Determina o carácter público da gestão do Terminal de Contentores de Alcântara
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A actividade portuária assume um papel central na economia nacional, particularmente nos sectores produtivos e comerciais, e é para todos os efeitos uma actividade de interesse público, cujo funcionamento tem impactos nas mais diversas esferas da actividade económica nacional. Por isso mesmo, o Partido Comunista Português entende a gestão portuária como elemento de importância estrutural, assim devendo ser sempre orientado pelos interesses nacionais, no âmbito preferencial de uma gestão pública. A concessão da gestão dos portos e terminais portuários pode, com efeito, sacrificar o interesse nacional aos interesses comerciais do concessionário ou a outros que orbitem em torno da actividade portuária, assim subvertendo os princípios que deve orientar o próprio Estado, de acordo com a Constituição da República Portuguesa.
O terminal portuário de Alcântara assume, pois, um papel de inegável importância, quer no plano nacional, quer regional. A concessão de exploração dessa infra-estrutura pública foi determinada pelo Decreto-Lei nº 287/84, de 23 de Agosto, da autoria do Governo de "bloco central" de Mário Soares / Mota Pinto, que assim procedeu à entrega da infra-estrutura a uma empresa privada.
O facto de o XVII Governo Constitucional vir agora, através do Decreto-Lei nº 188/2008, de 23 de Setembro, decretar a "prorrogação" do prazo de vigência da concessão do referido terminal para o dia 31 de Dezembro de 2042 não representa apenas uma tremenda operação de atropelo ao interesse público e um exemplo de ausência de transparência nas negociações que envolvem o Estado Português, mas consolida uma análise política que o PCP vem fazendo sobre a opção de concessão a privados da exploração das infra-estruturas portuárias de relevo nacional. Na verdade, além de estar em causa o interesse público, como bem releva o Relatório da Auditoria à "gestão das concessões / PPP Portuárias" sobre a Concessão do Terminal de Contentores de Alcântara, do Tribunal de Contas (Relatório nº 26/2009 2ª Secção), deve também colocar-se a questão política central sobre a opção de concessão a privados, seus efeitos e consequências.
O Grupo Parlamentar do PCP apresentou, no dia 22 de Outubro de 2008, um Requerimento de Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei nº 188/2008, com base precisamente na análise que então fez do "negócio" entre Estado e concessionária Liscont, sem sequer lugar a abertura de processo concursal. Foram na altura identificadas diversas questões particulares que faziam com que esse Decreto-Lei viesse a consubstanciar uma política lesiva dos interesses do Estado, colocando inclusivamente, na esfera da negociação directa entre APL e concessionária um conjunto amplo de matérias que resultavam omissas do previsto no referido diploma, assim permitindo uma renegociação do contrato de concessão a todo o tempo sem intervenção directa do Estado. Nessa altura, o PCP denuncia que todo o processo está eivado de contradições em torno da própria necessidade de alargamento do Terminal de Contentores de Alcântara (TCA), o que certamente estará relacionado com a ausência de um trabalho aturado e ponderado de estudo e projecto integrado do TCA no tecido urbano de Lisboa, de planificação do escoamento de contentores no espaço e no tempo, optimizando os fluxos, que ainda hoje, urge realizar-se.
O Governo, em comunicado difundido pelo Ministério das Obras Públicas, Transporte e Comunicações a 7 de Outubro de 2008 procurava justificar o processo com a suposta "saturação iminente" do terminal de contentores de Alcântara e com a suposta urgência de "aumentar a capacidade de resposta do País à crescente procura de transporte marítimo".
No entanto, no mesmo parágrafo desse comunicado, afirma o Governo que "já após o anúncio das obras de alargamento, o Porto de Lisboa e a empresa concessionária conseguiram captar para Lisboa, em detrimento dos portos espanhóis, uma nova linha regular de contentores (..)", o que só poderia ter um de três significados: a) o terminal não estava em saturação iminente e podia captar novas linhas regulares de contentores, b) a nova linha regular de contentores é anunciada agora para entrar em funcionamento em 2014 ou c) a saturação iminente foi pura e simplesmente resolvida por um anúncio de realização de obras futuras.
O mais provável seria mesmo estarmos perante a primeira hipótese, já que de resto, segundo o Relatório de 2007 da Administração do Porto de Lisboa, a movimentação de contentores em Alcântara cifrou-se em 237.768 TEU, o que significa a existência de capacidade excedentária superior a 30%. Na perspectiva do PCP, aliás, todas as questões levantadas pela necessidade de aumento da "capacidade de resposta do País à crescente procura de transporte marítimo" não pode ser senão abordada de forma integrada, envolvendo necessariamente a capacidade de Portos como Setúbal ou Sines.
Esta política praticada pelo XVII Governo Constitucional, de gestão à peça do território e das infra-estruturas nacionais, subordinando sempre o interesse público a interesses privados, impossibilita a execução de uma planificação estratégica, coordenada e integrada para um conjunto de sectores estratégicos, entre os quais o sector marítimo e a actividade portuária. O Governo prossegue assim uma política de segmentação, descoordenação e concorrência mútua para os portos nacionais - de que o processo do TCA é exemplo particularmente evidente.
A prevalência do interesse público, numa perspectiva de ordenamento territorial integrada e adequada às reais necessidades do país só será concretizada através de uma maior responsabilização do Estado, através dos organismos competentes, sobre as infra-estruturas públicas, assim remetendo para a gestão pública os sectores considerados estratégicos, como certamente será o da actividade portuária.
Precisamente por preconizar e defender uma política nacional de transportes e logística radicalmente distinta, e neste caso com destaque para o sector marítimo e portuário, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, apresenta o presente Projecto de Lei, assim impondo a revogação imediata do Decreto-Lei nº 188/2008 e revertendo os seus efeitos perniciosos e lesivos para o Estado e interesse nacional e regional, declarando o objectivo programático de recolocar no âmbito da gestão pública a gestão e exploração do Terminal Portuário de Alcântara, recolocando esta importante estrutura sob o controlo directo do Estado, do qual não deveria, em primeiro lugar ter saído.
Artigo 1º
Objecto
A presente lei determina as condições de exercício da gestão e exploração públicas do Terminal Portuário de Alcântara.
Artigo 2º
Gestão e exploração públicas do Terminal Portuário de Alcântara
•1- A gestão e exploração do Terminal Portuário de Alcântara são da responsabilidade do Estado, através da Administração do Porto de Lisboa.
•2- A gestão e exploração do Terminal Portuário de Alcântara envolvem todas as actividades concessionadas até à data do termo da concessão, de acordo com a Base XII anexa ao Decreto-Lei nº 287/84, de 23 de Agosto.
•3- O termo da concessão, de acordo com a Base XII anexa ao Decreto-Lei nº 287/84, de 23 de Agosto, determina a data do fim da concessão da exploração do Terminal Portuário de Alcântara e a data do início da gestão do terminal pela Administração do Porto de Lisboa.
Artigo 3º
Norma revogatória
É revogado o Decreto-Lei nº 188/2008, de 23 de Setembro.
Artigo 4º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 5 dias após a sua publicação, com a excepção do disposto no nº 1 do Artigo 2º que entra em vigor na data do termo da concessão, prevista na Base XII anexa do Decreto-Lei nº 287/84, de 23 de Agosto.
Assembleia da República, em 20 de Novembro de 2009