As reservas mundiais de petróleo são hoje razoavelmente conhecidas, não sendo crível nem provável, à luz dos conhecimentos já acumulados acerca da crosta terrestre, designadamente em termos da génese dos hidrocarbonetos e da prospecção efectuada, que se possam vir a descobrir novas reservas de petróleo com magnitude equivalente aos campos de descobertos no passado com significado económico relevante.
É bem sabido que a civilização moderna, desde há mais de cem anos, repousa inteiramente no consumo de enormes quantidades de energia, assumindo esta um carácter crescentemente estratégico. A humanidade habituou-se de tal forma a elevadíssimos consumos de energia, que sem eles entrará em crise, sendo-lhe muito penoso voltar à era anterior ao petróleo.
É sabido que no quadro das energias primárias actualmente utilizadas, o petróleo assume um papel perigosamente dominante, o que é particularmente evidente no que concerne ao funcionamento das economias mais desenvolvidas e industrializadas.
É também sabido que o petróleo, para além de ser utilizado como combustível, após adequados processos de refinação, constitui matéria-prima importantíssima para as indústrias química, paraquímica, petroquímica e farmacêutica, sendo actualmente a base de uma variada gama de produtos de enorme importância na vida moderna. Produtos que vão da enorme panóplia de plásticos até aos adubos, pesticidas e medicamentos.
O petróleo é uma matéria-prima não renovável, pelo menos à escala da evolução da Humanidade. O conhecimento científico e técnico actual, permite afirmar com segurança, que em termos globais, mais da metade das reservas recuperáveis de petróleo já foram utilizadas, sabendo-se que o pico máximo da produção de petróleo convencional foi atingido no ano de 2005 e que o pico máximo da produção de todos os petróleos (convencional + não convencional) foi atingido no ano de 2008.
Embora este facto seja de crucial importância para o futuro de toda a humanidade, a verdade é que os governos das principais potências e também o governo português, bem como as empresas petroleiras procuram escondê-lo da opinião pública. Tal omissão de informação transmite a mensagem errada ao conjunto dos operadores económicos e impede que se venham a adoptar as medidas necessárias a fim de transitar o mais suavemente possível para a era pós petróleo.
A principal consequência do Pico Petrolífero é que o mundo entrará numa fase de restrição da oferta de petróleo à medida que a produção começar a reduzir-se. Embora actualmente a produção esteja estagnada devido à presente recessão económica, é previsível que a breve trecho tenha início o seu declínio. A partir desse momento, o mundo entrará na fase de tendência estrutural e permanente para a alta dos preços do barril.
No fim do actual período de estagnação da produção ("plateau") terá inicio o seu decréscimo inexorável. As taxas de declínio anuais são objecto de discussão entre especialistas, mas o que importa reter é o facto perfeitamente previsível de que a produção irá reduzir-se gradativamente. O mundo estará assim a avançar na segunda metade da curva traçada pelo grande geólogo norte-americano Marion King Hubbert. Algumas descobertas de novos campos petrolíferos, onshore ou offshore, não terão poder suficiente para alterar esta realidade estatística. O gráfico abaixo ilustra isso:
A perspectiva é a de que, a continuarem os consumos actuais na ordem de 85 milhões de barris/dia, dentro de 40 a 50 anos o petróleo estará virtualmente esgotado. Todavia, muito antes do completo esgotamento, ocorrerão seguramente várias fases de penúria angustiante.
Enquanto isto, absurdamente, em Portugal, o consumo de energia continua a crescer a taxas claramente superiores ao PIB Isso não significa crescimento económico e desenvolvimento. Bem pelo contrário, significa sobretudo a mais completa falta de planeamento e particularmente uma política de transportes suicida. Em contraste, verifica-se que alguns governos lúcidos estão a tomar medidas preventivas. O governo da Suécia, por exemplo, tem um plano para instaurar até o ano 2020 uma economia pós petróleo. Outro exemplo, é o do Parlamento britânico, que já dispõe de uma Comissão Interpartidária para o Pico Petrolífero.
A Humanidade terá de encontrar a prazo – o qual todavia poderá ser muito longo – outras alternativas para o seu aprovisionamento energético. Mas sejam quais forem essas alternativas, é certo que o consumo global de energia irá diminuir em relação aos níveis actuais.
Contudo, duas verdades devem ser, desde já, tidas em atenção:
- o mundo como hoje o conhecemos sofrerá certamente mudanças muito profundas nos próximos decénios, particularmente ao nível dos modos de transporte, mas não só;
- as reservas de petróleo restantes deveriam, como imperativo da própria humanidade, ser geridas com imensa sabedoria, o que significa, antes de mais, que o sejam com muita parcimónia.
