Declaração de João Frazão, da Comissão Política do PCP

A situação do sector leiteiro

SECTOR LEITEIRO – UMA PROFUNDA CRISE

Face à grave e profunda crise em que se encontra o sector leiteiro no nosso País e tendo em conta a realização, na próxima Segunda–Feira, 7 de Setembro, da reunião extraordinária do Conselho Europeu de Ministros da Agricultura, que tem como objectivo discutir o sector, a Comissão Política do PCP considera necessário assinalar:

A grave crise do sector leiteiro encontra as suas raízes nas opções da PAC – Política Agrícola Comum – da União Europeia e na submissão acrítica a essas opções dos sucessivos governos portugueses da responsabilidade do PS, PSD e CDS-PP.

São as políticas de uma União Europeia enfeudada aos interesses dos grandes e mais intensivos produtores da Agro-Indústria, e dos países do Centro e Norte da Europa - que apostam na desregulamentação total para poderem inundar o mercado de produtos a baixíssimo preço – que colocam em causa a sobrevivência do sector em Portugal.

É bem real a crise a que aludem milhares de Produtores que, nos últimos meses, vêm protestando em sucessivas manifestações, concentrações, marchas de tractores, distribuição de leite nacional. Acções de luta que o PCP saúda pela sua combatividade e pela justeza dos seus objectivos.

A crise do sector é real devido às grandes baixas nos preços à produção – uma baixa que chega aos 20 cêntimos por litro de leite ou seja 50% de baixa comparativamente com os preços à produção praticados há ano e meio atrás - enquanto se mantém o alto custo dos factores de produção, (rações, adubos, combustíveis, fertilizantes, medicamentos). Aumentos entre 50% e 100% do preço dos principais factores de produção que foram justificados, o ano passado, pela escalada dos preços do petróleo mas que, depois, não acompanharam a baixa dos preços que se registou.

Crise real que o Governo ajudou a agravar com o atraso do PRODER e a exclusão, até há pouco, de todo o sector pecuário das condições de acesso e de financiamento como fileira prioritária, mas que se esforçou por esconder, até aos limites do bom senso. Vejam-se as declarações do Ministro da Agricultura já em 26 de Março deste ano. Jaime Silva, face a uma das maiores manifestações dos últimos anos, promovida pela CNA, em Lisboa, afirmava não compreender as reivindicações dos agricultores, porque, por um lado a crise não tinha chegado ao sector e, por outro lado, todas as medidas já estariam no terreno.

Crise que vinha de trás, mas que se agudizou de maneira muito intensa com a importação de leite a preço de saldo, designadamente pela grande distribuição. O aparecimento de Leite nas prateleiras dos hipermercados a menos de 0,40€ o litro, só se pode explicar pelo interesse dos grandes e mais intensivos países produtores em escoar o produto a qualquer preço, para não terem que custear o seu armazenamento. Processo a que o Governo fez vista grossa durante todo este tempo, apesar dos sucessivos alertas do PCP.

Aliás, são de todo inaceitáveis as declarações proferidas, anteontem, à saída de uma reunião com os representantes da grande distribuição que se viram assim absolvidos de qualquer crítica pela parte do Governo que deveria defender a pecuária e a agricultura nacional. Jaime Silva demonstrou ao serviço de quem, de facto, está ao garantir peremptoriamente a qualidade de todos os leites importados, bem como ao garantir que não há prática de qualquer “dumping” no sector. Se o Governo tivesse essa garantia bem poderia responder às perguntas que o PCP lhe colocou na Assembleia da República, e que continuam sem resposta.

Crise que tem sérios reflexos para a economia portuguesa, uma vez que, ao importar cerca de 250 milhões de litros de leite, impede o escoamento de dezenas de milhões de litros de produção nacional, contribuindo assim para aprofundar o brutal défice externo e o défice da balança agro-alimentar que hoje já é de cerca de 80%.

Crise que tem como elemento central a intenção da União Europeia em acabar com as quotas leiteiras, único sistema de regulação dos mercados e de defesa da produção nacional, intenção a que não se opuseram nem o actual governo nem os governos anteriores.

Na verdade, este sinuoso caminho, que este ano alargou já em 1% (2,5 milhões de litros) as quotas existentes na UE (cujo efeito prático é concentrar a produção à custa da liquidação dos pequenos e médios produtores), vem sendo percorrido por todos os governos desde 1999, tendo mesmo como protagonista em vários momentos, o actual Ministro da Agricultura.

Ora o PCP não pode deixar de estranhar a anunciada intenção por parte do Governo de defender na reunião da próxima segunda- feira a suspensão do fim das quotas, quando é sabido que, em 2008, após idêntico anúncio, foi este mesmo Governo que se posicionou ao lado dos que aceitaram esse caminho. E que ainda em Julho passado, a Comissária da Agricultura anunciava que “conforme o Conselho Europeu deixou claro, não revogaremos a nossa política de supressão gradual das quotas”.

 

 

GOVERNO ABANDONA OS PRODUTORES DE LEITE

O PCP acusa o Governo de, em vez de uma posição clara na defesa dos interesses nacionais e dos produtores de leite, tentar tirar partido das dificuldades de milhares de produtores, distribuindo subsídios para os retirar da produção, acabando com a produção em vastas zonas, como é o caso do Planalto Mirandês e da Guarda.

O PCP não pode deixar de lamentar, a atitude de resignação deste Governo dando por adquirido o abandono do sector leiteiro por parte de mais 3000 produtores. Isto num país que há cerca de 15 anos tinha mais de 80 mil produtores e hoje tem menos de 11000, sendo que só no último ano desapareceram cerca de 1000.

E se é verdade que se produz tanto leite como há dez anos, também é indesmentível que o mundo rural está hoje mais desumanizado e os campos estão mais ao abandono, pasto quantas vezes dos incêndios como aqueles que têm assolado o País nos últimos dias.

PCP RECLAMA MEDIDAS
 
Face a esta situação, o PCP desafia o Governo a assumir, no próximo Conselho Agrícola (extraordinário) da União Europeia, uma posição clara e firme de defesa do sector leiteiro nacional. No respeito, aliás, pela “Resolução 63/09 de 4 de Agosto”, proposta pelo PCP, e aprovada por unanimidade há poucas semanas, na Assembleia da República e que consagra várias medidas imediatas de apoio à produção nacional de leite.

Desde logo, o Governo Português deve defender a manutenção das quotas nacionais para além de 2015 e não apenas a sua suspensão, situação que nada resolveria e nem serviria para adiar os problemas uma vez que eles estão já a fazer-se sentir.

O PCP defende, designadamente, a instituição, no quadro das ajudas “minimis”, de uma compensação até 5 cêntimos por litro para as explorações agrícolas familiares até 100 vacas em produção, enquanto durar a presente baixa de preços à Produção.

A não ser assim, o Governo PS ficará ligado a uma das mais negras páginas da agricultura nacional e deverá ser responsabilizado por isso.

Para o PCP, a questão central é criar condições para que os actuais produtores se mantenham em actividade e a estratégia para a agricultura nacional só pode ter como objectivo assegurar, num quadro de sustentabilidade e diversidade produtiva, o máximo de agricultores e de produção agro-alimentar em todo o território nacional, visando a segurança e soberania alimentares dos Portugueses. Pois para o PCP, a defesa dos interesses dos agricultores em geral e dos produtores de leite em particular, é parte integrante da defesa do tecido produtivo nacional e de uma política orientada para a superação da grave crise com que o país se debate.

O País não compreende e o povo português não perdoará que passemos de uma nação produtora de leite para uma situação de absoluta dependência face ao exterior.

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