O Governo anunciou que hoje iria aprovar o Orçamento do Estado a submeter à Assembleia da República. Nestas circunstâncias, o PCP entende ser seu dever produzir a seguinte declaração:
Portugal necessita de aumentar o seu crescimento económico, o emprego e a melhoria do nível e qualidade de vida do povo português. Estes objectivos não são incompatíveis. Pelo contrário são objectivos complementares, interdependentes e que se podem potenciar uns aos outros.
Mas também como a experiência o comprova eles são incompatíveis com o dogma da redução acelerada e a qualquer preço do défice orçamental e com a consequente compressão da procura pública e privada que vai aumentar o desemprego e alimentar num ciclo vicioso o próprio défice.
A política de austeridade para os trabalhadores e as camadas médias, a que o governo chama política de rigor, é uma política que deprime a economia e alimenta a espiral da estagnação.
Por cada ponto que se perde no PIB são milhares de postos de trabalho que se deixam de criar e um imenso número de necessidades básicas que se deixam de satisfazer.
É necessário relançar o investimento e o consumo popular com a defesa e valorização em simultâneo do nosso aparelho produtivo e da produção nacional.
Por isso é cada vez mais necessário virar o Orçamento para a criação de empregos e para o desenvolvimento e não para o cumprimento dos sacrossantos critérios de Maastricht. As baixas de taxas de juro reais dos empréstimos têm sido insuficientes e ainda mais quando estas têm sido acompanhadas por políticas orçamentais e salariais restritivas.
Um dos grandes obstáculos a um efectivo relançamento do investimento reside cada vez mais na fraca carteira de encomendas das empresas.
A política de leilão ao desbarato do S.E.E. desviando recurso do investimento produtivo para a mera transferência de posse de meios de produção e a política de deflação da economia, vai atirar mais uns milhares de trabalhadores para a rua e agravar a situação e a vulnerabilidade do nosso aparelho produtivo.
É por isso absolutamente desajustado no plano económico e intolerável no plano da justiça social a proposta dos ridículos aumentos para os trabalhadores da função pública e da alegada "manutenção dos salários reais".
E mais intolerável ainda quando o Governo anuncia que vai propor a diminuição do imposto sobre os lucros!
Esta é a continuação da política que no Orçamento em vigor concedeu milhões de contos às actividades especulativas e financeiras quando se sabe que a banca teve em 1995 mais de 157 milhões de lucros líquidos!
O aumento dos salários reais, insistimos é não só uma medida de justiça social, como é também um factor de dinamização da economia e do aumento do emprego, quando acompanhado de valorização e defesa da produção nacional.
O aumento dos salários reais em termos aceitáveis é um elemento decisivo para dinamizar o consumo, dar vida ao comércio, escoar a produção e estimular o investimento e o emprego.
A luta por melhores salários, reformas e pensões é simultaneamente uma luta pelo emprego e pelo crescimento económico.
Mas o Governo, no Orçamento para 1997 quer manter e agravar as injustiças fiscais e fazer pagar a factura através de uma forte "contenção salarial", compressão nas despesas sociais e aumentos mínimos (de algumas dezenas de escudos diários) nas reformas e pensões.
A juventude em geral, as mulheres, os trabalhadores e as camadas médias pagam a grande parcela desta política, com um nível de vida cada vez mais distante da média europeia e com o desemprego, o trabalho a recibo verde, o trabalho sem direitos!
Esta é uma política que desestabiliza o presente e aumenta as incertezas quanto ao futuro dos trabalhadores e das jovens gerações. Esta é uma política que cria mais insegurança e novas exclusões sociais e favorece o caldo de cultura do racismo e da xenofobia!
Mas o povo português não está condenado a tais opções e caminho. Não há um único caminho, nem de sentido único...
De todos os quadrantes são cada vez mais os que contestam esta orientação. O prémio Nobel da Economia, numa Conferência de Imprensa realizada na Universidade de Colúmbia afirmou: "Maastricht é um desastre". E acrescentou: "A União Monetária não pode funcionar sem que haja um acordo para abandonar a exigência imposta pelo Tratado de Maastricht de manter o défice abaixo dos 3% do PIB."
