSP) incluíram inaceitáveis deturpações e mentiras que merecem denúncia. A teoria dominante, aliás sintetizada por Miguel Portas dias depois, foi a do suposto incómodo do PCP com a realização do FSP.

No “Público” de 11/6 Nuno Sá Lourenço dizia, na sua análise, que o PCP “lutou por incluir o maior número de militantes mediáticos comunistas nos principais debates e conferências”. Não reparou que, certamente por méritos superiores, havia 11 dirigentes nacionais do BE nas conferências, e só sete do PCP. Aliás nenhuma das personalidades que antes e durante o FSP foram falando em nome do mesmo (o que certamente vão continuar a fazer), é militante do PCP.

Insistentemente, e demonstrando profundo desrespeito pela diversidade dos movimentos sociais presentes, sucederam-se catalogações de diversas organizações (algumas com milhares de associados) como “satélites” do PCP; nesta divisão maniqueísta, soprada por alguns participantes e repetida por muitos artigos, haveria os verdadeiros movimentos sociais de um lado, e do outro “A corrente conotada com o PCP”, como lhe chamou João Mesquita na ”A Capital” do mesmo dia.

Aliás a mesma notícia, que descrevia a Assembleia dos Movimentos Sociais realizada a par do FSP, titulava: “PCP impede anúncio do segundo Fórum”. Da mesma forma o “Público” dizia “Comunistas tentam travar crescimento do FSP”. Só que se esquecem de explicar que: 1- A Assembleia dos Movimentos era uma iniciativa não integrada formalmente no FSP; 2- O PCP (o tal que travou e impediu) e os restantes partidos apenas participavam como observadores na Assembleia; 3- Curiosamente, e apesar de a declaração a aprovar estar a ser discutida há semanas, só no próprio dia alguns apresentaram a proposta de convocação do 2º FSP (e fora do mesmo).

Finalmente a questão da manifestação. No “DN” Pedro Correia dava voz a Boaventura Sousa Santos que dizia: “Tinha sido inicialmente estabelecido que os representantes dos movimentos sociais encabeçavam o desfile e só atrás viriam as organizações partidárias.”. Falso.

O único consenso possível foi o de que abriria a manifestação uma representação de cada uma das organizações que a convocavam. Não houve consenso com a proposta preconceituosa dos que defendiam que a manifestação devia ser encabeçada pelos movimentos sociais, remetendo o movimento sindical (que suponho também ser social) para segundo lugar, e os partidos para o final, nem com a proposta do PCP de a seguir à representação plural seguirem os sindicatos.

Para alguns, gorada a ostracização dos comunistas, restou a estratégia da vitimização, recusando até a proposta conciliatória feita no local para passarem à frente do PCP no curso da manifestação.

Por nós não reclamámos nunca direitos especiais. Mas não aceitamos um estatuto de menoridade que alguns gostariam de nos impor.

Aquilo a que certos protagonistas devem responder é se para si a convergência de movimentos sociais e o combate à política neo-liberal assenta na premissa de um bafiento anti-comunismo primário; se a participação de um partido como o PCP, com uma longa história de combate às injustiças e um valioso conjunto de propostas para uma política alternativa, é indesejável ou dispensável; se o desenvolvimento das movimentações sociais progressistas pode ser feito em cima de um ataque sistemático ao PCP.

Além do mais, a doentia preocupação com este ataque ao PCP, acabou por ofuscar o fundamental: o valioso conjunto de debates, diálogos e experiências trocadas e cruzadas que constituiu afinal o Fórum Social Português e a sua busca de um mundo e de um Portugal melhor.