Apreciação Parlamentar

Regime jurídico de protecção social na parentalidade

 

Decreto-Lei n.º91 /2009, de 9 de Abril que «Estabelece o regime jurídico de protecção social na parentalidade no âmbito do sistema previdencial e no subsistema de solidariedade e revoga o Decreto-Lei n.º 154/88, de 29 de Abril, e o Decreto-Lei n.º 105/2008, de 25 de Junho»
Publicado em Diário da República, I série, n.º 70, de 09-04-2009

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A Constituição da República Portuguesa consagra especificamente os direitos de maternidade e de paternidade conferindo-lhes um valor social eminente e uma acção insubstituível, em relação aos filhos. Para isso, as mães e pais têm direito à protecção da sociedade e do Estado e a lei deve, relativamente às mães e pais trabalhadores garantir a efectivação de direitos que tenham em vista o superior interesse da criança, nomeadamente as licenças por maternidade e paternidade e o direito a dispensa do trabalho, sem perda de retribuição, direitos ou regalias.

O conceito de «parentalidade», presente na Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho e agora regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de Abril, que entrou em vigor no dia 1 de Maio, levanta, desde logo, sérias dúvidas quanto ao conteúdo e quanto aos objectivos, porque não representa uma melhoria em relação aos direitos existentes, nem aprofunda o seu significado social.

Com esta nova formulação corre-se o risco de serem reduzidos direitos fundamentais (maternidade e paternidade) a um vínculo de relação que, em matéria jurídica, não tem o mesmo valor social nem o mesmo conteúdo político-constitucional como têm os conceitos de maternidade e paternidade.

Não é a parentalidade (no sentido de relação parental) a causa da maternidade e da paternidade, mas o inverso. A parentalidade existe como uma consequência de um vínculo genético primário que é a maternidade e paternidade, ou por via da adopção. As alterações introduzidas por este diploma não só não respeitam esta realidade como afrontam valores socialmente reconhecidos, adulterando o seu sentido, e desrespeitando o papel que estes desempenham na coesão social, na coesão das famílias e nas relações de trabalho.

Se hoje, face à legislação existente, os direitos de maternidade e de paternidade são postos em causa nas empresas e nos serviços, com estas alterações a situação tenderá a agravar-se, porque vêm contribuir para aumentar os atropelos à efectivação destes direitos e não favorecem uma maior partilha e divisão de responsabilidades no trabalho e na família.

 

Assim, o governo PS, desperdiçando uma oportunidade para avançar na protecção efectiva da maternidade e paternidade, seguindo, inclusive as recomendações da Organização Mundial de Saúde que apontam para um período de 180 dias como mínimo indispensável para a licença por maternidade, acompanhando os estudos europeus, nomeadamente da Comissão Europeia, que indicam que a licença é gozada por mais tempo consoante for maior a respectiva remuneração, opta por manter a situação para as mães trabalhadoras nos mesmos termos preconizados pelo PSD/CDS e o seu Código do Trabalho.

Assim, e apesar da propaganda massiva, o novo decreto acaba por trazer poucas novidades, sendo que uma delas é a possibilidade do aumento da licença parental. A licença por maternidade, gozada em exclusivo pela mãe continua a ser paga apenas a 100% em caso de 120 dias e a 80% em caso de 150 dias. Acresce uma licença exclusiva do pai que terá que ser gozada em 30 dias seguidos ou interpolados em 2 intervalos de 15 dias, só assim sendo pago o acréscimo da licença a 100% em 150 dias e 83% em 180, sempre referentes à remuneração de referência e nunca em relação ao salário líquido.

Ora, o PS não concede, por exemplo, o gozo conjunto da licença pelo período adicional, circunstância que protegeria muito melhor os interesses da criança nos seus primeiros meses de vida e que prejudica os casais em que o pai esteja desempregado (não podendo beneficiar do acréscimo) e os casos de monoparentalidade, beneficiando apenas as famílias que possam abdicar de parte do seu rendimento para gozar da licença alargada.

Acresce que, num momento em que os gastos familiares aumentam significativamente, quer pelas necessidades de um recém-nascido, quer tendo em conta o aumento do custo de vida, o PS teima em não garantir o pagamento da licença sempre a 100% da remuneração efectiva de mães e pais trabalhadores, situação agravada pelo facto de se determinar como mínimo um valor substancialmente inferior ao salário mínimo nacional, permitindo que as famílias vivam valores mesmo inferiores ao limiar mínimo da pobreza (80% do IAS que equivale €335,38, em 2009), insistindo na não indexação de rendimentos substitutivos do trabalho à retribuição mínima mensal garantida.

O PS continua ainda a garantir o pagamento do subsídio por riscos específicos e o subsídio para assistência a filho com deficiência crónica apenas a 65%, garantindo o pagamento da licença parental alargada (que já existia) apenas a 25%, não garante o pagamento das faltas para assistência a filhos e mantém os critérios dos subsídios sociais, nomeadamente quanto à condição de recursos, afastando centenas de mães e pais trabalhadores que não atingem os prazos de garantia por força da existência de vínculos precários e da degradação das condições de trabalho e da segurança no emprego, fruto das políticas de direita do Governo PS.

Os dados oficiais da Segurança Social apontam para um reduzido gozo da licença pelos pais: as entidades patronais penalizam os homens que gozam a licença de paternidade, mas também as mulheres. Uma grande parte das mulheres não chega a gozar a totalidade da licença por maternidade e quando regressa ao trabalho também não exerce os demais direitos de maternidade (particularmente as dispensas para consultas, amamentação e aleitação).

Importa lembrar que muitas mulheres trabalhadoras sofrem pressões e assédio moral no local de trabalho por força da gravidez e do exercício dos direitos de amamentação e aleitação, muitas vêem os seus contratos a termo não serem renovados quando a entidade patronal descobre que estão grávidas e muitas não são sequer contratadas caso manifestem a vontade de engravidar sem que se efectivem medidas preventivas e eficazes no combate a esta realidade por parte do Governo.

Estas alterações não podem ser desligadas das medidas aprovadas pelo PS aquando da revisão do Código do Trabalho nomeadamente a desregulamentação do horário do trabalho, abrindo caminho a que se trabalhem 12 horas por dia e 60 por semana, não tendo em conta que os filhos precisam dos pais muito mais para além dos primeiros meses de vida.

O aumento e a desregulamentação dos horários de trabalho, com as consequências negativas para a saúde dos trabalhadores, cria sérios obstáculos à articulação da vida profissional com a vida familiar, agravada pela inexistência de uma rede pública de equipamentos sociais de apoio à infância, de qualidade e a preços acessíveis, criando sérios obstáculos às mães e pais trabalhadores na educação e acompanhamento dos seus filhos.

A precariedade, os baixos salários, o aumento do custo de vida e a acentuada desvalorização das prestações sociais e, mais concretamente, do abono de família, a inexistência de uma rede pública de apoio à infância abrangente e eficaz e o desrespeito contínuo dos direitos laborais consagrados nestas matérias por parte das entidades patronais são factores de desincentivo à maternidade e paternidade, problemas que o Governo não só não resolve, como agrava.

Nestes termos, ao abrigo do artigo 169.º da Constituição e do artigo 189º e seguintes do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP requerem a Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei n.º91 /2009, de 9 de Abril que «Estabelece o regime jurídico de protecção social na parentalidade no âmbito do sistema previdencial e no subsistema de solidariedade e revoga o Decreto-Lei n.º 154/88, de 29 de Abril, e o Decreto-Lei n.º 105/2008, de 25 de Junho»

Assembleia da República, em 7 de Maio de 2009

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