Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

Sobre a interdição do uso do glifosato

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Este caso do glifosato, produto comercializado com o nome de Roundup, não é, infelizmente, único; existem outros produtos que têm sido alvo de discussão e de polémica, nomeadamente o exemplo dos neonicotinóides aplicados à apicultura.
Mas este caso é um bom exemplo de como é que a submissão aos interesses das grandes empresas, das multinacionais à anulação das instituições nacionais face a entidades da União Europeia, a destruição da capacidade de intervenção do Estado, são prejudiciais para o nosso País.
Em 2012, o Grupo Parlamentar do PCP perguntou ao Governo o que é que se passava com a Comissão Consultiva de Pesticidas e a Comissão de Avaliação Toxicológica de Produtos Fitofarmacêuticos, Comissões estas que tinham sido criadas em 1994. O Governo dizia que, face a um novo regime comunitário, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar é que trata agora destas matérias e que, por isso, podemos anular — e esta resposta era assumida — as Comissões que temos no nosso País, porque a União Europeia está a fazer o trabalho por nós.
Por isso, o Governo português abdicou das estruturas do seu País para colocar estas matérias apenas sob as mãos da União Europeia.
Uma outra questão que julgo ser relevante neste caso é o facto de o Governo português ter estado empenhado naquilo a que chama reestruturação dos laboratórios de Estado, porque, na prática é uma destruição ou uma limitação da capacidade de intervenção desses laboratórios. E, sem laboratórios públicos, sem laboratórios isentos, não há maneira de fazer contraditório relativamente a um conjunto de estudos e de matérias, e isso deixa nas mãos das multinacionais que vendem estes produtos que sejam elas a terem a única palavra sobre os mesmos. Por isso, os laboratórios públicos eram também o garante da salvaguarda da saúde e do ambiente no nosso País e estão a ser destruídos.
Por último, este caso do glifosato põe a nu que as consequências da ação das multinacionais do agronegócio é uma matéria em que há uma espécie de Tratado de Tordesilhas, para divisão do mundo entre a Monsanto e a Syngenta sobre esta matéria, em que a atividade agrícola fica muito dependente dos seus produtos.
Veja-se que, neste caso, a Monsanto comercializa o glifosato, mas também os organismos geneticamente modificados (OGM) que são resistentes a este produto.
Por outro lado, o glifosato que a Monsanto comercializa parece ter consequências para a saúde humana mas, depois, temos ainda o problema de que a agricultura não tem outras soluções para além do glifosato.
Está aqui, claramente, montado um problema relativamente a esta matéria, e trata-se de um problema que não é de fácil resolução.
Claramente, não é um problema de fácil resolução, mas é um bom exemplo de que o modelo do agronegócio que se tem vindo a instalar no nosso País não serve nem os interesses do País nem os interesses dos portugueses.
Termino Sr. Presidente, dizendo que, pelo atrás exposto, é necessário fazer algo — e há muito a fazer — para libertar o País deste tipo de situações.

  • Ambiente
  • Saúde
  • Assembleia da República
  • Intervenções