Projecto de Lei N.º 479/XII/3ª

Revogação das Taxas Moderadoras e definição de Critérios de Atribuição do Transporte de Doentes não Urgentes

Revogação das Taxas Moderadoras e definição de Critérios de Atribuição do Transporte de Doentes não Urgentes

O entendimento que o Governo PSD/CDS-PP fazem da saúde encontra expressão na sua política, opções que contrariam de modo inequívoco o disposto na Lei Fundamental e que fundadas em critérios meramente economicistas afetam o direito à saúde.

O governo, numa clara opção ideológica procura a todo o custo o esvaziamento das funções do Estado, em que a saúde assume particular relevância. Em causa está a característica da universalidade, tal como resulta da Constituição da República, que em momento nenhum poderá ser afastada e que hoje, está cada vez mais distante.

À universalidade acresce a qualidade dos serviços prestados, cujo reconhecimento é unanime e que resulta da criação e implementação do Serviço Nacional de Saúde que se assume como uma das muitas conquistas da Revolução de Abril e do processo de democratização iniciado com esta possibilitando um acesso democrático dos portugueses aos cuidados de saúde. Permitiu ainda que os indicadores de saúde do país atingissem resultados, em alguns indicadores, que se situam entre os melhores da Europa e à frente de muitos dos países mais desenvolvidos do mundo.

Encontramos nas taxas moderadoras um exemplo do que acabamos de referir. Nos termos da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, alterada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro, estão previstas medidas reguladoras do uso de serviços de saúde, designadamente as taxas moderadoras.

O novo regime de taxas moderadoras previsto no Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de Novembro, entrou em vigor a 1 de janeiro de 2012, assenta nos mesmos pressupostos.

A pretexto da moderação e da suposta garantia de sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS) o governo aprofunda o modelo das taxas moderadoras que na prática, consubstancia um obstáculo no acesso dos utentes aos cuidados de saúde, expresso nas sucessivas alterações ao seu regime, donde se destaca a instituição da revisão anual dos valores através da atualização anual automática do valor das taxas à taxa de inflação, que no presente se situou em 2,8% ou ainda o agravamento das penalizações respeitantes ao não pagamento da respetiva taxa moderadora, em que decorridos 10 dias da data de notificação, o valor a pagar aumenta para cinco vezes mais ao inicialmente estipulado, não sendo nunca inferior a 30 euros. Note-se que já em 2012 as taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde haviam sido alteradas e passaram a custar o dobro do valor cobrado em 2011.

Sendo cada vez mais evidente o retrocesso sentido nos últimos anos no que se refere ao acesso à saúde, Justifica-se a apresentação de nova iniciativa. Não sendo nova a questão, num contexto de aprofundamento dos problemas a realidade demonstra a atualidade de tal exigência.

Outro exemplo das crescentes dificuldades no acesso à saúde reside nos critérios de atribuição do transporte de doentes não urgentes, que embora conhecendo diversas alterações legislativas continuam a não dar a necessária resposta.

O processo teve início em finais de 2010, com o anterior Governo do Partido Socialista através do Despacho nº 19264/2010, de 29 de dezembro, que determinava que a atribuição de transporte de doentes não urgentes estava sujeita simultaneamente à justificação clínica e nos casos de insuficiência económica.

Os efeitos de tal despacho sentiram-se com particular incidência e gravidade nas regiões do interior, sobretudo no Alentejo, Trás-os-Montes e na Beira Interior.

Excluídos de acordo com o estabelecido nos critérios, a ausência de disponibilidade financeira para suportar os custos com as deslocações não lhes deu outra opção que não fosse abandonar os respetivos tratamentos.

Face à ampla contestação dos utentes e das corporações de bombeiros, a Assembleia da República aprovou uma resolução com os votos favoráveis do PCP, PEV, PSD, CDS e BE, com os votos contra do PS. Publicada em Diário da República, a Resolução da Assembleia da República nº88/2011, de 15 de abril de 2011, que recomenda a revogação do Despacho 19264/2010, de 29 de Dezembro e a revisão do atual quadro legal referente ao transporte de doentes não urgentes, garantindo a universalidade e a igualdade no acesso, atendendo a situações especiais de utentes que carecem de tratamentos prolongados ou continuados.

Entretanto o anterior Governo publicou o Despacho nº7861/2011, de 31 de maio de 2011, mantendo cumulativamente os critérios da justificação clínica e da insuficiência económica para atribuição do transporte de doentes não urgentes, e através deste afasta as recomendações da Assembleia da República, aprovadas por maioria. O mesmo critério viria a ser adotado pelo atual governo, contrariando assim o sentido de voto do PSD e CDS-PP aquando da aprovação da referida Resolução da Assembleia da República.

Em resposta à contestação dirigida a tal medida, o Governo PSD, CDS-PP publicou a Portaria nº142-B/2012, de 15 maio de 2012 e o Decreto-Lei nº128/2012, de 21 de junho de 2012. No entanto, o regulamento dos transportes de doentes não urgentes está longe de resolver a questão central, uma vez que opta pela manutenção cumulativa dos critérios da justificação clínica e da insuficiência económica, condição única para o acesso ao transporte.

Consideramos que esta medida, de natureza exclusivamente economicista resulta na prática na diminuição de qualidade e acessibilidade no Serviço Nacional de Saúde.

Pelo exposto, o PCP que sempre se opôs à criação destas taxas moderadoras e sempre assumiu o propósito de as eliminar, entende que neste momento de dificuldade para a generalidade dos portugueses, não só, é o momento indicado para revogar essas mesmas taxas, como é imperioso que o mesmo se faça sob pena de serem cada vez mais aqueles para quem a saúde está cada vez mais distante. É no respeito por aqueles que menos têm e mais precisam, que o PCP considera imperioso a revogação das taxas moderadoras.

Relativamente ao transporte de doentes não urgentes insistimos na necessidade da sua atribuição a todos os utentes do Serviço Nacional de Saúde que dele necessitem, garantindo que o mesmo se faça a título gratuito, bastando que dele careçam por motivos clínicos ou económicos, para consultas, exames ou tratamentos, independentemente do período de duração.

Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º

Revogação do Decreto-Lei n.º 113/2011 de 29 de Novembro

É revogado o decreto-Lei n.º 113/2011 de 29 de Novembro

Artigo 2º
Isenção de encargos com transporte não urgente
O transporte não urgente de utentes que seja instrumental à realização das prestações de saúde no âmbito do SNS é isento de encargos para o utente quando a situação clínica o justifique ou por carência económica, designadamente no caso de necessidade de tratamentos prolongados ou continuados.

Artigo 3º
Condições de isenção de encargos
1 — O SNS assegura na totalidade os encargos com o transporte não urgente prescrito aos utentes sempre que a situação clínica o justifique ou por carência económica.
2 — O SNS assegura, nos termos do presente artigo os encargos com o transporte não urgente dos doentes que necessitem impreterivelmente da prestação de cuidados de saúde de forma prolongada e continuada, e independentemente do número de deslocações mensais.
3 — As situações de prestação de cuidados de saúde de forma prolongada e continuada nos termos referidos nos números anteriores deverá ser objeto de prescrição única.

Artigo 4º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor, nos termos gerais, cinco dias após a sua publicação.

Assembleia da República, em 20 de dezembro de 2013

  • Saúde
  • Assembleia da República
  • Projectos de Lei