Projecto de Resolução

Reservas de ouro do Banco de Portugal

 

Sobre a gestão das reservas de ouro do Banco de Portugal

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Não tem o PCP nenhuma visão cristalizada sobre as reservas de ouro ou sobre a sua intocabilidade. As reservas de ouro devem estar ao serviço do país, da sua independência, do seu desenvolvimento, do bem-estar do povo. Ter imensas reservas de ouro e manter o país atrasado e a maioria do povo indigente, filosofia que esteve presente antes do 25 de Abril, não é caminho. Mas também não é opção uma gestão casuística ao sabor de interesses políticos do momento.

As reservas de ouro são suficientemente importantes para ficarem apenas dependentes dos critérios de gestão de quem conjunturalmente tem as responsabilidades do Banco de Portugal. Ainda nos lembramos do caso nunca totalmente explicado, das 17 toneladas de ouro entregues a uma «prestigiada» instituição financeira de Wall Street, do Sr. Michel Milken que, tal como a D. Branca, prometia rendimentos fabulosos e acabou na prisão. Era então Governador do Banco de Portugal, Tavares Moreira. Quais os custos judiciais que esta decisão acarretou e quais os prejuízos que provocou, foi uma história sempre mal contada que o Bloco Central de interesses, nas suas mútuas protecções e encobrimentos políticos e partidários, nunca clarificou.

Nos anos seguintes, o ouro foi sendo notícia quando as cotações subiam e se reflectia no valor acrescido do património do BdP, ou quando o Banco de Portugal o vendia, primeiro com confidencialidade, depois emitindo uns avisos sempre com a expressão ambígua de que tais vendas se faziam ao abrigo do «Acordo dos Bancos Centrais do Ouro» assinado em Setembro de 1999 e renovado em Março de 2004.

E dizemos expressão ambígua porque em resposta a vários requerimentos e perguntas feitas pelo Grupo Parlamentar do PCP, tal expressão também era invocada para permitir uma leitura de que o Banco de Portugal tinha acordado vender, quando tal acordo a nada o obrigava e apenas estabelecia limites máximos para uma venda eventual.

As vendas de ouro foram então justificadas com o argumento de que eram pouco rentáveis e que era melhor a sua diversificação com uma outra composição das reservas externas do Banco de Portugal. Quem expandia este argumento tinha uma concepção de que tínhamos chegado ao "fim da história" e de que não mais teríamos uma crise como a que estamos a viver. Nem sequer lhe serviu de lição as anteriores crises e as altas cotações que teve o ouro.

Entretanto, foi-se vendendo o ouro com cotações relativamente baixas e, nos momentos de crise, com cotações altas, não se vendeu ouro...

Em 14 de Janeiro de 2003, o Banco de Portugal informou que no final de 2002 procedeu à venda de 15 toneladas e textualmente argumentava que o «ouro é normalmente um activo com baixa rentabilidade financeira e Portugal é um dos países em que as reservas de ouro, no total de cerca de 600 toneladas, atingem uma percentagem muito elevada das reservas externas totais - cerca de 47%». E acrescentava que «há muito tempo que o ouro não desempenha uma função monetária como em épocas passadas e, para um país integrado numa União Monetária, aquela percentagem é excessiva e não permite optimizar no longo prazo a rentabilidade das reservas externas do País.».

A determinada altura, ao divulgar as suas contas, o Banco de Portugal (BdP), permitiu títulos na Imprensa como «reservas de ouro do Banco de Portugal valorizaram 655 milhões de euros em 2008», o que contribuía para o melhor resultado de sempre da instituição, e, no texto do documento de apresentação, contrariando a ladainha de que o ouro era pouco rentável, podia mesmo ler-se que «a cotação do ouro manteve a evolução positiva verificada nos últimos anos».

A pergunta que fica no ar é a seguinte: e quanto é que o Banco de Portugal e o país teriam ganho se as anteriores reservas vendidas a baixas cotações relativas fossem vendidas apenas nessa altura? Ou, de outra maneira: quanto é que o país perdeu com uma gestão casuística das reservas de ouro?

Dir-nos-ão que depois do sucedido é fácil acertar...

Lembramos, porém, que o PCP tem toda a autoridade para o afirmar pois foi o único Partido que na Assembleia da República, e fora dela, sempre contestou tais vendas tanto mais que era previsível a repetição de crises que se têm tornado mais frequentes e mais próximas.

