Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas,
Face à repetição da tragédia dos incêndios florestais, este Governo faz, no essencial, o que fizeram outros antes dele. Sem qualquer criatividade e sem qualquer resultado, muda as leis e altera a estrutura de combate aos incêndios florestais.
Decidiu, por exemplo, o Governo revogar o Decreto-Lei n.º 156/2004, porque — diz-se no preâmbulo do decreto-lei que o vai substituir — «A experiência de copiosa importância decorrente da aplicação do diploma em duas épocas de incêndios permitiu (…)». Permitiu o quê, Sr. Ministro? Que experiência, se não houve qualquer aplicação deste Decreto-Lei? Se os senhores não o aplicaram, qual é a experiência da não aplicação?
Por que razão não se interroga o Governo, de uma forma séria, sobre as razões da não concretização de resoluções desta Assembleia da República, de resoluções do Conselho de Ministros, de decretos-leis, de portarias e de despachos? Porque razão, Sr. Ministro, a Lei de Bases da Política Florestal, aprovada em 1996, continua, em 2006, sem concretização? Que razões explicam que sucessivos governos não o tenham feito?
Quem é que «deixou andar», Sr. Ministro? Foram os agricultores, os proprietários florestais e as suas associações ou foram os governos e a política de direita prosseguida nos últimos anos, tanto nesta matéria como noutras?
Não serão questões de ordem orçamental, Sr. Ministro? Não será a tentativa de, mais uma vez, querer resolver o problema sem um investimento público forte e significativo?
O Dr. Oliveira Salazar, em meados dos anos 50, resolveu acabar com o «pé descalço», com a «pata ao léu» — dava mau aspecto — e resolveu pôr a polícia a aplicar multas. É uma evidência, Sr. Ministro, que os portugueses só passaram a andar calçados, pelo menos de tamancos e socas, quando passaram a ter dinheiro para isso!
O que os governos continuam a querer fazer é a resolver este problema sem investimento. E, pela terceira vez — fi-lo durante o debate do Orçamento do Estado e na Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional —, questiono-o: qual o valor das verbas orçamentadas no Orçamento do Estado para 2006 que vão permitir implementar algumas das medidas, alguns dos instrumentos que os senhores propõem no decreto-lei que vem associado ao pedido de autorização legislativa?
É que sem compromisso orçamental certo, Sr. Ministro, o pouco e o mau que o Governo se propõe fazer reduz-se a zero.
Aliás, falando de compromissos do Governo, aproveitava para lhe perguntar, Sr. Ministro, se confirma a informação de que os compromissos do Governo, assinados em 2005, no quadro das medidas agroambientais — protecção integrada, agricultura biológica, raças autóctones —, não vão ser cumpridos relativamente aos projectos que assinou com os agricultores em 2005.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro
da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: Não é verdade que todos os partidos sejam
culpados nesta matéria.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (OS Verdes): — Muito bem!
O Orador: — Basta uma leitura séria do Diário da Assembleia da República, ao longo destes 30 anos,
para o verificar. Sr. Ministro, se quiser fazer o favor, poderá verificá-lo com facilidade.
Vozes do PCP : — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, para o Governo do PS a solução para os
incêndios florestais é muito simples: a responsabilidade é dos proprietários florestais, fundamentalmente
dos pequenos, e também das autarquias, que não fazem a gestão activa das suas áreas florestais. Logo,
tudo se vai resolver agravando-se significativamente o valor das coimas, em 40%, e, aparentemente,
melhorando o policiamento, entregando-o à GNR, que será reforçada com 400 guardas florestais, dos
quais, simultaneamente, se decretou a extinção.
Sr. Ministro, é uma verdadeira fraude política, uma solução mistificadora aquilo com que o Governo
avança para responder aos gravíssimos problemas dos incêndios florestais. O Governo parte, e fá-lo conscientemente,
de premissas e de teses falsas.
A gestão activa não é uma questão de boa ou de má vontade dos proprietários florestais, é a questão
comezinha da racionalidade económica dos diversos tipos de proprietários, é a questão da rentabilidade
económica da floresta e, em particular, do preço do seu principal produto, a madeira! Ora, disto nem este
nem os anteriores governos quiseram ou querem ouvir falar!
O preço da madeira está estagnado há 10 anos, em virtude da concertação monopolista das celuloses,
e desde Outubro que está a descer, tendo em três meses caído entre 5% e 12%.
São premissas, teses e passa-culpas demagógicas! Se a responsabilidade é do proprietário e também
das autarquias ficam absolvidas e desresponsabilizadas as políticas agro-florestais, e não só florestais, de
sucessivos governos responsáveis pelo estado a que chegaram a floresta e a agricultura portuguesas!
São premissas e teses convenientes, porque o Governo não precisa de gastar muito! É uma tese que se
ajusta à política orçamental do Governo de obsessão pelo défice e pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento,
porque não faz investimentos e reduz ao mínimo a Administração Pública, o que é visível no processo
de liquidação da Direcção-Geral dos Recursos Florestais!
São premissas e teses que ignoram a realidade florestal e, em particular, a diversidade das suas lógicas
económicas e sociais, que não têm suporte técnico-científico e que têm a oposição generalizada das associações
do sector!
O Governo diz que as ouviu, não refere é o que elas dizem sobre as suas propostas, mas basta ler o
parecer do Instituto Superior de Agronomia.
São premissas e teses que, inevitavelmente, não conduzem a uma verdadeira estratégia de combate
aos incêndios florestais! As propostas são medidas avulsas, desarticuladas e inconvenientes – também
aqui vale a pena ler o parecer do Instituto Superior de Agronomia.
Nos textos do diploma em análise há premissas e teses que, inevitavelmente, conduzem a legislação
que viola e ofende a autonomia do poder local, tentando repor inaceitáveis comandos e subsídios (imaginese,
subsídios! às autarquias, contando, por isso, com a frontal oposição da Associação Nacional de Municípios
Portugueses.
Por exemplo, é espantoso que a administração central não tenha prazos para aplicar os seus planos de
defesa da floresta e que aos municípios se imponha um prazo de 90 dias!
O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Mas, Sr. Ministro, o pior de tudo, a crítica fundamental que fazemos às propostas do
Governo é a de que, infelizmente, os incêndios vão continuar inapelavelmente a percorrer as florestas portuguesas!
Não deixaremos de denunciar e de apontar os culpados, neste momento o Governo do Partido
Socialista, do Eng.º Sócrates!
Aplausos do PCP.