Permitam-me uma imagem que ilustra a situação em que o País se encontra.
Hoje é domingo, e nestas duas horas, enquanto aqui almoçamos, os cinco principais bancos encaixaram 900 mil euros de lucros, e no final deste domingo são perto de 11 milhões de lucros. É assim hoje, foi assim ontem e por vontade deles será assim todos os dias.
Isto não é uma cruzada contra a banca nem contra os lucros, é uma denúncia da injustiça e da desigualdade que se expressa na vida de todos os dias.
É uma denúncia e uma reafirmação de que não aceitamos que para a maioria haja sempre mês a mais para o salário e a pensão, que dois milhões de pessoas estejam na pobreza, que um em cada dez trabalhadores trabalhem todos os dias, ganhem salário e sejam pobres, um milhão de reformados e pensionistas recebam menos de 510 euros por mês. Ao mesmo tempo que os grupos económicos encaixam nos seus cofres mais de 32 milhões de euros de lucros por dia.
Basta de injustiça, este é o nosso combate, denúncia, luta, resistência e afirmação e construção do caminho alternativo.
Um combate em todas as frentes e também a um Orçamento do Estado que é mais uma peça ao serviço dos grupos económicos, submisso a Bruxelas e um ataque à nossa soberania.
Não abdicamos de lutar pelos interesses do nosso País. O País não pode continuar amarrado a interesses de outros. Os meios e os recursos do País têm de estar ao serviço do País e o País não são os grupos económicos, não são as multinacionais, não é a minoria, o País são os que põem a economia e a vida a funcionar.
O País são todos os que cá vivem e trabalham, são os que trabalharam uma vida inteira, são as milhares de crianças, são os que têm direito a uma vida melhor.
É este o caminho que se impõe, é este o caminho do qual não abdicamos. Não aceitamos a conversa de que não há dinheiro para tudo mas há sempre para os que são os grandes beneficiários da injustiça fiscal.
Ao contrário do que diz o Governo, os beneficiários desta política são os grupos económicos, não as micro, pequenas e médias empresas, são precisamente as grandes empresas, essas dos milhões e milhões de lucro à custa dos consumidores, dos trabalhadores, das famílias, dos reformados, das MPME.
É para as grandes empresas que se destina a redução do 1% do IRC, sob a falsidade de que temos as taxas mais elevadas.
Não só esta afirmação é falsa como na realidade a taxa efectiva que é paga de IRC é, em média, de 19% nos últimos 5 anos. E porquê?
Porque as grandes empresas são as mesmas que arrecadam uma enorme quantidade de benefícios fiscais. E como se fosse pouco, aí estão mais 1800 milhões de euros em benefícios fiscais no Orçamento do Estado que está em discussão, mais uns milhões que se destinam sobretudo a 0,1% das grandes empresas.
As mesmas que em grande medida vão encaixar ainda mais 1500 milhões de euros em parcerias público-privadas.
Para as pequenas empresas, mais de 90% de todo o tecido empresarial, nada.
Para as micro, pequenas e médias empresas, sobra o pagamento das comissões e serviços bancários, os seguros, as portagens, a energia, as telecomunicações. Ou seja, sobra tudo aquilo que faz aumentar os lucros aos grupos económicos e é isto que é preciso enfrentar.
Não desistimos do País e o País precisa de investimento público de facto e não de perspectivas e previsões orçamentais que não só são insuficientes como nunca são cumpridas. Em 2023 o investimento público foi de apenas 2,6% do PIB, um dos valores mais baixos da UE.
Para este ano em curso estão orçamentados 9,2 mil milhões de euros, mas até agora, o executado foi menos de metade deste valor, contribuindo assim para a asfixia nos serviços públicos, com consequências, em muitos casos, dramáticas. Toda esta situação insuportável e inaceitável que vivemos no sector da saúde, no SNS, no INEM, revela a justeza das nossas denúncias, a justeza das nossas propostas, e mostra que assim é que não podemos mesmo continuar.
