Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Relatório anual do Provedor de Justiça relativo a 2013

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Queremos, em primeiro lugar, saudar o atual titular do cargo de Provedor de Justiça, o Sr. Prof. Dr. José de Faria Costa, sendo devida também uma saudação ao anterior Provedor de Justiça, Conselheiro Alfredo José de Sousa, na medida em que uma parte da matéria deste relatório ainda abrange algum período de tempo em que o cargo foi ocupado pelo Conselheiro Alfredo José de Sousa.
Portanto, quero salientar a contribuição que ambos os Provedores, o atual e o seu antecessor, deram para a dignificação do cargo de Provedor de Justiça, ajudando a superar uma fase, eu diria a pior fase da existência do Provedor de Justiça, que foi a do impasse gerado pelo PS e pelo PSD quanto à nomeação do sucessor do Provedor Henrique Nascimento Rodrigues, criando uma situação inaceitável de vacatura do cargo, conhecidas já, na altura, as enormes dificuldades, por razões de saúde, que o Dr. Nascimento Rodrigues evidenciava. Portanto, houve, da parte destes partidos, uma enorme irresponsabilidade na forma como trataram a eleição do Provedor de Justiça nessa altura.
Felizmente, essa situação foi ultrapassada e o Provedor voltou a assumir, na sua plenitude, a importância deste órgão de tutela dos direitos dos cidadãos na democracia portuguesa.
Trata-se, de facto, de um órgão importante em democracia, por diversas razões, desde logo pela razão fundamental de ser um órgão independente, criado precisamente para defesa dos direitos dos cidadãos. A tutela direta que o Provedor pode exercer junto da Administração Pública, junto de qualquer entidade relativamente à qual tenha poderes de intervenção, em defesa de direitos concretos dos cidadãos que a ele recorrem é extremamente importante, assim como é importante que, concretamente, a Assembleia da República — e também os órgãos de soberania — possa, através dos relatórios anuais e de recomendações que o Provedor entenda dirigir ao Parlamento, obter um diagnóstico dos principais problemas. A saber, quer os que são sentidos pelos cidadãos e que os levam a tomar a iniciativa de apresentar queixas ao Provedor de Justiça quer através dos resultados concretos da sua ação, ou seja, da relação que se estabelece entre a Administração Pública e os cidadãos e entre a Administração Pública e o próprio Provedor, na satisfação que é dada às recomendações feitas, às sugestões que o Provedor apresenta e à solução concreta dos problemas suscitados pelos cidadãos.
Queríamos salientar alguns aspetos.
Em primeiro lugar, e agora que se apresenta para breve a discussão do Orçamento do Estado para 2015, penso que é preciso acabar com a situação de asfixia financeira que tem vindo a afetar ultimamente a Provedoria de Justiça. Esta instituição é demasiado importante para que se crie uma situação que inviabilize o seu adequado funcionamento por razões de carência financeira.
Portanto, é necessário que o Orçamento do Estado para 2015 tenha isso devidamente em atenção e venha dotar a Provedoria de Justiça, obviamente tendo em conta a situação do País — o Provedor de Justiça não é uma ilha no contexto nacional —, das condições adequadas para funcionar com dignidade em defesa dos direitos dos cidadãos.
Importa salientar, também, que resulta deste relatório um acréscimo de queixas dos cidadãos e das razões de queixa dos cidadãos. E não é por acaso que se verifica um aumento de 21,2% das queixas feitas ao Provedor e que há um aumento mais significativo ainda das queixas relativas aos direitos sociais, à não consagração e não satisfação de direitos sociais dos cidadãos.
O Ministério relativamente ao qual existe o mais elevado número de queixas é precisamente o da Solidariedade, Emprego e Segurança Social. A queixa por falta de prestações sociais está entre a maioria das queixas apresentadas pelos cidadãos.
Há um aumento de 25% das queixas relativas a direitos sociais, mais do dobro das verificadas em 2010. Portanto, o número de queixas apresentadas em 2013 relativamente às prestações sociais é mais do dobro do número de queixas apresentadas em 2010, ou seja, três anos antes, o que é significativo. As queixas relativas à lesão de direitos dos trabalhadores aumentaram 27,3%.
Ora, isto é muito significativo da marca negativa da política deste Governo. Inclusivamente, questões como a do subsídio de educação especial, que é negado pelo Governo, apesar de recomendações nesse sentido do Provedor de Justiça, são, de facto, uma marca profundamente negativa daquilo que tem sido a política antissocial deste Governo nos últimos anos e isso vem refletido de uma forma elucidativa no Relatório do Provedor de Justiça, que deve ser devidamente avaliado por esta Assembleia.
Para que haja uma melhor satisfação dos direitos dos cidadãos, para que os cidadãos não tenham de recorrer tanto ao Provedor de Justiça e não tenham tantas razões de queixa depende fundamentalmente das políticas governativas que sejam adotadas, pelo que, nesse aspeto, a política antissocial não pode deixar de se refletir no conteúdo do Relatório Anual do Provedor de Justiça.

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