Intervenção de

Subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador - Intervenção de João Oliveira na AR

Direito a subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador contratado por instituições do ensino superior e de investigação públicas

 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

O projecto de lei nº159/X, do PCP, que hoje discutimos propõe a correcção de uma situação de injustiça que há muito se vem arrastando. De facto, a situação de desprotecção em que se encontram alguns docentes e investigadores de instituições do ensino superior e de investigação públicas, quando confrontados com o desemprego, é de clara injustiça face à generalidade dos trabalhadores.

Na origem deste problema estão quadros de pessoal sub-dimensionados face às necessidades das instituições e a instabilidade dos vínculos laborais a que estes trabalhadores qualificados, como tantos outros, estão sujeitos.

As políticas de garrote financeiro às instituições públicas e de utilização descartável dos trabalhadores, definidas, desenvolvidas e implementadas por sucessivos governos e apoiadas por sucessivas maiorias nesta Assembleia da República, colocam estes docentes e investigadores numa situação de extrema precariedade e instabilidade.

A resolução deste problema assume redobrada urgência num momento em que o agravamento das dificuldades financeiras com que se confrontam as instituições, por um lado, e a reestruturação do sistema de ensino superior português na decorrência do Processo de Bolonha, por outro, conduzirão num futuro próximo à possibilidade de desemprego de milhares de docentes e investigadores.

Sem perder de vista a necessidade e a justeza de políticas que garantam a estabilidade no emprego, a dotação dos recursos humanos ajustados às necessidades das instituições de ensino superior e de investigação públicas e o seu adequado financiamento, o que está hoje em discussão é a necessidade de reconhecer, aos trabalhadores já referidos, o direito à protecção no desemprego.

O número de docentes do ensino superior não pertencentes aos quadros das instituições dá uma perspectiva do que está em debate.

De acordo com os dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, de Dezembro de 2005, no ensino superior público universitário e politécnico, os quadros das instituições estavam preenchidos em apenas 74%, sendo que o número de docentes pertencentes aos quadros representava apenas 22% do total de docentes. O número total de docentes colocados nesta situação estará hoje em mais de 10 000.

E é esta questão, trazida à discussão da Assembleia da República pelo PCP ao longo dos anos, que tem sido objecto de sucessivos adiamentos. Sempre com argumentos de ilimitada confiança no trabalho que o Governo vai desenvolver a curto prazo, as iniciativas do PCP vão sendo recusadas na primeira apreciação ou na especialidade e os trabalhadores continuam a ser confrontados com o desemprego sem protecção.

Sintetizando a história do problema com que estamos confrontados e do tratamento que lhe tem sido dado até hoje, podemos dizer que, por vontade política, se tem agravado a instabilidade em que se encontram estes trabalhadores e, por falta de vontade política, não se lhes garantem as condições de protecção no desemprego.

E, lamentavelmente, parece ser isso que mais uma vez se prepara para acontecer.

Tendo em conta as declarações de alguns membros do Partido Socialista e do Governo a respeito da discussão que hoje aqui temos, mais uma vez se recupera o discurso de que o Governo se prepara para tomar medidas com o único objectivo de adiar a resolução do problema.

E é o PS de 2007 que recupera os argumentos do PSD e do CDS de 2003.

A extemporaneidade ou a parcialidade das soluções que hoje se propõem são os argumentos que servem o propósito de adiar e, na prática, recusar a estes trabalhadores o reconhecimento do direito à protecção no desemprego. Porque é essa a consequência de uma possível inviabilização destas medidas pela bancada do Partido Socialista.

Será talvez útil relembrar que, em 2003, era precisamente o Ministro Augusto Santos Silva, na altura Deputado do PS na oposição, que afirmava as vantagens de uma integração desta matéria num diploma global que abrangesse mais trabalhadores.

Sem prejuízo dessa consideração, entendia, então, que o projecto de lei do PCP tinha «muitos aspectos positivos e, sobretudo, este sentido de oportunidade». O agora Ministro Augusto Santos Silva entende que afinal, neste momento, é extemporâneo, quando de então a esta parte nada se fez.