Mas o que vemos é que é mesmo assim que o Governo quer continuar, orçamentando pouco, executando ainda menos, e beneficiando a minoria que lucra à conta das dificuldades e dos sacrifícios da maioria.
Faltam médicos, enfermeiros, técnicos do INEM, faltam professores, auxiliares, falta pessoal nas forças de segurança, faltam funcionários na justiça, faltam trabalhadores em tantos outros serviços públicos, faltam escolas, esquadras, hospitais, estradas, transportes, faltam casas que a generalidade das pessoas possa pagar, faltam lares, creches. E com tanto que falta, o grande contentamento do Governo é ter excedentes orçamentais, à custa das dificuldades e dos sacrifícios dos trabalhadores, dos jovens, dos reformados, das famílias, e para quê?
Para o Governo avançar com esta ou aquela medida pontual sem resolver os problemas de fundo, empurrando-os com a barriga, como assistimos com os apoios pontuais aos reformados.
O problema é que as contas de todos os dias não se pagam com este ou aquele apoio pontual que possa vir em meados do ano.
Mas o excedente é também para pagar uma dívida que se perpetua, e que só é possível pagar com mais investimento público, para conseguirmos produzir mais para passar a dever menos. Ou seja, fazendo precisamente o que não se tem feito.
Porque estas opções políticas do Governo são boas para o grande capital, mas são más para a maioria do nosso povo. São opções políticas tomadas pelo Governo de turno do PSD e do CDS, apoiadas por Chega e IL, que nem precisaram de aprovar o Orçamento, visto que o PS decidiu viabilizá-lo.
Estão todos comprometidos com o caminho em curso, podem ter garantido a estabilidade desta política, mas carregam às costas a instabilidade da vida da imensa maioria.
Este Orçamento, assim como este Governo e esta política, mereceu desde o primeiro momento a nossa oposição e aí está comprovada a justeza das nossas críticas. Um Orçamento que não resolve os problemas, porque estes são excelentes oportunidades de negócio para quem com eles lucra.
Por isso os trabalhadores, o povo, a juventude, os reformados, todos aqueles que para lá de toda a propaganda o que sentem no dia-a-dia são as condições de vida a piorarem, o que precisam é de um outro Orçamento, é de uma outra política.
Era só o que faltava estarmos destinados a viver nesta situação, não aceitamos que o País seja transformado num resort turístico nem numa grande escola de formação de quadros, técnicos e profissionais para exportar para outros países. Não só não nos conformamos, como damos combate a essa política.
Não nos conformamos e cá estamos para afirmar e construir a alternativa que se impõe. Há quem nos acuse de só falarmos em salários e condições de trabalho. Mas daqui deixamos as perguntas: como se resolvem os problemas com que estamos confrontados, como se elevam as condições de vida, como se fixam os trabalhadores que são necessários, como podem os jovens cá ficar, trabalhar e viver?
Como é que se responde às necessidades do SNS, como se fixam e contratam médicos, enfermeiros, técnicos auxiliares de saúde?
Como é que se reforça a capacidade de resposta do INEM e dos técnicos de emergência pré-hospitalar?
Como é que se respondem às necessidades da Escola Pública e se contratam professores e auxiliares em falta?
Como se aposta no desenvolvimento do País sem a valorização dos cientistas e investigadores?
Como se responde às necessidades de hoje e às que se avizinham nas forças de segurança e na justiça?
Dêem as voltas que quiserem, inventem as desculpas que entenderem, sem melhores salários, sem direitos, sem respeito por quem trabalha, sem carreiras e valorização das profissões, o País e a vida de cada um não anda para a frente.
Sim, sem nenhuma hesitação, exigimos o aumento dos salários e o aumento das pensões em 5%, num mínimo de 70 euros, uma exigência do PCP, dos trabalhadores e dos reformados.
Sim, não abdicamos de combater a especulação, de travar o aumento das rendas, de alargar a oferta pública de habitação e de pôr a banca a suportar os efeitos das taxas de juro. Uma exigência do PCP e de milhares e milhares de apertados com as rendas e prestações que não se aguentam.
