Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, quero começar este pedido
de esclarecimento dizendo que o que esperamos do debate que hoje aqui se reinicia
sobre a interrupção voluntária da gravidez é que saia uma alteração da lei que
permita combater realmente o aborto clandestino e não uma alteração que o seja
apenas no papel.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E partindo deste princípio, importa colocar-lhe algumas questões
sobre o projecto de lei que acabou de apresentar.
Em primeiro lugar, a questão dos Centros de Aconselhamento Familiar (CAF). Já
não falo só da questão de princípio que é, ao introduzir uma consulta obrigatória
no processo de acesso da mulher à interrupção voluntária da gravidez, esta imposição
ser uma intromissão real no direito de decisão íntima da mulher e uma violação
da sua liberdade de optar, que se quer estabelecer neste primeiro período da
gravidez, falo também da questão prática, por isso gostava de saber se o Sr.
Deputado Sérgio Sousa Pinto não está consciente de que esta consulta obrigatória
pode criar obstáculos numa situação em que as mulheres já estão constrangidas
e pressionadas e vir, por este meio, a empurrá-las novamente e ainda para o
aborto clandestino.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Será que o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto não reconhece que a cobertura
geográfica que os senhores prevêem no vosso projecto de lei para estes centros
ou que, eventualmente, venha a existir pode ser um claro entrave ao acesso das
mulheres à interrupção voluntária da gravidez a seu pedido? Será que podemos
fazer tábua-rasa da experiência das comissões de ética hospitalares e dos efeitos
que a sua acção teve na aplicação mesmo da lei anterior?
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, há ainda uma outra questão importante no vosso projecto
de lei que importa aqui ser esclarecida, que é a questão das 10 semanas, da
redução da vossa proposta das 12 para as 10 semanas no que diz respeito à interrupção
voluntária da gravidez a pedido da mulher.
Sabendo que a descoberta da gravidez e a tomada de uma decisão é muitas vezes
tardia, especialmente nos casos das jovens mulheres, nos casos das mulheres
com menos recursos económicos, afinal, nos casos daquelas que são mais penalizadas
pela legislação existente, será ou não verdade que a redução deste prazo implicará
para estas decisões algo tardias uma efectiva negação do seu direito de acesso
à interrupção voluntária da gravidez? E como se justifica esta redução, Sr.
Deputado Sérgio Sousa Pinto, sabendo que até às 12 semanas, e não às 10, os
riscos para a saúde da mulher são diminutos e até menores do que os do próprio
parto? Como se justifica, Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, a redução e o recuo
nesta matéria, quando há um consenso alargado em torno do prazo das 12 semanas,
consenso esse em que os Srs. Deputados já estiveram e que agora deixam de lado
para apresentar um prazo diferente?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, o que importa aqui não é gerar
consensos à volta de uma qualquer solução mas, sim, à volta da solução justa,
que é a solução das 12 semanas.
Portanto, o Sr. Deputado deve explicar a esta Câmara se não considera que a
conjugação da redução do prazo para as 10 semanas com a imposição da consulta
prévia no Centro de Atendimento pode continuar a empurrar as mulheres para o
aborto clandestino e se não será esta uma forma, como outras, de contornar a
real resolução do problema.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que esta questão para nós não admite
qualquer negócio. A nossa preocupação neste debate é de garantir os direitos
das mulheres e salvaguardar a sua saúde, e estes direitos não são negociáveis
nem podem ser limitados.