Intervenção de

Subsídio Social de Maternidade e Paternidade - Intervenção de Jorge Machado na AR

 

Cria o subsídio social de Maternidade e Paternidade

 

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

Diz o preâmbulo do Projecto de Lei (nº 226/X) que hoje discutimos: "Cada criança que nasce não tem apenas valor para os pais. Representa, também um importante valor social, garante a continuação da própria sociedade. Por isso cabe ao Estado assegurar o apoio à criança que vai nascer, à mãe durante a gravidez e o parto, e aos pais na criação das condições sociais e humanas para a criança que decidem ter".

A Constituição da República estabelece, no seu Artigo 68º, que "A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes " e que os pais e as mães têm direito à protecção social da sociedade e do Estado.

Contudo, a realidade tem demonstrado que muito falta fazer para efectivamente atingir níveis de protecção da maternidade e paternidade adequados.

Na verdade, o modelo económico vigente, a crescente desregulamentação das relações de trabalho, um Estado cada vez mais ausente, levam a que a protecção da maternidade e paternidade seja hoje claramente insuficiente.

A título de exemplo veja-se o papel do actual Governo e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ao aprovar um aumento do período de licença maternidade e paternidade, mas sem que este seja pago na sua totalidade, impossibilitando quem menos pode e menos tem do exercício de um direito, infligindo mais uma discriminação inaceitável em matéria de protecção à maternidade.

Importa sublinhar que as opções económicas deste Governo e a perversa manutenção do modelo de desenvolvimento assente em baixos salários e  níveis de trabalho precário inaceitáveis, provoca graves problemas sociais que também se reflectem na maternidade e paternidade. Este modelo acarreta ainda um aumento do número de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração , e que por isso não cumprem os requisitos previstos na lei para acederem ao subsídio de maternidade e paternidade e o aumento do número de mulheres à procura do primeiro emprego ou em situação de desemprego, sem direito ao subsídio de desemprego graças as alterações recentemente introduzidas pelo Governo do Partido Socialista.

Por outro lado temos que referir a pressão existente junto das mulheres trabalhadoras para não engravidarem. Esta ilegítima e imoral pressão por parte das entidades patronais reflecte-se muitas vezes na hora de escolher uma trabalhadora para um determinado emprego, em que é preterida a mulher que pretenda engravidar ou nos inúmeros casos em que os contratos não são renovados caso a mulher engravide.

Assim, como sempre afirmámos " o respeito da função social da maternidade e da paternidade implica, igualmente, a responsabilidade das entidades patronais relativamente à renovação das gerações cumprindo os seus deveres para com os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras no exercício pleno dos seus direitos de maternidade e da paternidade. Ao Estado cabe não só uma acção de fiscalização do cumprimento das leis, mas igualmente a adopção de medidas que promovam e afirmem as suas próprias responsabilidades na protecção desta importante função social".

Todas estas condicionantes, bem como os baixos salários - sempre mais baixos no caso das mulheres, o desinvestimento numa rede pública de jardins de infância adequada e a preços acessíveis, os cada vez mais elevados custos da educação, da saúde, e o já avançado caminho na sua privatização são, entre outros, entraves a uma maternidade e paternidade que devia ser protegida e apoiada.

Todas estas condicionantes levam a que os Portugueses não tenham os filhos que querem mas sim os filhos que podem ter.

Curioso é assistir à utilização, por parte do Governo, de argumentos de natureza demográfica, a utilização do envelhecimento da população e do aumento da esperança média de vida, para justificar cortes nos direitos e retrocessos sociais - veja-se toda a discussão em torno do aumento da idade da reforma -, mas já não se utiliza esta argumentação para melhorar os níveis de protecção da maternidade e paternidade.

O Projecto de Lei do Partido Comunista Português que hoje discutimos, visa aprofundar os mecanismos de protecção do direito à uma maternidade livre, consciente e responsável e de protecção à função social da maternidade e da paternidade.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

O presente diploma cria o subsídio social de maternidade e paternidade.

Este subsídio visa garantir a protecção social nas situações de gravidez, maternidade e paternidade para os cidadãos nacionais, estrangeiros e apátridas residentes em território nacional que actualmente não usufruem de qualquer protecção na maternidade e paternidade.

Assim, o Projecto de Lei do PCP propõe que seja criado um subsidio social, integrado no subsistema de solidariedade do sistema público de segurança social, que seja atribuído à mãe quando esta: não exerça qualquer actividade laboral, não seja titular de prestações de protecção na eventualidade de desemprego e não seja titular de rendimento social de inserção. Esta prestação pode ser atribuída ao pai da criança quando, além das condições referidas, se verifique a incapacidade física ou psíquica da mãe e nos casos da morte desta.

Cria-se assim um subsídio social para aquelas situações em que actualmente não existe nenhum esquema de protecção a maternidade e paternidade.