Desde 2000, foi constituída por cientistas e especialistas de diversos países, directa ou indirectamente, ligados à problemática das reservas de petróleo e profundamente preocupados com o rumo na utilização destas, a Association for Study of Peak Oil (ASPO), a qual realizou em Lisboa, em Maio de 2005, a sua 4ª conferência anual internacional sobre o tema, com a presença de especialistas de todo o mundo. Esta Conferência, confirmou a urgência de intervir a fim de prevenir as graves consequências decorrentes do consumo desbragado e não planeado desses recursos.
Esta associação, tem desde cedo, proposto que os governos se concertem a nível mundial para adopção dum plano que tenha em vista a boa gestão de tais recursos, a mitigação da sua carência e a transição controlada para uma economia baseada noutras fontes primárias de energia e níveis de consumo compatíveis. Para o efeito, tem proposto aos governos de todo o mundo e a todas as entidades com intervenção nas sociedades e na economia, a adopção do designado Protocolo de Esgotamento (The Depletion Protocol), apresentado em Uppsala, em Maio de 2002 e em Lisboa, em Maio de 2005 (Anexo I).
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, propõem que a Assembleia da República adopte a seguinte:
Resolução
Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República que:
Pela relevante e actualíssima importância do tema, a Assembleia da República, recomenda ao Governo que subscreva e promova nos planos nacional e internacional o designado Protocolo do Esgotamento.
Assembleia da República, em 11 de Março de 2011
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Anexo I
“Protocolo do Esgotamento
Considerando que a passagem da história tem registado um ritmo de mudança crescente, de modo que a procura por energia tem aumentado rapidamente em paralelo com a população mundial ao longo dos últimos duzentos anos posteriores à Revolução Industrial;
Considerando que a oferta de energia exigida pela população mundial tem vindo principalmente do carvão e do petróleo, tendo sido formados quase sempre no passado geológico, e que tais recursos estão inevitavelmente sujeitos a esgotamento;
Considerando que o petróleo proporciona noventa por cento do combustível para os transportes, é essencial ao comércio e desempenha um papel crítico na agricultura, necessária para alimentar a expansão populacional;
Considerando que o petróleo está desigualmente distribuído sobre o Planeta por razões geológicas bem entendidas, com grande parte dele estando concentrado em cinco países junto ao Golfo Pérsico;
Considerando que todas as maiores províncias produtivas do Mundo já foram identificadas graças à tecnologia avançada e ao conhecimento geológico cada vez melhor, sendo agora evidente que as descobertas alcançaram um pico na década de 1960, apesar dos progressos tecnológicos e de uma pesquisa diligente;
Considerando que o pico passado da descoberta inevitavelmente conduz a um correspondente pico da produção durante a primeira década do século XXI, assumindo que não haja um declínio radical da procura;
Considerando que o início do declínio deste recurso crítico afecta todos os aspectos da vida moderna, o que tem graves implicações políticas e geopolíticas;
Considerando que é adequado planear uma transição ordenada para o novo ambiente mundial de oferta de energia reduzida, tomando disposições para evitar o desperdício de energia, estimular a entrada de energias substitutas e estender o tempo de vida do petróleo remanescente;
Considerando que é desejável atender aos desafios que assomam no horizonte de uma maneira cooperativa e equitativa, assim como os relacionados com as preocupações da mudança climática, da estabilidade económica e financeira e das ameaças de conflitos para acesso a recursos críticos.
É Proposto agora que:
1- Seja convocada uma convenção de nações para considerar a questão tendo em vista concertar um Acordo com os seguintes objectivos:
a) evitar a especulação (profiteering) com a escassez, de modo a que os preços do petróleo possam permanecer num relacionamento razoável com o custo de produção;
b) permitir aos países pobres manterem as suas importações;
c) evitar desestabilizar fluxos financeiros decorrentes de preços excessivos de petróleo;
d) encorajar os consumidores a evitarem o desperdício;
e) estimular o desenvolvimento de energias alternativas.
2- Tal Acordo terá disposições com os seguintes contornos:
a) Nenhum país produzirá petróleo acima da sua actual Taxa de Esgotamento, sendo a mesma definida como produção anual como uma porcentagem da quantidade estimada deixada para produzir;
b) Cada país importador reduzirá as suas importações para atingir a actual Taxa Mundial de Esgotamento, deduzindo qualquer produção interna.
3- Disposições pormenorizadas cobrirão a definição das várias categorias de petróleo, isenções e qualificações, e os procedimentos científicos para a estimação da Taxa de Esgotamento.
4- Os países signatários cooperarão proporcionando informação sobre as suas reservas, permitindo auditoria técnica plena, a fim de que a Taxa de Esgotamento possa ser determinada com precisão.
5- Os países signatários terão o direito de recorrer quanto à avaliação da sua Taxa de Esgotamento no caso de alteração de circunstâncias.”