O PCP toma a iniciativa de promover a presente Conferência de Imprensa sobre questões de Segurança Interna porque vemos com preocupação acrescida o aumento da criminalidade violenta e a degradação da situação de segurança dos cidadãos e pretendemos alertar para a situação a que o Governo está a conduzir esta área.
Queremos também denunciar as ameaças que pesam sobre os direitos e liberdades, que derivam das actividades ilegítimas de vigilância e recolha de informações por parte das Forças de Segurança, e da intenção de envolvimento e participação das Forças Armadas em missões na área da Segurança Interna que consta das Bases do Conceito Estratégico da Defesa Nacional apresentadas pelo Governo.
Chamamos também a atenção para um conjunto de iniciativas legislativas do PCP, que configuram, no seu conjunto, uma política alternativa que reputamos de oportuna e urgente.
Após os primeiros seis meses de governação PSD/PP, é manifesta a degradação da segurança pública, com a diminuição da capacidade de intervenção preventiva das Forças de Segurança, o prático abandono dos programas integrados de polícia de proximidade – Escola Segura, Idosos em Segurança, Comércio Seguro, Inovar e Escolhas; com o aumento da criminalidade violenta em cerca de 17%; com o regresso do sentimento de insegurança às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e, como demonstram factos recentes, com a instabilidade, o descontentamento e a conflitualidade a assentarem arraiais nas instituições policiais e nos agentes que as integram.
É sintomático deste panorama de crise que a sociedade seja confrontada com cerca de 3000 crimes por dia que vitimam os cidadãos; que em Lisboa e Porto (em qualquer hora do dia ou da noite) exista apenas um agente policial de serviço para cerca de 3000 habitantes, ao mesmo tempo que 22.000 agentes, devidamente formados e qualificados, estejam compulsivamente ocupados em trabalhos administrativos, impedimentos e notificações ao serviço dos tribunais.
A situação é tanto mais grave quando, a pretexto do “combate à droga” e ao “terrorismo”, está em marcha uma verdadeira cruzada limitadora de direitos e liberdades fundamentais, provinda de projectos e intenções de raiz securitária, que consubstanciam a intervenção das Forças Armadas em missões de segurança interna, no envolvimento das polícias na recolha de informações e vigilância de movimentos sociais e de reestruturação e reorganização das Forças e Serviços de Segurança, com base num “novo modelo de policiamento” e em exigências de mais “autoridade de Estado”, em que se pretende fazer regredir estas estruturas policiais para patamares de corpos militares, fortemente hierarquizados e doutrinados na intervenção e repressão dos movimentos sociais.
O Orçamento do Ministério da Administração Interna para 2003 espelha de forma clara que política pretende o Governo para esta área. Existem cortes gravosos em áreas nevrálgicas do combate ao narcotráfico, da vigilância da fronteira marítima, na prevenção e luta contra a delinquência e o crime organizado, com inevitável perda da capacidade operativa das Forças de Segurança. É o caso flagrante do PIDDAC para 2003, que sendo um instrumento decisivo do investimento e da sustentabilidade de muitos programas em desenvolvimento, regista cortes significativos em projectos de grande importância e fica a 126,3 milhões de euros de distância das previsões feitas há um ano para 2003, com consequências que se farão sentir negativamente nos programas de policiamento de proximidade, informatização, meios operacionais, instalações das Forças de Segurança e penalizando fortemente o direito constitucional das populações à segurança e tranquilidade públicas.
Neste contexto, o Ministro da Administração Interna fala numa lei de organização das Forças de Segurança mas limita-se a definir que existe uma força civil – a PSP – e outra militar – a GNR. E a opção é para a atribuição clara do carácter militar à GNR e a sua transformação numa grande força militar, com instrução e formação militares e integrada no sistema de forças militares visa, no plano interno, fazê-la actuar prioritariamente em missões de ordem pública e no plano externo, nas chamadas “missões humanitárias”.
