Nota do Gabinete de Imprensa dos Deputados do PCP ao PE

Sobre o discurso de Durão Barroso

Sobre o discurso de Durão Barroso

No discurso proferido no passado dia 12 de Setembro, pelo presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, sobre o Estado da União, foi defendida a criação de uma Federação de Estados, condicionada à prévia alteração do Tratado Europeu.

Perante o aprofundamento da crise estrutural do capitalismo, perante a expressão cada vez mais violenta que essa crise vem assumindo na UE e na Zona Euro, perante o crescente descrédito da UE e das suas instituições aos olhos dos trabalhadores e dos povos europeus, o presidente da Comissão Europeia ensaia mais uma fuga para a frente. Esta proposta - que constituiria um salto qualitativo sem precedentes na imposição supranacional das políticas e orientações que estão na origem da actual crise e na escalada de ataque à democracia e à soberania dos povos - não resolve nenhum dos problemas com que os trabalhadores e os povos da Europa se defrontam, pelo contrário constituiria, a ser concretizada, um factor acrescido para o seu agravamento. A profunda crise em que a UE está mergulhada resulta das políticas e das orientações que, desde há anos, têm sido impostas aos trabalhadores e aos povos. Políticas que promovem a exploração dos trabalhadores, que atacam a democracia e a soberania, acentuam a divergência e desigualdade entre países, e impõem a transferência da riqueza dos trabalhadores para o grande capital económico e financeiro. Não haverá saída para a crise no quadro da persistência destas políticas, não haverá saída para a crise no quadro da manutenção do actual quadro de integração europeia.

A postura da União Europeia assumida por Durão Barroso de propor alterações na arquitectura institucional da UE apenas vem demonstrar que as famílias políticas que há décadas controlam o processo de integração - direita e social-democracia - não têm solução para a crise senão a insistência e o aprofundamento da natureza política das políticas que estão na origem da crise. São alterações que visam, antes de mais, criar novas e mais favoráveis condições para prosseguir estas mesmas políticas de desastre e de retrocesso social que vêm sendo impostas aos trabalhadores e aos povos, com a brutalidade que se conhece.

Entre as mudanças anunciadas, contam-se novos passos na integração económica e política, a alteração do estatuto dos partidos políticos europeus, com a alteração do método de eleição do Parlamento Europeu e do presidente da Comissão Europeia - estas, segundo Barroso, dispensando qualquer alteração ao Tratado. É mais um golpe institucional que se anuncia, dando nova e reforçada expressão ao confronto crescente desta UE com os mais elementares princípios e valores democráticos.

Foi também apresentada a proposta de criação da União Bancária, atribuindo-se ao BCE o papel de supervisão bancária supranacional. Convém lembrar que o BCE é a entidade que, em nome de uma falsa independência, tem cumprido o triplo papel de lançar os Estados nas garras dos especuladores financeiros, de reduzir os custos de refinanciamento do grande capital e de promover a exploração do trabalho, por via da compressão dos salários.

A União Económica e Monetária privou os Estados da Zona Euro da política monetária, ao mesmo tempo que lhes limitou fortemente a política orçamental e fiscal. Os resultados estão bem à vista, em Portugal e nas demais economias periféricas. Estes são instrumentos fundamentais para adequar as políticas públicas à situação, necessidades e anseios de cada país e de cada povo. Agora, pretende-se retirar do controlo dos Estados a supervisão e regulação do sector financeiro - sector fundamental para o financiamento das economias - que deixaria assim de estar sob controlo e escrutínio público, democrático. Tal facto, a verificar-se, seria a confirmação da falsidade da proclamada independência do BCE, facto aliás bem patente na forma como o BCE decidiu intervir no mercado secundário da dívida.

O que a economia portuguesa necessita para crescer é antes, a nacionalização da banca comercial, colocando-a ao serviço da economia nacional. Portugal necessita de uma banca pública que financie o aumento da produção nacional e um programa da reindustrialização, instrumento fundamental para criar empregos com direitos, valorizar salários, diminuir a dependência externa do país, resolvendo assim os problemas do défice e da dívida pública.

O que Portugal necessita não é de um aprofundamento do carácter neoliberal e federalista da União Europeia e de novos passos que confirmem a União Europeia como um bloco de natureza imperialista com relações de domínio de tipo colonial no seu seio. O que Portugal, os trabalhadores e o povo português necessitam é de uma inversão completa do rumo, objectivos e natureza do processo de integração europeia.

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