Não abdicamos e não desistimos da rede pública de creches e de estruturas de apoio aos idosos.
Não desistimos, e o País precisa, da eliminação dos benefícios fiscais e da redução do IVA para 6% para a electricidade, gás e telecomunicações.
Não desistimos e não nos calamos perante o crime das privatizações e a corrupção.
Não nos param pela exigência da Paz. Sim, da Paz na Ucrânia e pelo caminho que se impõe que é a diminuição do armamento e não a corrida louca às armas que levará a humanidade à destruição. Não nos calam pelo fim do genocídio do povo Palestiniano às mãos de Israel com a hipócrita e cínica cumplicidade e apoio da UE e do Governo Português.
E para que também fique claro, por maior que seja a operação que está em curso e por maiores que sejam os meios contra a revolução de Abril, as suas conquistas e valores, aqui estamos todos os dias a exigir que esse Abril inacabado retome o seu caminho e se imponha na vida de todos os dias.
A campanha que temos vindo a dinamizar “Aumentar salários e pensões, para uma vida melhor”, profundamente ligada à vida das populações, contribui para que elas participem activamente na exigência das reivindicações mais prementes para a melhoria das suas condições de vida. E o que é facto é que esta nossa acção tem tido uma grande receptividade e adesão.
Esta acção tem uma importância que vai muito para além da assinatura que pedimos. É que ao pedir assinatura, estamos a falar, estamos a dar a conhecer, mas estamos também a envolver e a chamar à participação política todas estas pessoas.
É preciso que esta participação continue e se aprofunde, nomeadamente na luta que aí está, que nós muito valorizamos, que teve no passado dia 9 uma expressiva manifestação nas ruas de Lisboa e do Porto, e que precisa de se alargar cada vez mais e que volta à convergência no próximo dia 29 junto à Assembleia da República.
A situação é exigente e a ofensiva é grande, perante isto poderíamos ficar sossegados à espera de melhores dias. Mas essa não é a nossa forma de estar, de um partido comunista que quer transformar a realidade e que sabe que ela se transforma através da luta.
É mesmo caso para dizer que, também aqui, a melhor defesa é o ataque. Ataquemos pois de frente as dificuldades. Conhecendo o chão que pisamos, olhemos para o caso da Região onde nos encontramos.
Tantos e tantos trabalhadores no Complexo industrial de Sines, trabalhadores que daqui saudamos, trabalhadores que sentem na pele os efeitos da exploração e do contraste dos seus salários com os lucros imensos, como é o exemplo da Galp e os seus 900 milhões de euros de lucros só nos primeiros nove meses deste ano. Trabalhadores, muitos deles imigrantes, nomeadamente na agricultura e na construção civil. Precisamos de, como estamos a fazer, de chegar ainda mais até eles porque eles precisam que o seu Partido os organize. Continuemos e aumentemos com audácia as medidas para que tal aconteça.
E o Congresso que estamos a construir, o XXII Congresso do PCP, é um momento-chave para que cada organização, em cada região, discuta as medidas necessárias. Para termos mais militância, mais recrutamentos, mais responsabilização de quadros, mais e melhores condições de agir, de avançar e de lutar.
Um Congresso que não se esgota naqueles três dias, mas que será tão mais rico quanto mais o colectivo participar e se empenhar na discussão e no debate preparatório.
E um Congresso que será tão mais importante quanto o trabalho que conseguir projectar para os próximos anos.
As tarefas que nos estão colocadas são muitas e difíceis. Mas, citando Álvaro Cunhal, cujo aniversário assinalámos há dias, é profunda a nossa convicção de que é justa, empolgante e invencível a causa por que lutamos.
Por isso, por muitas e difíceis que sejam as tarefas, encaramo-las com alegria. Com a convicção, não menos profunda, de que uma outra realidade é possível. Para nós, para os nossos filhos, para os nossos netos.