Num momento em que se prevê, a curto prazo, o desemprego de milhares de docentes e investigadores, a rejeição das propostas do PCP e o adiamento da solução deste problema significa negar a esses trabalhadores a protecção que lhes devia estar garantida há muito.

Há, aliás, poucos motivos de confiança em que o Governo resolva rapidamente o problema.

Para além das declarações pouco conclusivas que já foram produzidas a este respeito por membros do Partido Socialista e do Governo, importa relembrar que há mais de um ano atrás era o Ministro Mariano Gago que garantia que já existia entendimento entre o seu Ministério e o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social para regular essa «anomalia jurídica». Em 10 de Janeiro de 2006, o Ministro Mariano Gago garantia que iríamos ter a breve trecho um decreto-lei para ultrapassar esta situação.

Já passou mais de um ano e nem decreto-lei nem fim do desemprego para estes docentes.

Como facilmente se compreende, não é a adopção das soluções que hoje propomos que prejudica soluções futuras que venham a ser dadas a outros trabalhadores nas mesmas condições. Mas é urgente que sejam tomadas medidas.

De entre os muitos casos que poderíamos aqui relatar, cingimo-nos a um que nos chegou recentemente, o caso de uma docente da Escola Superior Agrária de Castelo Branco que lecciona naquela instituição em regime de dedicação exclusiva desde 1999 e cujos últimos contratos são de duração semestral. Esta docente, de 48 anos, já foi informada da possibilidade quase certa da não renovação do seu contrato e perguntava-nos como iria sobreviver perante a possibilidade de ficar desempregada, com 3 filhos dependentes e sem outra fonte de rendimento.

Da parte do PCP e sem comprometer a preocupação central da defesa da estabilidade laboral de todos os trabalhadores, a resposta está dada no projecto que aqui discutimos.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Emídio Guerreiro,

Antes de mais, é preciso fazer um ponto de ordem nesta discussão, porque, tal como em 2003, também hoje o argumento de que o Governo tem em preparação legislação não pode servir para inviabilizar este projecto de lei.

Hoje, como em 2003, entendemos que esse não é um argumento válido quando se trata de adoptar medidas para resolver problemas concretos sofridos pelos professores portugueses.

Portanto, tal como o PS o pode fazer agora, também o PSD e o CDS poderiam ter aprovado a iniciativa que o PCP apresentou na altura.

Relativamente à segunda questão que colocou, tal como acontece hoje, este problema já era uma realidade em 2003, daí que tenhamos apresentado uma iniciativa que, na altura, o Sr. Ministro Augusto Santos Silva reconhecia como oportuna.

Obviamente, a origem deste problema já se manifestava em 2003. De facto, a origem deste problema está em políticas de anos, praticadas por sucessivos governos e suportadas por sucessivas maiorias na Assembleia da República, políticas de precariedade e de instabilidade nos vínculos laborais da generalidade dos trabalhadores, sem que os funcionários públicos escapem a essa razia.

Por último, relativamente às medidas dilatórias, como já tive oportunidade de dizer, em nosso entender, não se trata apenas de medidas dilatórias para resolver o problema. De facto, talvez o Governo tenha aqui uma preocupação com a repercussão que esta medida pode ter - e talvez ela não seja assim tão pequena -, tendo em conta a previsão de despedimento de docentes de instituições de ensino superior. Mas, mais do que medidas dilatórias, esta prorrogação no tempo (que traduz, agora sim, falta de vontade e falta de coragem de tomar medidas que resolvam os problemas dos docente do ensino superior) tem a ver com uma noção de que, talvez até ao fim do ano, sejam muitos os docentes que se vejam envolvidos em situações de desemprego sem protecção. Então, num contexto desta natureza, esta dilação significa não reconhecer e recusar a esses trabalhadores um direito que é reconhecido à generalidade dos trabalhadores.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares,

Antes de mais queria começar por registar que o problema que hoje aqui discutimos é tão real, a discussão é tão oportuna que, ao contrário do que é habitual, se encontra presente um membro do Governo para proceder à discussão das iniciativas.

