Intervenção de

Trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual - Intervenção de João Oliveira na AR

Regime socioprofissional aplicável aos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual (projecto de lei n.º 324/X)

 

Sr. Presidente,
Sr.ª Ministra,

Quero começar este pedido de esclarecimentos por registar aquilo que creio resultar um pouco de todas as intervenções feitas e que, no entender do PCP, é o ponto fundamental desta discussão. Trata-se da necessidade de dar resposta à situação do sector das artes do espectáculo, que é marcada pela instabilidade, pela insegurança, pela precariedade e pela desprotecção social destes trabalhadores.

Portanto, centrando a discussão neste ponto fundamental, que é o da garantia de resposta a estes problemas, o PCP valoriza esta discussão e agendou-a para hoje precisamente por entender que é uma realidade que necessita de uma resposta urgente no plano laboral, mas também porque significa, na prática, a negação do exercício do direito da criação artística, pois condiciona o desempenho destes profissionais.

Portanto, tendo em conta estes problemas que temos para resolver, as questões que quero colocar têm a ver com alguns assuntos que já foram abordados e que entendo que ainda não foram esclarecidos pela Sr.ª Ministra.

O primeiro tem a ver precisamente com o conceito de intermitência, que sintetizo na seguinte frase: a proposta de lei tem em conta o conceito de intermitência da actividade, mas não garante a cabal protecção dos trabalhadores perante esta intermitência. Ou seja, reconhecendo que esta actividade pode ser marcada pela intermitência, em nosso entender, não garante a resposta necessária no âmbito da protecção dos trabalhadores que à mesma estão sujeitos.

A questão que é definida na alínea a) do n.º 6 do artigo 7.º relativamente aos 30% da retribuição normal parece-nos que fica um pouco aquém daquela que deveria ser a protecção garantida a estes trabalhadores e, conjugando com o n.º 3 deste artigo 7.º, esta preocupação resulta ainda mais evidente.

No que diz respeito aos contratos a termo previstos no artigo 6.º importa fazer uma reflexão que tem a ver com o n.º 3 deste artigo, o qual refere uma série de regras previstas para os contratos a termo. É que esta proposta de lei prevê a adaptação do regime geral dos contratos a termo e não prevê uma adaptação, que neste caso importa, da protecção que é garantida aos trabalhadores.

Uma segunda questão tem a ver com a consideração dos bailarinos no âmbito desta proposta. É que, de facto, Sr.ª Ministra, há uma dúvida que nos assalta e que tem a ver com o artigo 18.º. Este artigo, cruzado com o âmbito de aplicação definido no n.º 2 do artigo 1.º, pode empurrar os bailarinos para uma situação em que, simultaneamente, ficam desprotegidos no plano da protecção garantida pelo regime de segurança social, porque podem não ter acesso à aposentação, mas também impedidos de exercer a sua profissão, uma vez que o seu contrato caduca por força de uma coisa inevitável, que é o passar do tempo e o aumento da idade destes profissionais.

A questão que lhe quero colocar tem a ver com a necessidade de ponderarmos o artigo 18.º e os efeitos perversos que poderá ter relativamente aos bailarinos.

Ainda relacionado com o âmbito desta proposta, foi colocada uma questão que tem a ver com a abrangência a outros trabalhadores que não aqueles que estão tipificados no n.º 2 do artigo 1.º, nomeadamente quando este regime lhes possa ser mais favorável.

Para terminar, quero colocar-lhe uma última questão, que também já foi levantada e que para nós é importante.

A situação que se vive, hoje, no sector das artes do espectáculo não pode mais ser adiada. Portanto, o PCP entende que a previsão do artigo 21.º da proposta de lei, relativa à regulamentação num diploma posterior das questões relacionadas com a segurança social, tem condições para ficar definida já, aquando da discussão em sede de especialidade, pelo que gostaríamos que o Governo desse algum sinal no sentido da sua disponibilidade para resolver esta questão.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes,

A sua intervenção, antes de mais, causa-nos alguma perplexidade porque o PSD esteve no governo antes do actual Governo do Partido Socialista... Sabemos que talvez tenhamos de ouvir outra vez a desculpa de que tiveram o seu mandato interrompido a meio, mas posso dizer-lhe que, por parte do PCP, preparámos a proposta que aqui temos com menos tempo do que aquele que os senhores tiveram no último governo.

Portanto, a falta de tempo não é desculpa para não haver iniciativa! A verdade é que hoje, neste debate, registamos, mais uma vez, a ausência de qualquer iniciativa do PSD e, ainda assim, a Sr.ª Deputada traz-nos aqui uma posição um tanto ou quanto amorfa de que o PSD não inviabilizará a iniciativa que o PCP apresenta, mas que esta peca por algum voluntarismo.

Assim sendo, Sr.ª Deputada, pergunto-lhe o seguinte: a proposta do PCP peca por voluntarismo em quê? Porque prevê a necessidade de um contrato de trabalho para trabalhadores que hoje não têm contrato de trabalho e são remetidos para vínculos laborais precários?!

É voluntarista em quê? Porque prevê a protecção social nas situações de desemprego, de maternidade, de doença, quando estes trabalhadores são afectados por estas situações?!

Sr.ª Deputada, compreendo o relato que aqui nos trouxe nas vantagens que o PSD vê na regulação e no funcionamento do mercado, e dessas concepções personalistas ou individualistas do funcionamento e do desenvolvimento da sociedade que, obviamente, distanciam estas bancadas de uma ponta do universo à outra, mas não podemos compreender que o PSD - e gostava que a Sr.ª Deputada corrigisse esta informação se ela estiver errada - se abstenha de tomar uma posição relativamente àquilo que é uma necessidade de garantir a estes trabalhadores o reconhecimento e os direitos que têm todos os outros trabalhadores e que a sua situação, que é de uma fragilidade brutal, exige nesta realidade com que estamos hoje confrontados.

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