Terrorismo e Segurança: sobre as medidas de segurança anunciadas pelo Conselho Europeu - Conferência de Imprensa do PCP, com José Neto da Comissão Política

As medidas de segurança preconizadas pela Comissão Europeia, e ontem anunciadas no final da reunião, em Bruxelas, do Conselho de Ministros da Justiça e Interior, vêm infelizmente confirmar os perigos para os quais o PCP alertou, no momento em que, sem reservas, condenou os trágicos atentados terroristas do passado dia 7 de Julho, em Londres.

Em nome e a pretexto da luta contra o terrorismo está em curso, de forma consistente e premeditada, mais uma escalada contra os direitos e liberdades dos cidadãos.

Entre a vasta panóplia de medidas, o que a Comissão Europeia e o Conselho de Ministros propõem é, nem mais nem menos, a vigilância de todas as comunicações telefónicas e correio electrónico; a retenção desses registos por seis ou doze meses; a criação de bases de dados europeias, com acesso facilitado a informações confidenciais sobre os cidadãos.

Vigilância e registo que, tudo indica, não passam por qualquer participação do poder judicial, quer quanto à sua autorização, quer quanto à definição dos seus limites, quer quanto ao seu controlo.

Esta situação é tanto mais grave quanto é conhecido que, em momentos anteriores, a posição do Parlamento Europeu se pautou por alguma contenção e reserva quanto a medidas mais extremas nesta matéria.

O PCP, na linha de coerência com as posições que a este respeito tem defendido, condena este caminho e estas soluções e considera, mais, que o conjunto das medidas agora anunciadas configura uma obsessiva espiral securitária sem qualquer eficácia no combate ao terrorismo.

Como a experiência tem demonstrado, o reforço das medidas de segurança, só por si, não responde nem impede a concretização de atentados terroristas. As redes operacionais têm-se disseminado. Nos dois últimos anos os atentados quase quadruplicaram.

Mas a deriva securitária, excessiva e desproporcionada aos resultados obtidos, tem, isso sim, sido eficaz na restrição de direitos e garantias. Não tem tido qualquer efeito que não seja atingir as liberdades dos cidadãos. Isto é, ao invés de um equilíbrio justo e razoável entre segurança e liberdade, o que se tem visto é que o reforço da segurança tem sido feito à custa dos direitos e liberdades das pessoas.

Estas medidas de maior compressão de direitos não são necessárias em Portugal. Têm sido rejeitadas pela opinião pública e pelas instituições.

São medidas que não se enquadram no ordenamento jurídico-constitucional português. Na Constituição da República e na lei portuguesa foi construído um sistema de segurança que, em articulação com o poder judicial, já prevê todo um conjunto equilibrado de medidas, de regras e de controlos que, se criteriosa e rigorosamente utilizado e se dotado dos meios humanos indispensáveis, está seguramente em condições de combater eficazmente a criminalidade, mesmo nas suas formas mais organizadas.

Apesar disso, as políticas de direita e os governos ao seu serviço no nosso país têm cedido frequentemente, de forma irresponsável, ao populismo fácil e à demagogia, forçando alterações à lei fundamental, como foi o caso das buscas domiciliárias nocturnas, permitindo o que até aí era absolutamente vedado. A segurança não pode ser pretexto para a polícia entrar em casa das pessoas a qualquer hora.

De igual forma têm sido sucessivamente tentadas, embora sem êxito, soluções e propostas que vão no sentido de autorizar medidas e acções de natureza estritamente policial, sem qualquer controlo judicial, muito para além dos casos que a própria lei já prevê.

Operações especiais de prevenção, como as que o Governo PS recentemente propôs, que permitem revistas e buscas sem mandado do Juiz ou do Ministério Público, correriam o risco de tornar-se regra, o que é característico de um Estado policial. Portugal não é, nem pode ser, um Estado policial.

Preocupante é também o facto de o Partido Socialista, que na oposição ao governo PSD/CDS-PP de Barroso e Portas, manifestou públicas reservas a soluções inicialmente propostas para os serviços de informações, classificando-as de securitárias, vir agora, através de dirigentes e figuras gradas da sua área política, defender medidas e soluções da mesma natureza.

É preciso, é forçoso, travar a espiral de violência. Violência inaudita e hedionda perpetrada pelos actos terroristas contra pessoas inocentes, e que as atingem antes de mais a elas e não aos poderes que, supostamente, visam atingir.

Mas violência igualmente inaudita e hedionda a que se abate sobre as populações igualmente inocentes e ainda mais indefesas perante actos de violenta e criminosa agressão política e militar dos Estados Unidos e seus aliados na Europa e Médio Oriente e que consubstanciam verdadeiras acções do chamado terrorismo de Estado, como aconteceu e acontece no Iraque, na Palestina, no Afeganistão.

É necessária uma estratégica política que trave e desarticule esta espiral.

E essa estratégica política passa, em primeiro lugar, por conseguir um mundo mais justo e pacífico.

Passa, em segundo lugar, por avaliar com seriedade e mais profundidade o fenómeno do terrorismo e as suas causas, que radicam, essencialmente, nos profundos desequilíbrios e desigualdades, à escala global.

Passa, em terceiro lugar, e ao invés do novo fôlego para uma ofensiva militar imperialista, anunciada de imediato pelo presidente dos Estados Unidos a pretexto dos atentados de Londres, pela retirada das forças que ilegalmente ocupam o Iraque e a substituição das soluções militares, no Iraque, Afeganistão e na Palestina, por um outro caminho, que privilegie e insista nas soluções políticas internacionais, que facilitem a criação e manutenção de um quadro de pacificação.

O Estado português e o seu governo, tal como outros Estados, deve apoiar sem equívocos estas vias de solução, difíceis mas necessárias e possíveis, e não insistir num envolvimento em mais operações militares, como está a acontecer com o envio de tropas para o Afeganistão, facto que condenamos por atentar contra a nossa Constituição e colocar o país mais uma vez no rol dos países agressores e ocupantes, de facto, de países terceiros.

O PCP continuará, como sempre, atento ao evoluir da situação nestas áreas tão sensíveis da vida nacional e internacional.

Permanentemente aberto ao exame das realidades, sempre pronto para a procura das melhores soluções na defesa do direito à segurança e tranquilidade das populações, o PCP não está disponível para dar o seu acordo, antes combaterá com firmeza todas as propostas que violem o nosso ordenamento jurídico-constitucional, e afrontem, ainda mais, o Estado de direito democrático, conquistado com Abril, e no qual queremos continuar a viver.

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