Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Relatórios do Provedor de Justiça referentes aos anos 2011 e 2012

Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
A discussão destes dois Relatórios do Provedor de Justiça, dos anos de 2011 e 2012, acaba por ser, um pouco, o reflexo daquela que é a situação do País. Aliás, não será exagerado dizer que nunca, nos últimos 36 anos, foi tão necessário um Provedor de Justiça, para defender os cidadãos dos poderes públicos, nomeadamente da atuação do Governo.
Nunca, nos últimos 36 anos, os direitos fundamentais dos cidadãos estiveram tão desprotegidos como hoje e, por isso, também ressalta, da leitura destes Relatórios, a importância e o relevo da intervenção do Provedor de Justiça, nos dias que vivemos, de uma gravíssima crise social, de uma gravíssima crise económica, mas também de uma crise política que tem como uma das suas dimensões o desrespeito, o ataque e a ofensiva desenvolvidos pelo Governo contra direitos fundamentais dos cidadãos, ainda reconhecidos na Constituição e na lei.
Estes Relatórios, Sr.as e Srs. Deputados, confirmam a necessidade do Provedor de Justiça e são também o reflexo desta governação antipopular.
De 2011 para 2012, como, de resto, o Sr. Deputado João Lobo já referiu, o número de queixas aumentou exponencialmente. Há um aumento de 7700 para 27 218 queixas apresentadas na Provedoria de Justiça, visando, em concreto, obviamente, os eixos fundamentais da ofensiva desenvolvida pelo Governo contra o povo, contra os trabalhadores, contra os reformados, contra os jovens, contra, no fim de contas, os direitos fundamentais de todo o povo português.
No topo dos assuntos mais visados nas queixas apresentadas pelos cidadãos ao Provedor de Justiça, encontramos, obviamente, as questões sociais, mas também as questões laborais, as questões fiscais e as questões relacionadas com a administração da justiça e a segurança interna.
No Relatório de 2012, Sr.as e Srs. Deputados, encontramos o relato de milhares de queixas sobre os roubos efetuados pelo Governo, em matéria de subsídios de férias e de Natal, particularmente no Orçamento do Estado, a que, necessariamente, a Provedoria teve de dar resposta.
Mas encontramos, ainda, no domínio das matérias sociais, referências, por exemplo, a questões relacionadas com abono de família, com pensões, com aposentação e direito à reforma, com desemprego, com dívidas e contribuições que esmagam aqueles que foram duramente atingidos nas suas condições de vida e se veem, muitas vezes, impossibilitados de cumprir as suas obrigações.
No âmbito das questões laborais, Sr.as e Srs. Deputados, encontramos queixas que têm a ver com limitações impostas em matérias relacionadas, por exemplo, com as carreiras e a progressão profissional, que também estão, necessariamente, ligadas à ofensiva do Governo dirigida contra os trabalhadores da Administração Pública e contra o seu direito à progressão e à defesa da dignidade das suas carreiras.
Encontramos, ainda, queixas relacionadas com o recrutamento e, obviamente, Sr.as e Srs. Deputados, com a mobilidade, essa «gazua» com que o Governo, na altura, de José Sócrates, procurou arrombar a estabilidade, a defesa e a segurança do emprego público e que, hoje, o PSD, o CDS e o Governo utilizam, de facto, para liquidar o direito à estabilidade e à segurança nas carreiras profissionais.
Em matéria de direitos dos contribuintes e dos agentes económicos, Sr.as e Srs. Deputados, encontramos um sem fim de queixas, que dão, de facto, ao Sr. Provedor de Justiça uma importância redobrada, por exemplo, em matérias que têm a ver com as execuções fiscais. E leio apenas uma passagem do Relatório de 2012, que é de significativa importância, quando refere, e cito, que «(…) não é a gravidade da questão de fundo que mais choca, mas antes as enormes dificuldades que os cidadãos revelam sentir em conhecer, acompanhar e resolver, de forma célere, esclarecida e informada, os problemas com que se deparam em matéria de execuções fiscais (…)». Isto, Sr.as e Srs. Deputados, dá-nos o retrato de um Estado que esmaga os direitos dos cidadãos e que, em particular, em matéria de execuções fiscais, dispõe, hoje, de todos os instrumentos para se impor e para impor aos cidadãos uma situação relativamente à qual os cidadãos se veem praticamente desprovidos de instrumentos de defesa dos seus direitos e dos seus interesses.
Mas, neste domínio, surgem também queixas relacionadas com a atuação da banca e das seguradoras e com serviços básicos às populações, na área da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações.
Sr.as e Srs. Deputados, em matéria de justiça e de administração interna, encontramos alguns dados relevantes, dos quais se destacam, necessariamente, um aumento de 160% das queixas relacionadas com a atuação dos serviços e forças de segurança, que, apesar de não terem, em termos absolutos, um número muito significativo ou importante neste Relatório, ainda assim, devem motivar a esta Assembleia da República uma particular preocupação com aquilo que tem a ver com o respeito e a defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente perante possíveis tentativas de instrumentalização, por parte do Governo, que pode querer encontrar nas forças e serviços de segurança uma forma de corresponder àquilo que é a contestação política e social de que vai sendo alvo.
Para terminar, Sr.as e Srs. Deputados, e deixando, necessariamente, de parte uma análise mais aprofundada sobre outros direitos fundamentais dos cidadãos, na área da educação, do serviço prisional ou, até, na área da saúde, onde há um número muito significativo de queixas relacionadas com as taxas moderadoras, temos de dizer que a intervenção do Sr. Provedor de Justiça, de facto, acompanhou as exigências que foram colocadas e, com uma leitura dos seus poderes legais e nunca ultrapassando o enquadramento legal e constitucional desses poderes, o Sr. Provedor de Justiça atuou com autonomia e independência em relação ao Governo, de que, de resto, é exemplo, a posição que assumiu em matéria de fiscalização da constitucionalidade.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados:
Para terminar, uma última referência tem a ver com o cumprimento das recomendações do Provedor e o muito caminho que há ainda a fazer nesta matéria. Importa, de facto, que, em matéria de cumprimento das recomendações do Sr. Provedor de Justiça, todas as entidades públicas, com o Governo e a Administração Pública à cabeça, assumam a necessidade de cumprir, atempada e cabalmente, as recomendações do Sr. Provedor de Justiça.
Por isso, também aqui fica a posição e o contributo do PCP em relação à necessidade de acompanhar mais de perto e exigir, a toda a Administração Pública e, em particular, ao Governo, o cumprimento dessas recomendações e, afinal de contas, o respeito por aquela que é a intervenção do Provedor de Justiça em defesa dos cidadãos e de um dos mais importantes pilares do regime democrático, que é o dos direitos fundamentais.

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