Recentemente, o Comissário Solbes Mira confirmou o que já se sabia há muito: que as metas dos programas de estabilidade não seriam cumpridas em 2002. Assim se passa com a Alemanha, a França e a Itália, sendo hoje já certo que o défice público na Alemanha superará o limiar dos 3% em 2002 (como já admitido pelo Ministro das Finanças alemão) e possivelmente em 2003. A realidade acabou por se impor. A proposta da Comissão vem demonstrar, apesar da reafirmação de princípios, os objectivos iminentemente políticos do Pacto de Estabilidade e os seus limites, nomeadamente em períodos de recessão/desaceleração económica.
O Pacto tem servido de justificação a uma política de privatizações, em áreas que põem em causa o serviço público e direitos fundamentais, como a saúde, a educação, o investimento público e a correcta e cabal execução dos Fundos Estruturais. É irracional a tentativa de aplicação de uma mesma política orçamental que não respeita as diferenças de níveis de desenvolvimento no interior da zona Euro, a implicar respostas diferenciadas em cada Estado-membro.
É, no mínimo, caricato, que na mesma altura que se enceta um procedimento de défice excessivo a Portugal, com a recomendação directa de se prosseguirem políticas anti-sociais e deflacionistas, o Comissário Pascal Lamy venha afirmar em entrevista ao diário italiano "Ils sole 24 Ore" que considera a regra dos 3% como "medieval" e que o "Pacto é um instrumento grosseiro de governação económica". Ou que o Presidente da Comissão Europeia Romano Prodi, em entrevista ao jornal "Le Monde" reconheça as imperfeições do Pacto e a necessidade da sua flexibilização, considerando-o um instrumento "estúpido" e "rígido". Até o primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin afirmou que o único limite que existe é dos 3% e, por isso, não irá cumprir as metas dos programas de estabilidade, mas sim prosseguir as suas promessas eleitorais de desagravamento de impostos e de aumento das ajudas estatais. O próprio chanceler Gerard Schroeder, impulsionador da criação do Pacto para aceitar a UEM, insinua que não deve ter uma visão dogmática do mesmo.
Neste contexto, pergunto à Comissão:
- Que sentido faz a manutenção do Pacto de Estabilidade? Porque não opta pela sua suspensão imediata, acompanhado de um amplo debate sobre as actuais orientações de política económica e monetária, visando a sua revisão, para ter em conta o crescimento do emprego com direitos e a luta contra a pobreza e a exclusão social?
- Não considera que face a todas as afirmações públicas de responsáveis da Comissão se devia suspender de imediato o procedimento de défice excessivo levantado contra Portugal?