O PCP propõe que se equipare o valor do subsídio social ao da pensão social, garantindo-se a sua atribuição por 120 dias, que cessará em caso de início de exercício de actividade laboral.

Esta prestação marcará a diferença para as famílias vítimas do desemprego de longa duração, em que deixaram de receber o subsídio de desemprego, para as mães adolescentes que ainda não iniciaram qualquer actividade profissional e para os jovens trabalhadores que hoje trabalham em situações de precariedade laboral tão injusta como inaceitável. Estas situações não encontram qualquer protecção pelo que é urgente corrigir esta grave lacuna.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

O Projecto de Lei que hoje o Partido Comunista Português apresenta à discussão não é um diploma isolado nas questões da protecção da maternidade e paternidade. Além da defesa pelo integral respeito dos direitos dos trabalhadores e o respectivo exercício dos direitos da maternidade e paternidade apresentámos propostas, nesta legislatura, para o pagamento integral do subsidio de maternidade e paternidade caso optem pela licença de 150 dias.

Apresentámos um projecto de resolução, que aponta um conjunto de medidas para reforçar a protecção da maternidade e paternidade.

Apresentámos um projecto de lei que altera o actual regime de prestações familiares, congregando num só diploma as prestações existentes, retomando o subsídio de nascimento e a universalidade do abono de família.

O diploma que hoje discutimos não resolve todos os problemas que dizem respeito à maternidade e paternidade, não é esse o seu objectivo. Este diploma, este Projecto de Lei do PCP vem resolver um problema grave.

E as vozes que, aquando da campanha do Referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, exigiam a protecção da maternidade e paternidade, têm aqui o mais cabal exemplo da efectivação dessa protecção: a exigência de que o Estado assuma as suas responsabilidades.

Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados

Os direitos de maternidade e paternidade bem como o seu reforço são um imperativo. Não se consegue alterar o declínio do número de nascimentos mantendo esta política que, dia após dia, agrava as condições de vida dos trabalhadores e trabalhadoras. É preciso mudar de rumo, valorizar o salário mínimo, garantir uma rede pública de infantários e creches de qualidade, é preciso garantir a educação universal, gratuita e de qualidade, a saúde pública e gratuita, é preciso reforçar os meios de protecção da maternidade e paternidade.

Às Senhoras e Senhores Deputados o que hoje se propõe é tão somente a atribuição do subsidio de maternidade e paternidade àquelas famílias que não têm nenhuma fonte de rendimento. É portanto uma medida da mais elementar justiça.

Chegou pois o momento de abandonar a retórica e passar à prática.

Disse.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada,

Que o CDS tenha dado muitas voltas à procura de uma justificação para não votar favoravelmente este projecto não me surpreende. De facto, chegando à política de classe, o CDS toma claramente o seu partido e, portanto, o discurso da família cai redondo.

Contudo, é curioso que o Partido Socialista, no meio da discussão de uma iniciativa que lhe pergunto se considera justa ou não, tenha encontrado apenas um nicho, uma pequena percentagem de mulheres a quem esta situação se pode aplicar.

Sr.ª Deputada, a generalidade das mulheres a quem este diploma se destina não faz parte de famílias ricas. Não é esse o objectivo da iniciativa! Para mais, a Sr.ª Deputada sabe muito bem que, mesmo que suceda o que descreveu, essa será sempre uma situação muito residual. De todo o modo, penso que isso não vos pode servir de desculpa, porque a justiça social também se faz por via fiscal. Todavia, se é esse o problema, aprovem esta iniciativa na generalidade e discutimos na especialidade os mecanismos destinados a melhorá-la. O que não podem é utilizar esta desculpa.

Quanto aos estudos de que falou, queria dizer-lhe que esta é uma reivindicação do movimento sindical.

Aliás, basta olhar para a realidade para percebermos que há hoje mulheres que não recebem subsídio de desemprego por causa das alterações que os senhores introduziram a este mecanismo, que não recebem rendimento social de inserção e que não têm qualquer protecção na maternidade. Ora, são estas situações que queremos acautelar com esta iniciativa. Pergunto-lhe se tem coragem de dizer que esta não é uma reivindicação justa das mulheres.

Não venha, contudo, repetir o vosso discurso da agenda e do planeamento das medidas do Governo.

Como eu disse na intervenção, é chegado o momento de abandonar a retórica e de passar às questões práticas. E, no que a estas respeita, lembro que o Partido Socialista mantém uma rede social cuja parcela pública é de apenas 1,9%. Há, portanto, muito caminho para percorrer e muito para fazer.

Como tal, o que lhe pergunto é o seguinte: tendo em conta este esclarecimento, a Sr.ª Deputada pensa que esta é uma iniciativa justa ou não?

 

 

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