Projecto de Lei

Sistema de qualificação e formação contínua dos motoristas

 

Altera o sistema de qualificação e formação contínua dos motoristas, reforçando a protecção dos direitos dos trabalhadores

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Exposição de Motivos

Com o Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio, o Governo fixou o regime aplicável à qualificação inicial e à formação contínua dos condutores de determinados veículos rodoviários de mercadorias e de passageiros, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/59/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Julho, alterada pela Directiva n.º 2004/66/CE, do Conselho, de 26 de Abril, e pela Directiva n.º 2006/103/CE, do Conselho, de 20 de Novembro, relativamente à mesma matéria.

Num processo que, no seu início, arredou os trabalhadores e as suas organizações representativas da discussão desta matéria decisiva para o exercício da profissão e da actividade dos motoristas de mercadorias e de passageiros, o anterior Governo PS, aquando da discussão da Lei de autorização (Lei n.º 55/2008, de 4 de Setembro), avançou para a definição das bases deste regime sem ouvir e negociar com as organizações de trabalhadores do sector, situação para a qual o PCP alertou e denunciou no devido tempo.

Não obstante, a anterior maioria parlamentar do PS decidiu avançar sem a audição necessária e, após a discussão pública do Decreto-Lei que o PCP agora se propõe alterar, o anterior Governo PS, logo no Preâmbulo do referido diploma, apresenta o objectivo do diploma: «Em termos globais, este novo sistema de qualificação visa melhorar as condições de segurança numa dupla perspectiva, incidindo quer sobre a segurança rodoviária, quer sobre a segurança dos próprios motoristas.» Trata-se de um objectivo que certamente merecerá o apoio de todos.

No entanto, a concretização deste nobre objectivo é realizada, nos termos do citado decreto-lei, pela definição de um conjunto de regras e princípios que passam imediata e exclusivamente para os motoristas a responsabilidade total pelo cumprimento das novas exigências para o exercício da profissão.

Na opinião do PCP, há três princípios fundamentais que têm de ser assegurados pela legislação relativamente a esta matéria: (1) a responsabilidade das entidades patronais pela formação dos seus próprios trabalhadores, garantindo que esta se realize inserida no horário de trabalho do motorista e sem custos acrescidos para os mesmos; (2) a defesa dos postos de trabalho destes trabalhadores face às novas exigências de formação, prevendo mecanismos claros que co-responsabilizem a entidade patronal e o Estado pelo sucesso na formação; (3) a não transformação das novas exigências de formação em acrescidas formas de tributação indirecta destes trabalhadores, garantindo a emissão gratuita de toda a nova documentação exigida.

Estes três princípios fundamentais não estão salvaguardados no Decreto-Lei em causa. Estamos perante um diploma que suscita legítimas preocupações no seio dos trabalhadores, designadamente dos motoristas de veículos pesados de passageiros e mercadorias.".

Importa assim que a Assembleia da República proceda à alteração deste Decreto-Lei, permitindo assim a tomada de medidas que garantam a aplicação dos princípios já referidos. O objectivo fundamental desta iniciativa do PCP é assim o de garantir que o motorista não seja penalizado, no seu salário, nos seus direitos, no seu tempo de trabalho.

Com o presente Projecto de Lei, propomos designadamente:

  • A isenção de taxas e emolumentos na emissão dos documentos de certificação (certificado de aptidão para motorista e carta de qualificação de motorista), os quais, sendo condição obrigatória para a prática da profissão, não podem significar que o motorista tenha de pagar para trabalhar;

  • O pagamento, pela entidade patronal, das despesas relacionadas com a frequência da formação contínua pelo motorista;

  • A realização da formação contínua durante o período laboral do motorista, não aumentando assim a sua jornada semanal de trabalho, bem como a garantia de que as despesas com as deslocações são assumidas pelas entidades patronais e o tempo despendido com estas considerado como tempo de trabalho;

  • A salvaguarda do direito de opção, pelo motorista, sobre a entidade formadora onde este realize a formação contínua;

  • A criação de soluções de recurso que garantam alternativas ao motorista para o seu percurso formativo ou profissional, caso este não obtenha aproveitamento na formação contínua;

  • A eliminação, no sistema de qualificação e formação, da figura do "tutor", garantindo que a formação prática seja ministrada por formadores e instrutores com a devida certificação e competências para a actividade.

Sublinhamos que este projecto do PCP vem ao encontro das reivindicações expressas pelos motoristas, na sua luta em defesa dos direitos, de que se destaca actualmente a Petição promovida pelo STAL/Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e pela FECTRANS/Federação dos Sindicatos dos Transportes e Comunicações, bem como pelo STML/Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa. Através dessa iniciativa, os motoristas dirigem-se à Assembleia da República, requerendo que sejam tomadas medidas do ponto de vista legislativo em matérias como as que aqui são abordadas.