Queria também registar uma novidade, que é uma aparente contradição entre a bancada do PS e o Governo. É que aquilo que resultou das palavras do Sr. Deputado Jorge Strecht foi que o Governo tem em preparação as normas que darão resposta à situação de desemprego de todos os trabalhadores subordinados do Estado, o que é a confirmação de um receio, que o PCP já há muito vem manifestando, de que as medidas anunciadas de reforma do Estado não passem do despedimento de funcionários públicos.

E esta é uma diferença fundamental entre o PCP e o PS: é que o PS e o Governo têm um calendário e um programa para a preparação dos despedimentos na Administração Pública, com a correspondente regulação do subsídio do desemprego e o PCP defende a estabilidade dos vínculos, a garantia das condições de trabalho para os funcionários públicos e o combate à responsabilização indigna a que estes estão sujeitos relativamente a tudo o que diz respeito à Administração Pública.

Portanto, Sr. Ministro, esta é uma diferença fundamental e que, neste debate, tem toda a importância.

Por outro lado, Sr. Ministro, na sua intervenção, bem como nas anteriores, não foi referido um único argumento que mostrasse que a aprovação destas medidas prejudica a aprovação de medidas futuras relativamente a outros trabalhadores que se encontrem nestas circunstâncias.

E o Sr. Ministro vai ter de reconhecer que a acusação que faz de parcialidade destes projectos de lei pode também ser feita ao Decreto-Lei n.º 67/2000, que não previu as medidas necessárias à cobertura das situações de todos os trabalhadores! Aliás, é por isso que estamos hoje, aqui, a ter esta discussão!

Esse Decreto-Lei, ao qual também pode ser feita a acusação de parcialidade, que está exactamente nas mesmas condições dos projectos de lei hoje em discussão, na altura deu resposta à realidade que existia ou, melhor, a parte da realidade. E nós, hoje, com estas iniciativas, queremos dar resposta à outra parte da realidade que ficou por responder nesse Decreto-Lei.

Além do mais, Sr. Ministro, temos aqui, afinal, a confirmação de que aquilo que pretendem este Governo e a bancada do Partido Socialista, hoje exactamente com os mesmos argumentos utilizados pelo Governo de direita do PSD e do CDS, é adiar a resolução de um problema!

O Sr. Ministro pode argumentar com os calendários e com os programas, mas só há uma leitura possível disto. A leitura política que tem de se fazer deste adiamento é a de que, de facto, está para muito breve a situação de desemprego de milhares de docentes do ensino superior e aquilo que este Governo quer fazer é, «chutando para a frente», não reconhecer a estes docentes o direito à protecção na situação de desemprego.

Por fim, Sr. Ministro, merece a pena fazermos uma breve cronologia do tratamento que este problema tem tido, sobretudo por parte do PS.

Em 2003, dizia o Sr. Ministro que a iniciativa era positiva e oportuna. E, afinal, até conseguiram absterse para viabilizar a iniciativa do PCP!...

Em 2004, respondiam aos professores dizendo que o seu projecto de lei estava quase aprovado e que tinham o trabalho quase todo feito para resolver a situação. Foram para o Governo e o trabalho foi desaproveitado, tanto que ainda não há medidas! E estão no Governo desde 2005! Os senhores estão no Governo desde 2005 e o trabalho que já tinham quase concluído em 2004 não apareceu!

Em 2006, dizia o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: «Está para breve trecho a resolução deste problema». Disse-o no dia 10 de Janeiro de 2006, Sr. Ministro.

E exactamente este Governo, 10 meses depois, em Novembro de 2006, chumbou uma proposta que o PCP apresentou, em sede de discussão do Orçamento do Estado, que dava autorização ao Governo para resolver esta matéria!

Portanto, aquando da discussão do Orçamento do Estado, em Novembro 2006, apresentámos uma proposta que os senhores chumbaram e que poderia já ter dado resposta a este problema, que de repente o Sr. Ministro encontra com a lei-travão.

Sr. Ministro, o problema da lei-travão é facilmente resolvido, haja vontade política do Governo para o resolver!

E da sua intervenção aquilo que resulta é que só lá para 2008 é que o problema ficará resolvido!

Não é esta a resposta que o PCP entende que é preciso dar a uma situação que é urgente!

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