O processo de reorganização desta força já se encontra em curso, com a concentração de efectivos em grandes unidades de reserva, aquarteladas, desligadas das populações e com os respectivos profissionais fortemente cerceados nos seus direitos. Isto é, com um estatuto e objectivos completamente inadequados para as missões específicas e responsabilidades que detém na fiscalização rodoviária, aduaneira e fiscal e na segurança das populações em 90% do território nacional.
As propostas e projectos mais visíveis deste Governo para esta área são altamente lesivos dos cidadãos e do País, mas são-no também dos agentes e das instituições de segurança.
É um anacronismo deste Governo afirmar que se justifica a natureza militar na maior força de segurança do País, quando a condição militar imposta aos seus agentes significa a ausência dos mais elementares direitos de cidadania, a degradação das suas funções e condições de trabalho e de vida, num sistema fechado e militarista que permite abusos e discriminações e que impede os seus agentes de exercer as suas funções com eficácia, rigor e com a qualidade que os cidadãos exigem e que eles desejam.
Importantes reivindicações dos agentes continuam a ser proteladas ou simplesmente recusadas pelo Governo, como o horário de serviço e o associativismo sócio-profissional para a GNR, o seguro de acidentes pessoais e os sempre prometidos, em campanhas eleitorais, subsídio de risco e aumento de vencimentos – demagogicamente utilizados como bandeiras pelo PSD e CDS/PP - e agora atirados para as calendas gregas.
Não é, pois, de estranhar que a desmotivação e o mal-estar se instale nos agentes e instituições de polícia.
É visível neste quadro que na política do MAI – como aconteceu em anteriores governos do PSD – a instrumentalização das Forças de Segurança prevalece sobre os objectivos de segurança dos cidadãos, de dignificação das funções dos agentes, de eficácia da actuação e qualidade do serviço policial prestado às comunidades.
A política seguida por este Governo não vai tornar mais eficaz a actuação das forças policiais no quadro das suas missões constitucionais. Nos Governos de Cavaco Silva/Dias Loureiro era a política das super-esquadras; agora no Governo Durão/Portas/Figueiredo Lopes são os pelotões de intervenção rápida e o regresso à concentração dos efectivos policiais.
Desde sempre tem sido entendimento do PCP que a problemática da segurança ultrapassa em muito as questões da organização policial e não se resolve exclusivamente com o recurso a medidas de polícia. Temos por isso mesmo razões acrescidas de preocupação. É que, com a política económica e social deste Governo, que instala uma extrema insegurança em todos os domínios e sectores da sociedade (no emprego, na saúde, nas reformas, nos vencimentos, no futuro dos jovens), a situação da segurança interna, que já é hoje preocupante, tenderá a agravar-se no futuro, com consequências negativas na segurança e tranquilidade dos cidadãos e das populações.
Para o PCP, é indispensável a tomada de medidas que travem esta política e que criem condições para uma profunda e sistemática reforma nas Forças e Serviços de Segurança, que alterem as orientações e estratégias de segurança interna que ao longo dos anos têm sido prosseguidas, que reformulem o dispositivo, a organização, a actuação e o funcionamento das Forças de Segurança.
Neste sentido, o PCP anuncia no imediato as seguintes iniciativas:
- Apresentação de um Projecto de Lei que consagra o horário de serviço na GNR;
- Apresentação de um Projecto de Lei de regulamentação do associativismo sócio-profissional na GNR;
Também para o imediato, o PCP toma a iniciativa de solicitar a realização de reuniões com os sindicatos e associações sócio-profissionais das Forças de Segurança com o objectivo de proceder à avaliação da situação da segurança interna e de conhecer directamente as suas preocupações e aspirações no sentido de encontrar as melhores soluções para o futuro destas instituições, dos seus profissionais e da segurança dos cidadãos e do País.
O PCP anuncia ainda que, no quadro da sua reflexão sobre os problemas de fundo da situação nacional em matéria de Administração Interna, tendo como preocupações fundamentais, a defesa da legalidade democrática, a salvaguarda da segurança e tranquilidade das populações, a modernização das Forças de Segurança e a dignificação do estatuto dos seus profissionais, apresentará oportunamente um novo Projecto de Lei de Grandes Opções de Política de Segurança Interna que se encontra presentemente em fase adiantada de elaboração.