Assim, ao abrigo do disposto no Artigo 156.º da Constituição da República e do Artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º

Objecto

A presente lei reforça a protecção dos direitos dos motoristas, no âmbito do sistema de qualificação inicial e formação contínua dos motoristas de determinados veículos rodoviários afectos ao transporte de mercadorias e de passageiros, alterando o Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio.

Artigo 2.º

Aditamento ao Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio

São aditados ao Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio, os Artigos 5.º-A, 9.º-A, 9.º-B, 9.º-C, 9.º-D e 22.º-A, com a seguinte redacção:

«Artigo 5.º-A

Isenção de taxas e emolumentos

A carta de qualificação de motorista, a que se refere o n.º 1 do artigo 4.º, e o certificado de aptidão para motorista, a que se refere o n.º 2 do artigo 4.º, estão isentos de taxas e emolumentos, não implicando a sua emissão quaisquer custos para o trabalhador.

Artigo 9.º-A

Período de formação

1 - A formação contínua é realizada durante o horário de trabalho do motorista, não podendo resultar no aumento da sua jornada diária e semanal de trabalho.

2 - O crédito de horas para formação é referido ao período normal de trabalho, inclui o tempo despendido com as deslocações para o local onde é ministrada a formação, confere direito a retribuição e conta como tempo de serviço efectivo.

Artigo 9.º-B

Custos de frequência da formação

Os custos da frequência da formação contínua do motorista, incluindo as despesas com a deslocação para o local onde é ministrada a formação, são da responsabilidade da entidade patronal, não podendo esta fazer repercutir de nenhuma forma esses custos sobre o trabalhador, nomeadamente sobre a sua remuneração.

Artigo 9.º-C

Direito de opção sobre a entidade formadora

1 - Ao motorista assiste o direito de indicar a entidade formadora da sua opção, para a realização da formação contínua.

2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, o motorista comunica por escrito a sua opção à entidade patronal, no prazo de trinta dias antes da realização da formação.

Artigo 9.º-D

Repetição da formação e avaliação

1 - No caso de não obtenção de aproveitamento na formação contínua, o motorista pode realizar nova formação, até um limite de três.

2 - Após a terceira formação realizada sem aproveitamento, o motorista pode ser avaliado em exame, perante um júri tripartido, composto por um membro designado pelo IMTT, que preside, um membro designado por organização representativa dos trabalhadores e um membro designado por organização representativa das entidades patronais, tendo em conta o sector de actividade do motorista.

3 - No exame previsto no número anterior, a reprovação do motorista carece de decisão unânime do júri.

4 - Ao motorista que não obtenha aproveitamento nos processos de formação e avaliação previstos nos números anteriores assiste o direito de reconversão profissional, caso esta seja possível à entidade patronal.

Artigo 22.º-A

Equipa formativa

1 - A equipa formativa deve ser constituída por formadores e instrutores em número ajustado às cargas horárias de cada módulo de formação, à afinidade dos temas a leccionar e à duração total do curso, de forma a assegurar um clima pedagógico favorável e boa aprendizagem.

2 - Os formadores e os instrutores devem ser titulares de CAP de formador e demonstrar possuir as competências adequadas aos conteúdos formativos a ministrar.»

Artigo 3.º

Alteração do Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio

O número 2.4.1. do Anexo I do Decreto-Lei n.º 126/2009, de 27 de Maio, passa a ter a seguinte redacção:

«2.4.1 - Formação prática (FIC 21 h, FIA 14 h):

a) Objectivo n.º 1 (motoristas de veículos de passageiros) - aperfeiçoamento da condução racional baseada nas regras de segurança.

Conteúdo - condução individual em veículo pesado de passageiros (categorias D e D+E e subcategorias D1 e D1+E), acompanhada de formador do centro de formação, podendo o formando efectuar, no máximo, 8 (FIC) ou 4 horas (FIA) de condução individual num terreno especial ou num simulador de alta qualidade;

b) Objectivo n.º 2 (motoristas de veículos de mercadorias) - aperfeiçoamento da condução racional baseada nas regras de segurança.

Conteúdo - condução individual em veículo pesado de mercadorias (categorias C e C+E e subcategorias C1 e C1+E), acompanhada de formador do centro de formação, podendo o formando efectuar, no máximo, 8 (FIC) ou 4 horas (FIA) de condução individual num terreno especial ou num simulador de alta qualidade.»

Artigo 4.º

Norma revogatória

É revogado o artigo 4.º da Portaria n.º 1200/2009, de 8 de Outubro.

Assembleia da República, em 18 de Novembro de 2009

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