1. A decisão da União Europeia de embargar
a exportação de bovinos vivos e de carne de vaca portuguesa constitui um sério
revés para a agricultura e os agricultores nacionais não só pelo impacte directo
do embargo nas exportações mas também pelas suas repercussões no consumo interno
e no comportamento dos consumidores nacionais.
O Partido Comunista Português responsabiliza o Governo PS pela situação
e manifesta o seu desacordo frontal com a decisão da União Europeia. A decisão
é desproporcionada, injusta e hipócrita.
2. A decisão é desproporcionada porque
o número de casos de BSE ocorridos em Portugal, desde 1990, num total de 161
(correspondente a 4 casos por cada 10 mil bovinos leiteiros do efectivo nacional)
não justifica uma medida tão drástica. Desproporcionada porque tomada com uma
celeridade que não usou para com o Reino Unido, quando era bastante maior a
gravidade quantitativa e qualitativa da situação epidemiológica, para lá da
longa cumplicidade na ocultação do problema. Injusta porque atinge milhares
de produtores nacionais, a esmagadora maioria dos quais com efectivos completamente
indemnes. Hipócrita porque a Comissão, com esta decisão, pretende apresentar
serviço escondendo as suas responsabilidades no alastramento da doença entre
os Estados membros e que foi alvo de condenação no inquérito realizado pelo
Parlamento Europeu. Hipócrita ainda porque enquanto toma a decisão do embargo
a Comissão Europeia prepara o terreno para permitir a importação de gado dos
Estados Unidos tratado com hormonas. Hipócrita porque a Comissão Europeia continua
a defender uma PAC - inclusive nas suas propostas de reforma contidas na Agenda
2000 - não só injusta socialmente, mas também onde o critério guia é a competitividade
sem fronteiras. Assim se incentivam modelos agrícolas produtivistas, onde vale
tudo para reduzir os custos de produção e aumentar as taxas de rentabilidade,
inclusive com a introdução na cadeia alimentar de produtos e subprodutos químicos,
biológicos, transformados geneticamente, etc., cujas consequências não estão
suficientemente testadas e acauteladas. Hipócrita, finalmente, porque a desregulamentação
e liberalização dos mercados, sem controle de fronteiras, impulsiona o alastramento
de doenças em todo o espaço comunitário.
3. Mas é evidente a responsabilidade
dos Governos portugueses nesta matéria. Responsabilidade particularmente grave
porque estava e está em causa a saúde dos portugueses e, em questões de saúde
pública não poderia nem deveria haver adiamentos, hesitações ou reflexões contabilísticas
sobre os custos das medidas necessárias. Responsabilidade pelos problemas causados
a muitos milhares de agricultores e à agricultura portuguesa, Responsabilidade,
finalmente, pelo espaço de manobra que proporcionaram á Comissão Europeia.
Do governo anterior, do PSD, está feita a história: a estratégia de sigilo,
ocultação da doença e sonegação de informação, entre 1990 e 1994, é responsável
pela não adopção atempada de medidas contra a BSE, pelo alastramento da doença,
pelo clima de suspeição criado na opinião pública e nas instâncias internacionais.
O PSD não tem, hoje, o mínimo direito moral de criticar uma situação cuja origem
é da sua própria responsabilidade.
4. Contudo, nada disto pode fazer
diminuir as elevadas responsabilidades do actual Governo do Partido Socialista
por, ao longo deste mandato, não ter tomado as medidas que controlassem e impedissem
a propagação da doença e que não dessem á Comissão Europeia o pretexto para
o embargo agora decidido. O Governo do PS limitou-se, no essencial, a uma
operação mediática de abate de todos os bovinos suspeitos. Mas não adoptou
as medidas mais importantes que se impunham, que tinham absoluto consenso entre
as forças políticas, a comunidade científica e os próprios serviços do Ministério,
quais sejam: a proibição do uso de farinha de carne e de ossos e outros materiais
de risco em toda a cadeia alimentar animal (proposto ao então Secretário
de Estado da Agricultura e hoje Ministro da Agricultura Capoulas Santos pelo
menos, desde Abril de 1996, pelo Instituto de Protecção da Produção Agro-Alimentar,
e só decidido agora, a correr, nas reuniões de 24 de Setembro de 1998 e 22 de
Outubro 1998 do Conselho de Ministros); o controlo efectivo das unidades
de transformação de subprodutos de origem animal com a presença em cada uma
de agentes sanitários e veterinários e a proibição de laboração de todas aquelas
unidades que não tivessem procedido á sua reconversão tecnológica para assim
se garantir a não reciclagem da doença; a regulamentação e criação efectiva
de um Corpo Nacional de Inspecção Sanitária.
5. Acresce que o Governo do PS não desencadeou,
ao contrário do que foi aprovado e recomendado por todas as forças políticas
no relatório da audição parlamentar realizado pela Assembleia da República em
Maio de 1996, nenhuma campanha sistemática de informação á opinião pública e
de promoção da produção nacional de carne bovina, designadamente das raças autóctones
com denominação e certificação de origem.
6. Face ao embargo agora decretado
o PCP exige:
- A adopção de medidas diplomáticas enérgicas para, rapidamente, ser conseguido o levantamento do embargo.
- A adopção e execução de medidas de controlo efectivo da
doença, como a interdição do uso de materiais de risco em toda a cadeia
alimentar animal; de controlo das unidades de rações e de processamento
dos subprodutos; de organização de um sistema nacional de inspecção e
controlo sanitário.
- Medidas financeiras para o saneamento do mercado
nacional de bovino e indemnização aos produtores nacionais e a toda a
fileira nacional, afectados pelo embargo, com inscrição desde já de uma
dotação no Orçamento de Estado para 1999.
- A promoção da carne nacional indemne, designadamente das raças autóctones com certificação e denominação de origem.
- Rigoroso controlo e fiscalização sanitária do gado e carne importadas.