É também claro o fraco investimento em instalações e equipamentos no SNS, bem patente no facto de, mesmo com verbas já escassas à partida, a execução do investimento previsto no Orçamento do Estado para o SNS nos últimos três anos ter ficado em média pelos 40% do total.
É uma evidência que as parcerias público privadas não são uma alternativa para este problema, dado que promovem a generalização de situações de precariedade laboral, reduzindo ao mínimo (e até abaixo do mínimo) os recursos humanos disponíveis para os respetivos serviços e criando assim condições inadequadas de atendimento às populações. Naturalmente que a praticamente inexistente fiscalização das condições de laboração das unidades entregues à gestão privada, lhe permite esconder este tipo de situações.
A literatura internacional tem vindo a demonstrar que, para além de recorrentes fenómenos de seleção adversa de utentes, é na redução dos custos com pessoal que a gestão privada de serviços públicos aposta para maximizar as suas margens de lucro.
O Plano de Emergência da Saúde emitido a 29 de Maio de 2024 pelo gabinete da Ministra da Saúde aponta para uma “capacidade adicional para a prestação de cuidados de saúde primários em dois concelhos com elevada taxa de utentes sem Médico de Família atribuído (Cascais e Sintra), estabelecendo uma parceria com o Hospital de Cascais (parceria público-privada) que permitirá cobrir até mais 75 mil utentes”.
O Governo, em vez de apostar nos cuidados primários de saúde, designadamente criando condições para atrair e fixar médicos de família, enfermeiros de família e outros profissionais indispensáveis, opta por privatizar os cuidados de saúde primários a que estes utentes têm direito e provavelmente desqualificá-los em meras consultas de atendimento atomizadas e sem continuidade do acompanhamento.
No entanto, aos dias de hoje, a carência de profissionais no Hospital de Cascais é já extrema e tem resultado na redução assistencial. Em Junho verifica-se o encerramento de três salas de bloco de partos, e de seis camas no serviço da Unidade de Cuidados Intermédios Pediátricos, afectando a equipa e o serviço de neonatologia.
A resposta insuficiente resulta ainda de desorganização, pois durante o mês de Junho o serviço de ginecologia e obstetrícia foi maioritariamente ocupado por outras especialidades, nomeadamente de pneumologia e utentes que não têm resposta na continuidade dos seus cuidados fora do hospital ocupando 17 camas neste serviço.
Ao nível da enfermagem a situação é crítica. O hospital tem recorrido à subcontratação em muitos serviços e, mesmo assim, há enfermeiros com 200 horas programadas de horário, ao invés de 160h e o rácio enfermeiro/utente é baixo.
No mês de Junho, o recobro do bloco operatório tem sido assegurado por dois enfermeiros por turno para 15 camas (4 delas de nível de cuidados intermédios) e a pediatria tem contado com dois enfermeiros por turno para 14 crianças.
Esta realidade compromete seriamente a segurança dos cuidados prestados, demonstrando que o modelo PPP não responde às necessidades em saúde das populações.
Ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, solicitamos ao Governo que por intermédio do Ministério da Saúde, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
1 - Qual o investimento que será direccionado para as unidades/centros de saúde que compõem os Agrupamentos de Centros de Saúde de Sintra e de Cascais?
2 - Quando pensa o Governo reverter a gestão privada no Hospital de Cascais?
3 - Que fiscalização está a ser feita do funcionamento dos vários serviços do Hospital de Cascais e da sua gestão privada?
4 - O Governo conhece as situações, atrás referidas, de carência de profissionais, horários abusivos e forte condicionamento de serviços?
5 - O atendimento dos referidos 75 mil utentes será assegurado por médicos e enfermeiros de família, garantindo a continuidade dos cuidados, como é próprio dos cuidados primários de saúde?