A Lei n.º 3-B/2010, publicado a 28 de Abril de 2010, que aprova o Orçamento do Estado para 2010, no artigo 154.º, referindo-se sobre as transferências das autarquias locais para o SNS, estabelecia que “As autarquias locais transferem directamente para o orçamento do serviço nacional de saúde da Administração Central do Sistema de Saúde, I.P., o valor correspondente aos encargos suportados pelos respectivos orçamentos próprios com despesas pagas à ADES em 2009 respeitantes a serviços prestados por estabelecimentos do SNS”.
O Decreto-Lei n.º 72-A/2010, publicado a 18 de Junho de 2010 que estabelece as disposições necessárias à execução do Orçamento do Estado para 2010, no artigo 78.º sobre as transferências das entidades municipais para o SNS, que estabelece que é retido nas transferências do Orçamento do Estado para as autarquias, o montante a transferir para o SNS, através da publicação de um anexo que refere o montante a reter de cada entidade autárquica (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia).
Considerando o n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de Fevereiro, na redacção constante do Decreto-Lei n.º 234/2005, de 30 de Dezembro, as Autarquias Locais apenas estão vinculadas ou obrigadas a reembolsar (contra apresentação de factura) as despesas efectivamente incorridas pela ADSE por força da prestação de cuidados individualizados de saúde aos seus trabalhadores.
Acresce que, o Decreto-lei n.º 72-A/2010, de 18 de Junho, determina no n.º 1 do artigo 16.º, que os descontos para a ADSE, previstos no artigo 46.º do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de Fevereiro, na redacção dada pelas sucessivas alterações de que foi alvo, têm lugar mesmo quando não haja prestação de trabalho, nas eventualidades previstas no artigo 52.º da Lei n.º 4/2007, 16 de Janeiro e no artigo 13.º da Lei n.º 4/2009, de 29 de Janeiro.
O Governo ao estabelecer a obrigatoriedade de as Autarquias Locais transferirem directamente para o SNS os valores correspondentes aos encargos com a ADSE em 2009, sem prever, sequer, um mecanismo adicional de “acerto de contas” entre os valores a transferir e os cuidados efectivamente prestados aos seus trabalhadores no ano de 2010, e ao dispor-se que os montantes em causa são retidos unilateralmente nas transferências do Orçamento de Estado a que as Autarquias Locais têm direito pela Lei das Finanças Locais, significa indevida antecipação de receitas no SNS, via ADSE e torna-as financiadoras do SNS. Este procedimento coloca em causa a autonomia financeira das Autarquias Locais prevista na Constituição da República Portuguesa, ou seja, a vida financeira das autarquias não pode ficar dependente de actos discricionários da Administração Central.
As transferências do Orçamento do Estado para as Autarquias Locais assentam na participação destas últimas nos recursos públicos, no cumprimento do princípio do equilíbrio financeiro entre Administração Central e Local. Deste modo as transferências de recursos públicos directamente do Orçamento do Estado para os respectivos orçamentos municipais das Autarquias Locais é um direito que lhes assiste e que não pode ser retirado unilateralmente pela Administração Central.
Mesmo a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) tendo manifestado um parecer contra este procedimento, o Governo não o considerou?
Ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.2 da Constituição da República Portuguesa e
em aplicação da alínea d), do n.2 1 do artigo 4.2 do Regimento da Assembleia da República,
solicitamos ao Governo, que por intermédio do Ministério das Finanças, nos sejam prestados
os seguintes esclarecimentos:
1. Quais os fundamentos que justificam a opção de Governo em reter parte das transferências do Orçamento do Estado para as Autarquias Locais? Porque não optaram um procedimento “contra a apresentação de factura”?
2. Vai o Governo promover “o acerto de contas” entre os valores retidos correspondentes aos encargos com a ADSE em 2009 e os custos efectivamente prestados aos trabalhadores no ano de 2010?
3. Porque não tomou o Governo em consideração o parecer negativo da ANMP e não encontrou uma solução que não colocasse em causa a autonomia financeira dos Municípios?