Intervenção de

Sistemas de videovigilância em táxis - Intervenção de António Filipe na AR

Regulamentação da instalação e utilização de sistemas de videovigilância em táxis

 

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

 

Como todos compreendemos, nesta proposta de lei há dois valores muito importantes em confronto, um dos quais diz respeito à segurança dos profissionais do táxi. Esta é uma questão muito relevante, porque todos temos conhecimento de vários tipos de criminalidade que afectam o dia-a-dia destes profissionais e, não raro, infelizmente, temos notícia de taxistas que são assassinados, aquando do cumprimento da sua profissão, para além de outros tipos de criminalidade menos grave mas que, obviamente, afectam o seu dia-a-dia e fazem com que seja um dever do Estado e do legislador procurar encontrar as melhores soluções para prevenir e evitar esse tipo de ocorrências. Portanto, este é um valor essencial, sendo certo que o recurso à videovigilância poderá ser um meio poderoso de dissuasão da criminalidade contra os taxistas.

O segundo valor que está em presença nesta proposta de lei tem a ver com a privacidade dos cidadãos. E, como bem salienta a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), no parecer com que nos habilitou, o cliente do serviço de táxi espera um grau de privacidade superior ao que existe na generalidade dos transportes públicos.

Assim sendo, a aplicação do princípio da proporcionalidade, que é essencial, tem de ser especialmente cuidada no caso da introdução do sistema de videovigilância nos táxis.

Quero dizer que, na ponderação entre estes dois valores, entendemos que, com as cautelas devidas e com o escrupuloso cumprimento do princípio da proporcionalidade, deve prevalecer o valor da segurança do profissional de táxi. Daí que a nossa posição de princípio seja favorável à possibilidade da introdução de sistemas de videovigilância nos táxis.

Agora, relativamente aos cuidados que é preciso ter, há alguns aspectos que gostaria de salientar, desde logo o da criação de um sistema que dê garantias de poder ser estritamente controlado pela CNPD, que é a entidade com competência para autorizar, controlar e fiscalizar a existência e utilização de sistemas desta natureza. Isto prende-se com outra questão, a que o Sr. Subsecretário de Estado já aludiu, que é a de saber quem é que procede à gravação. E, aqui, quer-nos parecer que a única solução aceitável é a de que a gravação seja centralizada, a de que não haja possibilidade de ser no próprio táxi que se procede à gravação das imagens, porque isto, obviamente, deitaria por terra qualquer possibilidade real de controlo efectivo sobre o que é gravado e sobre se os dados são ou não conservados, são ou não destruídos. Portanto, a única solução é a de que haja uma central que proceda à gravação e ao tratamento dos dados, quando tal for necessário.

Nesse sentido, a nossa opinião é a de que as dúvidas devem ser desfeitas. Ora, como se sabe que, numa versão inicial do diploma, chegou a estar expressamente prevista a proibição de gravação no próprio táxi, haveria vantagem em que essa disposição não desaparecesse, porque o facto de ela desaparecer pode ser gerador de equívocos.

Isso é, pois, algo que deveremos clarificar muito bem.

Depois, há outro problema fundamental, que é o do tratamento e destino dos dados e das condições da sua conservação. A nossa posição a este respeito é a de que, não havendo ocorrência justificativa da gravação, as imagens devem ser imediatamente destruídas.

É evidente que a posição do taxista deve ser salvaguardada e, a este propósito, creio que, há pouco, o Sr. Deputado Helder Amaral colocou uma questão pertinente. Se, por hipótese, o taxista sente que, perante um determinado cliente, pode vir a correr algum risco e acciona o sistema - porque, obviamente, tem de ser o taxista a accioná-lo, já que mais ninguém está em condições de saber se há ou não uma situação de risco iminente - e, depois, nada se verificar - e ainda bem, esperemos que seja esta a regra -, o dever de quem procedeu ao registo das imagens é o de apagá-las e, como é evidente, o dever do taxista será o de dizer, a quem tiver de comunicar, «apaguem estas imagens, porque, felizmente, nada aconteceu». Ora, creio que a infracção do taxista só poderá começar aí, ou seja, nós não podemos penalizar um taxista porque pensou que poderia acontecer algo de mal que, afinal, não aconteceu. Portanto, o dever do taxista é, nada tendo acontecido, comunicar imediatamente que os dados devem ser destruídos, porque aquelas imagens não têm razão de ser. Este é, pois, um aspecto que deve ser ajustado.