Não é com discursos caritativos, de muita preocupação pelos pobrezinhos e pelos desempregados, nem é com discursos farisaicos sobre o neo liberalismo que se muda a essência e os principais eixos de uma política de concentração da riqueza e de favorecimento das actividades especulativas e dos grandes senhores do dinheiro. Esta é que é a questão central. Quem paga os impostos e quem recebe os benefícios fiscais? Quem paga a austeridade e quem recebe o grosso dos subsídios? Quem é obrigado a sujeitar-se a maus cuidados de saúde, a uma educação sem qualidade, à falta de habitação e quem é que promove a privatização da saúde, o negocismo no ensino e a degradação do ensino público e a especulação na habitação?
Quem é que aumenta os reformados na fantástica quantia de menos de 50$00 por dia e quem é que entrega do Orçamento do Estado largos milhões à meia dúzia de famílias que se está a assenhorear de novo do poder económico, do poder financeiro, do poder da comunicação social e do poder político do país?
Será então de espantar a fantástica concentração da riqueza verificada nos últimos anos em Portugal?
Será de espantar o aumento do desemprego e o facto de neste último ano e meio mais 60.000 trabalhadores terem sido obrigados a regressar ao trabalho na agricultura, conhecendo-se como se conhece a crise deste sector?
Uma política dirigida ao crescimento económico e ao combate ao desemprego exige também uma política monetária mais flexível, uma política fiscal mais justa e uma política orçamental que seja colocada ao serviço do emprego. Isto implica que se rompa com a prioridade absoluta de se atingir um défice igual ou inferior a 3% do PIB.
Aquelas políticas devem também ser conjugadas com a luta a nível europeu pela taxação dos capitais especulativos, pela redução do horário de trabalho e pela extensão e produção de serviços públicos de qualidade, nomeadamente no ensino público, na saúde e na administração pública.
Em resumo e no que diz respeito ao Orçamento do Estado:
1 - Para nós, para o PCP, o Orçamento do Estado para 1997 não deve subordinar-se à marcha forçada e acelerada da participação de Portugal na moeda única.
Diversa e inversamente, deve inserir-se numa política macro-económica que tenha por objectivos essenciais o aumento da produção nacional, a melhoria da produtividade, a redução do emprego e a criação de novos postos de trabalho, a melhoria dos salários e das condições de vida dos portugueses e o desenvolvimento de infraestruturas de apoio social e à actividade económica.
2 - Para o PCP, os orçamentos do Estado e da Segurança Social devem prever as dotações necessárias para um aumento significativo das pensões e reformas, em particular as mais baixas.
E não um aumento nominal pouco acima da inflação, que mantenha os níveis insustentáveis que essas pensões e reformas hoje continuam a ter.
3 - Para o PCP, o Orçamento para 1997 deve apresentar-se como um instrumento impulsionador da actividade económica com inequívocos efeitos indutores no aumento do emprego.
E não como um instrumento restritivo do crescimento económico por subordinação estrita a um défice determinista imposto do exterior e um instrumento de concentração da riqueza e de delapidação do património nacional através do escandaloso processo de privatizações.
4 - Para o PCP, o próximo orçamento deve reforçar de forma substancial as dotações de funcionamento e de investimento para as áreas sociais, nomeadamente, no âmbito da Saúde, da Educação, da Habitação e do combate à exclusão social.
E não dotações de mera contenção ou estagnação real, que nem sequer absorvam, por exigirem contrapartida nacional, todos os fundos comunitários disponíveis para o investimento público.
5 - Para o PCP, o Orçamento que hoje o Governo vai aprovar, deve apresentar uma política fiscal decididamente orientada por uma significativa redistribuição da carga fiscal, de modo a aliviar a tributação sobre os rendimentos do trabalho, pela redução substancial dos benefícios fiscais às actividades e operações financeiras, e pelo combate eficaz e decidido à fuga e evasão fiscais.
Estas grandes orientações, contribuiriam decisivamente para estimular a recuperação de um crescimento rico em empregos estáveis e representariam eixos de uma matriz de uma nova política ao serviço do povo, do desenvolvimento e de Portugal.