Declaração política contra os cortes dos salários e das pensões e contra a situação do BES e a degradação da situação económica, social e política do País
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Começo por saudar calorosamente os muitos milhares de manifestantes concentrados em frente à Assembleia da República que exigem o fim do roubo dos direitos, salários e pensões.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Após três anos de política da troica, diligentemente aplicada por um Governo que atua como conselho de administração do grande capital, o País está economicamente destroçado e socialmente dilacerado.
Os números do desastre, embora não revelem com toda a profundidade os dramas pessoais de milhões de portugueses que sofrem na pele os efeitos devastadores de uma política desumana, dão uma imagem do estado de degradação económica e social a que o nosso País foi conduzido: 470 000 empregos destruídos, mais 670 000 desempregados, 600 000 portugueses lançados na pobreza e outros 300 000 forçados a emigrar, quase 100 000 empresas liquidadas.
Portugal está mais pobre, mais desigual, mais dependente, mais distante dos níveis médios de desenvolvimento de outros países da União Europeia. O Eldorado, mil vezes prometido, transformou-se num terrível pesadelo para milhões de portugueses.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Ao mesmo tempo que a vida da esmagadora maioria dos portugueses é devastada pelo rolo compressor da política da troica, uma ínfima minoria prospera. São aqueles que, tendo capturado o Estado e estendido os seus tentáculos pelos principais centros de decisão política, se vão apossando de parcelas crescentes da riqueza nacional, por via dos juros da dívida pública, dos benefícios fiscais, das parcerias público-privadas, dos contratos swaps ou de outras benesses.
Um exemplo gritante do Estado capturado pelos grandes interesses privados pode ser encontrado no setor bancário. Um setor que viveu da atividade especulativa, que transferiu para o estrangeiro milhares de milhões de euros em dividendos e lucros e que dispõe dos recursos do Estado, dos recursos de todos nós, como se fossem seus.
Nos últimos anos, têm surgido notícias sobre um conjunto de graves irregularidades nas empresas do Grupo Espírito Santo, assim como o eventual envolvimento de alguns administradores deste Grupo em casos de fraude e branqueamento de capitais. A preocupação com a possibilidade de um risco sistémico associado a este Grupo já está a ter consequências nas cotações em bolsa das maiores empresas portuguesas. A CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários) suspendeu, hoje, a negociação das ações do BES, depois de estas se terem afundado 17%. As incertezas já se estão também a refletir nos juros da dívida pública, que estão a subir em todos os prazos. Ou seja, a possibilidade de estarmos perante um novo BPN vai ganhando consistência.
Perante isto, pergunta-se: o que é que o Governo está a fazer? Vai continuar a assistir sem intervir? Vai deixar que a situação se deteriore para depois nacionalizar os prejuízos, como fez o anterior Governo com o BPN? Exige-se, da parte do Governo e do Banco de Portugal, uma intervenção rigorosa e transparente que salvaguarde o interesse nacional e que apure a real situação do Grupo e do Banco Espírito Santo e não uma atitude de silêncio e cumplicidade determinada pela subordinação ao poder financeiro. Ou seja, uma intervenção que determine o controlo público da atividade do Banco e recuse a possibilidade de se vir a repetir uma situação semelhante à do BPN, em que os portugueses, mais uma vez, sejam chamados a pagar os desmandos da banca privada.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O Governo, ao mesmo tempo que serve diligentemente os interesses do grande capital, insiste em afrontar a Constituição da República para impor uma política orientada para a redução de rendimentos dos trabalhadores e de liquidação de direitos.
Este é um Governo sem qualquer legitimidade que insiste em impor medidas violadoras de princípios constitucionais fundamentais, exercendo uma intolerável chantagem sobre o Tribunal Constitucional. É um Governo que, pondo em causa o regular funcionamento das instituições democráticas, apenas permanece em funções porque o Presidente da República, ao arrepio do juramento que fez de cumprir e fazer cumprir a Constituição, o mantém «ligado à máquina».
É evidente o isolamento social e político do Governo. Nas últimas eleições, o PSD e o CDS sofreram uma clamorosa derrota, obtendo o pior resultado eleitoral de sempre. A intensa e determinada luta travada pelos trabalhadores e pelo povo português ao longo dos últimos anos e a derrota nas urnas dos partidos que suportam o Governo revelam com cristalina nitidez a necessidade de interromper esta política de desastre nacional, de demitir o Governo que a aplica e de convocar eleições antecipadas que abram caminho a uma verdadeira alternativa.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Ao mesmo tempo que protegem os interesses da banca e atacam os trabalhadores, o Governo e os partidos que o suporta têm em curso uma gigantesca operação de propaganda destinada a iludir as reais consequências da sua política na vida de milhões de portugueses.