Relativamente ao destino dos dados, há o problema da sua conservação, mas creio que a questão é razoavelmente simples. Ou seja, há imagens que são registadas, dado o receio de que possa haver a ocorrência de algum ilícito criminal, mas se não aconteceu ilícito algum, se não há qualquer razão para que essas imagens continuem registadas, elas devem ser imediatamente apagadas. Se, pelo contrário, aconteceu alguma coisa, o facto deve ser, de imediato, comunicado às forças policiais. Daí que a dilação de oito dias até que a ocorrência possa ser comunicada, constante da proposta de lei, não tenha, do nosso ponto de vista, qualquer justificação. Quer dizer, se um taxista é assaltado isso deve ser comunicado, imediatamente, logo que possível, às forças policiais e não vemos qualquer situação em que um taxista seja vítima de um crime e fique, toda a semana, à espera de o comunicar às forças policiais.

Nesse sentido, quer-nos parecer que esses oito dias não fazem sentido, como também não faz sentido que, tendo sido transmitidas, às forças policiais, imagens comprovativas de uma ocorrência, essas imagens fiquem na posse das forças policiais até um ano. Isto é, se houve razão para a instauração de um processo criminal, esse processo deve ser instaurado e, a partir daí, essas imagens devem fazer parte do processo; enquanto forem necessárias para o processo, elas existirão e farão parte do processo, quando não forem necessárias, têm de ser eliminadas.

Portanto, quer-nos parecer que esta ideia de as imagens ficarem até um ano, em qualquer circunstância, na posse das forças policiais não faz sentido, porque aquilo que importa evitar, neste diploma, é que alguém possa ter, sequer, a veleidade de criar alguma base de dados dos clientes do serviço de táxi. Esta lei não é para isso e não pode permitir isso, razão pela qual a gravação e o tratamento de imagens devem ser reservados ao mínimo indispensável. Houve a prática de um crime, essa imagem é utilizada no processo criminal; não houve, essa imagem tem de ser apagada. Quer-nos parecer que esta é a única forma de fazer funcionar este sistema, respeitando os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

A CNPD coloca, depois, algumas outras questões, em sede de especialidade, que não vale a pena trazer a esta fase do debate mas que devem ser, de facto, devidamente ponderadas - aliás, como o Sr. Subsecretário de Estado já reconheceu.

Assim como a questão colocada, há pouco, pelo Sr. Deputado Luís Montenegro, tem, do nosso ponto de vista, razoabilidade, uma vez que o regime sancionatório deve ser adequado às violações previstas na Lei da Protecção de Dados Pessoais. A haver aqui violações serão relativas ao tratamento abusivo de dados pessoais, não, de maneira nenhuma, violações equiparáveis às normais infracções ao Código da Estrada.

Portanto, esse aspecto deve ser revisto.

A CNPD chama - e bem! - a atenção para o facto de haver aqui um regime sancionatório mais suave do que aquele que existe para a generalidade das infracções à Lei da Protecção de Dados Pessoais.

Este aspecto devia ser harmonizado, porque não faz sentido que infracções do mesmo tipo e com a mesma gravidade sejam tratadas com molduras sancionatórias diferentes. Portanto, este aspecto deveria, evidentemente, ser salvaguardado, em nome da unidade que é necessário haver no nosso sistema jurídico. Sintetizando, vamos acolher favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei em causa.

Reconhecemos a necessidade de encontrar um sistema que seja suficientemente dissuasor da criminalidade sobre os profissionais de táxi, mas este diploma deve ser tratado na especialidade com os devidos cuidados, sendo que, como é óbvio, nos dispomos a colaborar para esse efeito.

 

 

 

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