Como era esperado, o Conselho Europeu aprovou o novo Quadro Financeiro Plurianual, bem como o “Fundo de Recuperação”.
As dificuldades e impasses em torno da aprovação destes instrumentos financeiros, e a forma como foram ultrapassados, confirmam contradições e problemas indissociáveis da natureza da União Europeia, que estão longe de estar superados e que vão para além de manifestas divergências com a Hungria e a Polónia.
A aprovação do Quadro Financeiro Plurianual para o período de 2021 a 2027, fixado em 1074 mil milhões de euros, confirma uma diminuição de verbas face ao Quadro Financeiro anterior, entre 2014 e 2020.
Sem prejuízo de um conhecimento mais detalhado, nomeadamente sobre os montantes a receber e a pagar por cada país, o PCP considera que o acordo alcançado padece de gravosas insuficiências que prejudicam objectivamente os interesses de Portugal, uma vez que prevê um corte significativo nas verbas destinadas à chamada coesão económica, social e territorial e à agricultura e pescas, bem como o aumento da contribuição nacional para o Orçamento da União Europeia.
Acresce que o acordo alcançado prevê ainda a diminuição das contribuições dos países que mais beneficiam com o Euro e o mercado único, como a Alemanha, a Holanda, a Áustria, a Suécia ou a Dinamarca.
Tais factos confirmam a tendência geral de aprofundamento de assimetrias de desenvolvimento e desigualdades entre países.
Sublinha-se ainda que, ao mesmo tempo que se reduzem as verbas dirigidas à chamada coesão económica e social, se aumentam de forma inaceitável as verbas destinadas à acentuação da vertente militarista e intervencionista da União Europeia.
O denominado Fundo de Recuperação e Resiliência situa-se, como o PCP alertou, longe dos montantes inicialmente anunciados, confirmando-se como insuficiente face à gravidade da situação e às necessidades de investimento público por parte de alguns Estados.
A ideia de que Portugal nunca recebeu tanto dinheiro oculta grosseiramente que essas verbas resultam, essencialmente, da antecipação de verbas de futuros orçamentos comunitários ou de contração de empréstimos, facto que poderá determinar que, a partir de 2028, Portugal venha a ter menos recursos disponíveis e maiores encargos financeiros, num quadro de ainda maior dependência. Ou seja, não se trata de um efectivo apoio por via de subvenções a fundo perdido.
Tal como o PCP alertou, a utilização das verbas ao abrigo do denominado Fundo de Recuperação fica ligada à imposição de condicionalismos e sujeita à aprovação pela União Europeia.
No entanto, o PCP considera que a utilização dos meios financeiros deve ser determinada pela necessária resposta aos problemas que os trabalhadores, o povo e o País enfrentam, contribuindo para assegurar o desenvolvimento soberano de Portugal, e não subordinada às prioridades e interesses dos grandes grupos económicos e financeiros e das grandes potências da União Europeia.
Contrariamente ao discurso da “flexibilidade” na utilização das verbas, o que se evidencia é o objectivo de instituir condicionalidades, concebidas para impor opções de investimento e ditas “reformas estruturais” – como o ataque a direitos laborais e aos sistemas públicos de Segurança Social –, assim como o aprofundamento do mercado único, nomeadamente através da chamada “economia verde”, do “mercado único digital” ou ainda da intenção da criação de um dito “mercado europeu da saúde”.
O PCP reafirma a sua rejeição da criação de denominados “impostos europeus”, projecto que atenta contra a soberania económica e orçamental dos Estados e que subverte o princípio de que o orçamento da UE deve ter por base as contribuições nacionais dos Estados-Membros, segundo o seu rendimento nacional bruto.
O PCP alerta ainda para o incremento mecanismos – como o dito “mecanismo para a democracia e Estado de direito” – que representam acrescidos condicionalismos e, se necessário, eventuais formas de chantagem, que mais do que terem como preocupação a defesa da democracia, visam salvaguardar a política neoliberal, incluindo a prevalência da concorrência capitalista no mercado único, sobre qualquer perspectiva de solidariedade ou a soberania dos Estados, segundo os interesses e as conveniências das grandes potências da União Europeia e dos grupos monopolistas.
Aliás, o chamado “braço de ferro com a Hungria e a Polónia” traduz-se, no essencial, num exercício de hipocrisia, quando a União Europeia mantém no fundamental intocadas as suas relações com a Turquia, quando pactua objectivamente com situações como a da Ucrânia ou quando em vários países que integram a UE crescentemente se atropelam direitos, liberdades e garantias fundamentais.
O PCP condena o reforço do militarismo da União Europeia, associado à NATO, assim como a adopção de uma política de sanções, numa clara confluência, e mesmo submissão, da UE aos objectivos de “liderança mundial” dos EUA, agora afirmados por Joe Biden.