Falam despudoradamente de milagre económico, da saída limpa da troica ou do fim do protetorado; falam do fim da crise e da recuperação económica, omitindo os recentes dados sobre o recuo do PIB no primeiro trimestre deste ano; falam da diminuição do desemprego, ignorando as centenas de milhares de portugueses que se viram forçados a emigrar em busca de um futuro que lhes é negado no nosso País; falam na sustentabilidade da dívida pública, sabendo que esta não para de crescer, ultrapassando hoje os 130% do PIB; falam de consolidação orçamental, escondendo que, nos três primeiros meses deste ano, já foi consumido 34% do défice previsto para a totalidade do ano.
O Governo e os partidos que o suporta repetem até à exaustão que os sacrifícios impostos aos portugueses valeram a pena, apelam à resignação e ao conformismo com a ladainha de que não é possível mudar de rumo, sob pena de deitar a perder todo o esforço realizado, insistem dizendo que o País está melhor, como se o País pudesse estar melhor quando os portugueses estão cada vez pior.
O objetivo desta campanha de mistificação é claro: perpetuar a política da troica, usando agora outros instrumentos, como o tratado orçamental, assumido pelos três partidos que conduziram o País à atual situação de dependência e de degradação económica e social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação que se vive no nosso País exige uma rutura com a política de direita, com a política dos PEC e da troica. Exige uma política patriótica e de esquerda que proceda à renegociação da dívida pública; que recupere para o Estado o controlo dos setores básicos e estratégicos da economia, incluindo o setor bancário; que aposte na defesa e na promoção da produção nacional; que devolva aos portugueses tudo aquilo que lhes foi roubado nos últimos anos; que valorize o trabalho e os trabalhadores; que defenda as funções sociais do Estado e os serviços públicos; que afirme o primado do interesse nacional nas relações com a União Europeia e o direito do povo português a decidir o seu próprio destino. Em suma, uma política que projete os valores de Abril no futuro de Portugal.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,
Começo por agradecer as questões que colocou e dizer-lhe que as matérias que referiu são extremamente relevantes.
Em 2007/2008, aquando da crise financeira, o Estado português, os Estados europeus e até os Estados um pouco por todo mundo, para salvarem os bancos, puseram os contribuintes a pagar milhares de milhões. Na realidade, só na Europa foram introduzidos no sistema financeiro 4,5 biliões de euros, ou seja, 4,5 milhões de milhões de euros para salvar os bancos. Sr. Deputado, nessa altura, perante a catástrofe, muito se disse relativamente à necessidade de se atuar sobre esse sistema financeiro, mas foi tudo fogo de vista e basicamente ficou tudo na mesma.
Tivemos o escândalo do BPN que deveria servir como exemplo para Portugal. O BPN foi nacionalizado, mas foi uma falsa nacionalização porque apenas foram nacionalizados os prejuízos.
Já o buraco do BPN e a Sociedade Lusa de Negócios não foram nacionalizados, contrariamente ao que defendia o PCP, porque, nacionalizando a Sociedade Lusa de Negócios, haveria ativos nessa sociedade que permitiriam tapar, pelo menos, parcialmente o buraco do BPN. Não foi essa a opção do Governo da altura, a opção foi chamar os contribuintes a pagarem os desmandos do BPN e foram, até ao momento, mais de 3500 milhões de euros, número que pode duplicar se as coisas ocorrerem de acordo com os piores cenários.
Depois deste caso do BPN, teriam de se ter extraído lições, mas o Governo nada aprendeu com isto.
Hoje, já muito se falou aqui da situação que se vive no Grupo Espírito Santo, dos riscos sistémicos associados à situação deste Grupo e das consequências desastrosas que aquela situação pode ter para Portugal do ponto de vista económico e social e o que vemos é um Governo que nada faz e nada diz sobre isto. Aliás, numa audição da Comissão de Orçamento e Finanças, há pouco mais de 10 dias, a Ministra das Finanças, questionada pelo PCP sobre a situação do Grupo Espírito Santo e sobre o Banco Espírito Santo, recusou-se, pura e simplesmente, a adiantar qualquer resposta.
Perante isto, dizemos que é necessário que o Governo e o Banco de Portugal atuem de uma forma decisiva para se impedir que volte a ocorrer uma situação do género da do BPN.
Gostaria apenas de ir mais longe relativamente à questão que o Sr. Deputado colocou, dizendo que o PCP tem referido, e reiteramos esta nossa posição, que é necessário que, em Portugal, o Estado assuma o controlo público da banca e do sistema financeiro, colocando-os ao serviço do povo e do País e não ao serviço de meia dúzia de privilegiados de uma ou outra família. Deste modo é que se resolveria os problemas do controlo público da banca em Portugal, ficando, assim, ao serviço de Portugal, dos portugueses e da economia.