Exposição de motivos
Recentemente, esteve em consulta pública o Estudo de Impacte Ambiental do Projeto da Pedreira de Calcário e Marga Vale de Mós A (Novo Plano de Pedreira Vale de Mós A), desenvolvido pela Secil – Companhia Geral de Cal e Cimento, S.A.. A Secil pretende fundir as pedreiras de marga Vale de Mós A e Vale de Mós B, exploradas para produção de cimento, assim como ampliar a área de exploração e reduzir a profundidade da cota base de exploração.
A área objeto do Estudo de Impacte Ambiental para a ampliação das pedreiras da Secil, é parte integrante do Parque Natural da Arrábida. De acordo com o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (POPNA), a área em causa está classificada como área de proteção parcial tipo I, que “compreendem os espaços que contêm valores naturais e paisagísticos com significado e importância excecional ou relevante do ponto de vista da conservação da natureza, bem como elevada ou moderada sensibilidade ecológica” (n.º1 do artigo 14.º do POPNA) e que “constituem objectivos prioritários das áreas de proteção parcial do tipo I a preservação e a valorização dos valores de natureza biológica, geológica e paisagística relevantes para a garantia da conservação da natureza e da biodiversidade” (n.º2 do artigo 14.º do POPNA).
A pretensão da empresa não respeita o estabelecido nos instrumentos de gestão territorial em vigor relativamente à área em causa, destacando-se que a alínea c), do artigo 8.º do POPNA determina a interdição da “instalação de novas explorações de recursos geológicos, nomeadamente pedreiras, e a ampliação das existentes por aumento de área licenciada”. Desde modo, a pretensão de ampliação das pedreiras em causa constitui uma violação do POPNA. Tal como também não é compatível com o estabelecido no Programa da Orla Costeira Espichel-Odeceixe.
Os estudos realizados no âmbito do Plano de Gestão da ZEC Arrábida/Espichel, confirmam os valores naturais em presença, e que o POPNA já reconhecia por meio da classificação que atribuiu à área em apreciação. Na ZEC Arrábida/Espichel estão identificados 32 tipos de habitats alvo de proteção, assim como diversas espécies de fauna e flora também com estatuto de proteção, pelo que a ampliação pretendida da área de exploração de inertes vem ao arrepio das orientações de salvaguarda dos valores naturais que importa proteger.
De acordo com o Parecer da Câmara Municipal de Setúbal, no Plano Diretor Municipal (PDM) de Setúbal, a área proposta para ampliação está classificada como constituindo “Espaços Culturais e Naturais”, e na Revisão do PDM, está classificada como “Espaços Naturais e Paisagísticos”. O Regulamento do PDM em revisão prevê a aplicação dos artigos 103.º, 104.º e 105.º a essas áreas.
No que respeita ao Artigo 103.º, o Regulamento estabelece que “Os Espaços Naturais e Paisagísticos correspondem às áreas de maior valor natural, às zonas sujeitas a regimes de salvaguarda mais exigentes e às áreas de reconhecido interesse natural ou paisagístico, como o estuário do Rio Sado, cujo uso dominante não seja agrícola, florestal ou de exploração de recursos geológicos, constituindo sistemas indispensáveis à conservação e preservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem.”
Neste contexto fica claro que a proposta de ampliação das pedreiras não se configura com o disposto do Plano Diretor Municipal de Setúbal em revisão. Por outro lado, é também de destacar que a Câmara Municipal de Setúbal, no seu parecer sobre o Projeto avaliado, refere que “não são admissíveis alterações aos instrumentos de gestão territorial em vigor e em revisão, designadamente o POPNA e o PDM, que permitam enquadrar a pretensão do proponente”.
Atendendo ao exposto e cumprindo os instrumentos de gestão territorial em vigor e em revisão, o Governo deve opor-se à proposta da empresa e não permitir a ampliação da área de exploração das pedreiras da Secil.
Acrescenta-se igualmente que o POPNA coloca também como objetivo, na alínea g), do artigo 2.º, “promover as ações que potenciem o encerramento das pedreiras existentes, garantindo a sua recuperação ambiental e paisagística”, destacando-se que ao longo de todos estes anos, os sucessivos Governos não tomaram qualquer iniciativa neste sentido.
A verdade é que o POPNA foi permissivo com atividades muito agressivas e com grande impacto na natureza, como a intensificação da exploração de inertes em profundidade ou a coincineração de resíduos industriais perigosos, mas muito restritivo na manutenção das atividades tradicionais de pequena escala, seja na pesca, agricultura ou pastorícia, e que ao longo de séculos as populações que sempre residiram e desenvolveram atividades no parque foram responsáveis pela proteção e conservação da Arrábida.
Atualmente existem 11 pedreiras na Arrábida numa área total de 323 hectares, quando em 1976 as pedreiras ocupavam cerca de 150 hectares. E das 11 pedreiras existentes, somente duas estão em recuperação.
Com o objetivo de salvaguardar o extraordinário património ambiental e cultural do Parque Natural da Arrábida, deve ser desenvolvida uma estratégia para a Arrábida, que permita iniciar um processo, que salvaguardando todos os postos de trabalho, permita, progressivamente reduzir a atividade extrativa neste território.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República, nos termos n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomenda ao Governo que:
- Assegure o respeito e cumprimento do estabelecido nos instrumentos de gestão territorial em vigor e em revisão, com eficácia sobre a área das pedreiras da Secil, não emitindo parecer favorável à ampliação da área de exploração das atuais pedreiras da Secil no Parque Natural da Arrábida;
- Desenvolva as diligências necessárias para reduzir o volume de resíduos perigosos submetidos a coincineração, tendo em vista a cessação desta atividade no Parque Natural da Arrábida;
- Proceda à revisão do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida, envolvendo a participação das autarquias, das populações e associações e entidades dos concelhos de Palmela, Sesimbra e Setúbal, e que considere as soluções mais adequadas para assegurar a proteção da natureza e salvaguardar as atividades económicas tradicionais, que contribuem para o desenvolvimento e a preservação da Arrábida;
- Crie uma estratégia de desenvolvimento económico no Parque Natural da Arrábida, que promova a progressiva redução das atividades associadas à extração de inertes e assegure a recuperação integral das áreas a esta afetas, procedendo à sua renaturalização;
- Assegure que no âmbito da estratégia de desenvolvimento económico que venha a ser considerado para o Parque Natural da Arrábida, sejam salvaguardados todos os postos de trabalho atualmente existentes.