A 12 de Dezembro assinalaram-se os 35 anos das primeiras eleições autárquicas, um momento inigualável, decorrente da conquista do Poder Local Democrático na Revolução de Abril e consagrado na Constituição da República Portuguesa. O Poder Local Democrático é expressão da vontade popular e constitui uma das mais progressistas e avançadas conquistas do povo português.
Assente nos princípios da autonomia administrativa e financeira, com um quadro de património e finanças próprias, plural e colegial, representativo dos interesses das populações, o Poder Local Democrático contribuiu decisivamente para o desenvolvimento local e para a melhoria das condições de vida das populações, através do investimento em infra-estruturas, em equipamentos educativos, culturais, desportivos e de índole ambiental e na diversidade das respostas às necessidades das populações.
No entanto, o Governo, a pretexto da redução da dívida, enceta um brutal ataque ao Poder Local Democrático, numa clara tentativa de responsabilização das autarquias pela situação em que se encontra o país. Não são apenas os aspectos economicistas que norteiam as propostas do Governo, estas visam objectivos mais profundos, de ataque ao Poder Local Democrático e de empobrecimento do próprio regime democrático. O que está em causa, é a liquidação da autonomia administrativa e financeira, a ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, a degradação dos serviços públicos, para os entregar a entidades privadas, ou seja, um ajuste de contas com o Poder Local tal como foi configurado pela Revolução de Abril.
O documento verde para a reforma da administração local, a concretizar-se, conduzirá a um recuo civilizacional na vida democrática local. A alteração do sistema eleitoral para as Câmaras Municipais, deixando de ser eleitas directamente pelas populações; a redução do número de vereadores; o esvaziamento de competências dos Municípios, concentrando-as nas comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas e a extinção das freguesias, levará à criação de um poder absoluto a nível local, ao aumento da opacidade, ao fim da pluralidade, da colegialidade e da representatividade dos órgãos executivos municipais, reduzirá o controlo democrático e afastará as populações do Poder Local, com reflexos mais gravosos nas zonas de interior, onde os serviços públicos foram progressivamente encerrados, contribuindo para a desertificação do interior do país.
O reforço do Poder Local Democrático passa pelo respeito dos princípios constitucionais, pelo aprofundamento do regime democrático, pelo fortalecimento da autonomia local, pela justa repartição dos recursos públicos entre a administração central e a administração local, dotando-as dos meios de intervenção adequados para o pleno cumprimento das suas competências e para dar resposta às populações.
A Assembleia da República saúda o 35º aniversário das primeiras eleições autárquicas, livres e democráticas, reconhece o contributo do Poder Local Democrático no desenvolvimento do país e na melhoria da qualidade de vida das populações e assumindo a sua defesa e reforço, rejeita todas as acções ou omissões que violem os seus princípios conformadores, consagrados na Constituição da República Portuguesa.