Declaração de Vasco Cardoso, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, Conferência de Imprensa

Sobre a 10ª avaliação da troika e a sua articulação com as medidas que o governo quer agora impor

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Quase dois anos e meio depois da entrada da Troika em Portugal, a situação do país é de tal forma grave que já nem mesmo os maiores entusiastas e promotores dessa opção, se atrevem hoje a designar o chamado memorando de entendimento de “ajuda externa”.

Tal como o PCP sempre afirmou, o acordo estabelecido entre o PS, o PSD e o CDS com a União Europeia, o BCE e o FMI foi, e é de facto, um Pacto de Agressão em que o principal objectivo, em nome da dita consolidação das contas públicas, foi o do agravamento da exploração e do empobrecimento do povo português para satisfazer os interesses e os lucros do grande capital nacional e transnacional.

E tal como sucedeu com cada uma das avaliações anteriores, a chamada 10ª avaliação da troika que está em curso, num processo de mistificação, encenação e chantagem, visa abrir caminho a novas medidas da parte do governo contra os trabalhadores, o povo e o país.

1. O PCP sublinha que não existe nem negociação, nem oposição do Governo aos objectivos da troika. Que não estamos perante uma troika que defende os credores e um governo que defende o país como habilidosamente procuram fazer crer. Antes pelo contrário, o que a realidade tem demonstrado é uma articulação, sintonia e coordenação na aplicação de uma política de traição nacional favorável aos interesses do grande capital nacional e estrangeiro. Articulação na diminuição dos salários e das pensões, no ataque aos direitos de quem trabalha, na privatização de empresas estratégicas, na destruição das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, nos apoios dados à banca, nos privilégios, nas rendas, nos benefícios fiscais concedidos aos grupos económicos e financeiros.

Sintonia também na forma em como exercem uma inaceitável pressão para continuar a impor uma política fora da lei e em confronto aberto com a Constituição da República.

E coordenação quando, em declarações e iniciativas combinadas, tudo fazem para virem a impor uma significativa redução do valor dos salários por via da facilitação e liberalização dos despedimentos e da liquidação da contratação colectiva.

2. Acompanhando os cortes salariais que o Governo por via do Orçamento do Estado quer impor à administração pública no próximo ano e no seguimento das alterações verificadas à legislação laboral – com o aumento do trabalho não pago, o roubo de feriados, a redução do valor das horas extraordinárias, a promoção de agravadas formas de precariedade – e de outras medidas como o aumento do IRS, o aumento do horário de trabalho ou o congelamento do salário mínimo nacional desde 2011, uma das questões centrais que está a ser articulada com o Governo no âmbito desta 10ª avaliação é um novo ataque aos salários e um brutal agravamento da exploração de quem trabalha.

Hipocritamente, ao mesmo tempo que dizem não querer um país de baixos salários, preparam a facilitação e liberalização dos despedimentos e a liquidação da contratação colectiva. Tais medidas, se alguma vez fossem por diante, num contexto em que mais de um milhão e quatrocentos mil trabalhadores estão desempregados, traduzir-se-iam num retrocesso para níveis de exploração semelhantes aos dos tempos do fascismo em Portugal.

3. Com um país a entrar no terceiro ano consecutivo de recessão económica, com uma dívida pública em crescimento e cada vez mais insustentável, com uma destruição de quase meio milhão de postos de trabalho nestes dois anos, com um desemprego brutal que só não atinge maior dimensão porque mais de 220 mil portugueses foram forçados a emigrar, com uma população em empobrecimento acelerado, com centenas de empresas a encerrar, com um país mais atrasado, mais dependente, mais injusto e desigual, não pode haver nenhuma avaliação positiva do cinicamente chamado programa de assistência financeira.

No entanto veremos o governo e a troika dizer que é preciso prosseguir com a “abertura” da economia portuguesa ao exterior, ou seja dar continuidade à criminosa política de privatizações. Assistiremos à invocação da necessidade de maior “competitividade fiscal”, ou seja menos impostos para o grande capital por via da chamada reforma do IRC na qual o PS também está empenhado. Continuarão os apelos à “reforma do Estado” visando ainda mais cortes nos serviços públicos e nos apoios sociais. Invocar-se-á a “sustentabilidade da segurança social” para, em vez de criar emprego e diversificar as suas fontes de financiamento, aumentar a idade da reforma e cortar ainda mais prestações sociais. Falarão da necessidade de um “plano B” para substituir medidas que fiquem pelo caminho mas escolhendo sempre as mesmas vítimas. E recusarão a cada vez mais urgente renegociação da dívida pública, para continuar a alimentar o saque por via dos juros – mais de 7300 milhões previstos para o próximo ano – e perpetuar as políticas de austeridade pelas próximas décadas, com ou sem troika.

4. O que esta, como as restantes avaliações da troika estão a demonstrar, é sobretudo um vergonhoso processo de abdicação dos interesses nacionais. É a cedência permanente perante as potências estrangeiras e a União Europeia. É a degradação da nossa soberania e independência nacionais, assumida todos os dias pelo governo e pelo próprio Presidente da República que é também cúmplice e promotor desta situação.

5. O PCP denuncia e rejeita este caminho. Para o PCP, o país não pode esperar pelo fim do chamado programa de assistência financeira em Junho do próximo ano como diz o governo, ou pelo fim da legislatura em 2015, como quer o PS.

Cada dia, cada mês que passa com esta política e com este governo, mais portugueses verão as suas vidas destruídas e mais difícil será corrigir os roubos, as injustiças e os atrasos que o Pacto de Agressão está a impor ao país.

O PCP reafirma uma vez mais a urgência da demissão deste governo e da convocação de eleições antecipadas. Uma exigência que mobiliza aliás cada vez mais trabalhadores e amplos sectores da sociedade, que compreendem que não pode haver saída com esta política de desastre. Que não querem ver-se apenas livres da troika, querem também acabar com este governo e com esta política que há mais de três décadas e meia atinge o país. Querem uma política patriótica e de esquerda e um governo que a concretize.

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