A crise do sub-prime estalou em Agosto de 2007 e em 06.01.2008, podia ler-se no jornal Público: «a subida em flecha da cotação do ouro nos mercados internacionais está a colocar as reservas deste metal precioso ao nível mais elevado desde, pelo menos, o início do ano de 2000». De acordo com os dados oficiais mais recentes enviados pelo BdP ao Fundo Monetário Internacional, o valor do ouro detido era, no final de Novembro de 2007, de 9 762,3 milhões de dólares. Não se consegue, desde Abril de 2000, o primeiro mês para os quais está publicada informação, até agora encontrar um valor tão elevado para o ouro.

Portugal é considerado o 13.º do Mundo, com maiores reservas de ouro, que segundo os dados do World Gold Council, deverão estar, neste momento, em cerca de 382, 6 toneladas...

Os registos das vendas de ouro, mostra-nos que entre 2002 e 2008, o Banco de Portugal, tendo como Governador Victor Constâncio, procedeu às seguintes vendas:

Final de 2002 --------15 toneladas

Fevereiro de 2003 ---- 30 toneladas

Março e Abril de 2003 - 45 toneladas

Maio de 2004-------- 35 toneladas

Dezembro 2004 ------20 toneladas

Em Julho de 2005 o Banco de Portugal informava que já tinha vendido nesse ano 35 toneladas, sendo em Dezembro divulgado a venda de mais (10 toneladas).

Nos anos de crise que é que nos disse o Banco de Portugal?

No Relatório de 2007, podia ler-se: «a carteira de ouro tinha, no final de 2007, o valor de 7.000 milhões de euros (contra 5 937 milhões em 2006), correspondentes a cerca de 382,6 toneladas, tendo o aumento do valor resultado da significativa subida do preço do ouro em dólares nos mercados internacionais (+ 31,6%), que mais que compensou a depreciação do dólar face ao euro (- 10,5%). E, como sempre, conclui com este arrazoado: a gestão da carteira de negociação encontra-se subordinada a um benchmark estratégico, que tendo como objectivo a maximização da rendibilidade...». Fantástico «benchmark estratégico» que vende ouro na baixa e não o vende em alta!

No relatório agora publicado pode ler-se também: «a carteira de ouro tinha no final de 2008, o valor de 7 647 milhões de euros (7001 milhões de euros em 2007), correspondentes a cerca de 382,5 toneladas (382,6 em 2007), tendo o aumento do valor resultado quer da subida do preço em dólares do ouro nos mercados internacionais (+3,4%), quer da apreciação do ouro face ao euro (+5,8%).

Neste relatório já não se fala em «benchmark estratégico», nem nada se diz da redução de 100Kg de ouro nas reservas.

Mas pode concluir-se que em 2007 e 2008, não se vendeu ouro (a não ser, presumivelmente, os tais 100kg?), quando este metal atingiu a suas maiores cotações.

Quanto à diversificação e à sua rendibilidade não deixa de ser curioso verificar que o «valor da carteira de negociações em euros e moeda estrangeira, valorizada em sistema marked-to-marked, era de 10071 milhões de euros» em 2008, contra 10 825 milhões de euros no fim de 2007, ou seja menos 754 milhões...

O Relatório informa-nos ainda que 30% do valor do ouro a preço do mercado foi para provisão para riscos de flutuação da cotação deste metal.

Tendo em conta a evolução histórica das vendas de ouro e a sua gestão, e tendo em conta tudo o que antes se refere, o PCP entende que se devem fixar critérios gerais para a gestão das reservas de ouro.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, a Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que:

  1. As vendas das reservas de ouro do Banco de Portugal devem ser exclusivamente efectuadas nos períodos de alta de cotações ou em períodos de crise;
  1. O produto dessas vendas deve ficar consignado, uma parte à reposição das reservas de ouro quando as cotações estiverem baixas, e uma outra parte consignado à amortização (por intermédio do Estado) da dívida pública externa, em momentos de alta de juros.
  1. Seja criada uma comissão mista, com peritos do Banco de Portugal, do Ministério das Finanças e com representantes dos diversos partidos da Comissão de Orçamento e Finanças, para proceder à fixação mais específica dos princípios gerais para a gestão do ouro em cada legislatura.
  1. Que as decisões de venda, e sua justificação, deverão ser sempre dadas a conhecer à Comissão de Orçamento e Finanças da Assembleia da República.

Assembleia da República, em 16 de Julho de 2009

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