O que se impõe é a revogação e não o regresso e aprofundamento da teia de constrangimentos que limitam o desenvolvimento do País
As reuniões de 13 e 14 de Março do Eurogrupo e do Conselho de Assuntos Económicos e Financeiros (ECOFIN), formações que reúnem, respectivamente, os Ministros das Finanças da zona euro e da União Europeia (UE), confirmaram a proposta da Comissão Europeia de pôr termo à “cláusula de escape” do Pacto de Estabilidade (PEC).
Esta decisão reactiva a aplicação do procedimento por défice excessivo, na sua plenitude, a partir de 2024, tendo em conta os resultados orçamentais de 2023. Ou seja, na prática, considera-se plenamente reposto o quadro de constrangimento, de chantagem e sancionatório decorrente do PEC, com os seus critérios para o défice e a dívida pública, que têm sido utilizados para comprimir o investimento público, impor a limitação dos salários e dos direitos dos trabalhadores e o subfinanciamento dos serviços públicos e das funções sociais dos Estados, aprofundando injustiças e desigualdades sociais e assimetrias de desenvolvimento entre países e regiões.
Ao mesmo tempo, o Eurogrupo e o ECOFIN caucionam, no essencial, todos os aspectos gravosos da chamada reforma da “governação económica” da UE propostos pela Comissão Europeia. De entre estes, destacam-se:
- Ao contrário do prometido aligeirar das regras, confirma-se o aperto do garrote orçamental e do garrote da dívida, com a possibilidade de abertura de procedimentos de défice excessivo, mesmo com défices abaixo da referência de 3% do PIB, em caso de dívida superior a 60% do PIB e a ocorrência de desvios face às imposições feitas no âmbito da UE sobre os orçamentos nacionais e seus planos de curto e de médio prazo;
- O alargamento do espectro de intromissão da UE em áreas de soberania dos Estados, com novos condicionamentos à política orçamental, nomeadamente com a tentativa de determinar as opções quanto à política económica e social, incluindo nos investimentos a realizar;
- O foco na despesa primária líquida como indicador central da trajectória orçamental dos planos nacionais, que se constitui como reforçado elemento de pressão no sentido do subfinanciamento, degradação e privatização dos serviços públicos e das funções sociais dos Estados, além da imposição da contenção salarial e de um número insuficiente de trabalhadores na Administração Pública;
- A aceitação de uma lógica que, a pretexto de uma aparente consideração da situação específica de cada país, tende a colocar na Comissão Europeia e nas potências da UE que detêm maior peso no processo de decisão no Conselho o poder discricionário de
impor medidas a cada país e de decidir sobre a possibilidade de esse país usar ou não “cláusulas de escape específicas”, na prática reforçando o quadro de ingerência e chantagem que a “governação económica” constitui;
- A atribuição de um pretenso carácter técnico, supostamente inquestionável, à orientação neoliberal de que o quadro de “governação económica” está imbuído, fazendo para isso uso reforçado do papel de instituições como o Conselho Orçamental Europeu e as correspondentes agências nacionais, ditas “independentes”, na vigilância dos países em procedimento de défice e/ou dívida excessiva.
- Confirma-se ainda o papel instrumental do “Semestre Europeu”, das “recomendações por país” e dos “planos nacionais de reformas” na imposição de uma espessa teia de condicionamentos diversos aos Estados-Membros, nomeadamente a países como Portugal.
Sob o pretexto de uma alegada simplificação, reitera-se igualmente a intenção de agravamento da capacidade sancionatória da UE sobre os Estados-Membros, com criação de novas sanções e atribuição de um carácter automático à aplicação de outras.
É elucidativo que as conclusões do ECOFIN tenham retomado explicitamente a ideia de que às alterações de governo que ocorram no plano nacional, fruto da expressão da vontade dos povos, não possam corresponder alterações na política seguida, nem pôr em causa o
acatamento das políticas e das imposições da UE.
Os deputados do PCP no Parlamento Europeu consideram que o que se impõe não é o regresso às regras do Pacto de Estabilidade, mas a sua revogação. O que se impõe não é o densificar da teia de condicionamentos, imposições e chantagens, mas a ruptura com essa teia, no exercício pleno da soberania nacional, promovendo-se políticas públicas e investimentos que garantam os direitos e aspirações dos trabalhadores e do povo português.
O que se impõe não é a continuação e aprofundamento mas sim a ruptura com o caminho de redução dos salários e das pensões e do desinvestimento público em áreas como a saúde, a educação, a segurança social, entre outras, fundamentais para a população e desenvolvimento
do País.
O que se exige do Governo português não é a postura submissa e passiva que tem evidenciado neste debate, mas sim a afirmação clara dos interesses nacionais.