Senhor Presidente,Senhores Deputados:
Senhor Presidente,
Senhores Deputados:
Ser trabalhador-estudante é cada vez mais no nosso País um acto
de vontade e de coragem.
Os que o são, contrariando a lógica de um sistema que facilmente
empurra para fora da escola e de uma sociedade que penaliza as famílias
e obriga os jovens muito cedo
procurarem emprego para aliviarem as faltas lá de casa. Ser
trabalhador-estudante é atrever-se a fazer valer os seus direitos num
mundo laboral cada vez mais desregulamentado e instável. É conquistar a
palmo o direito a avançar na sua formação quando lhe devia ter sido
dada de bandeja.
Só pelo simples facto de se trabalhar e estudar ao mesmo tempo
se justificaria uma protecção especial. Mais ainda quando muitas outras
dificuldades se levantam e entravam a luta do trabalhador pela sua
formação escolar e pessoal e pela sua valorização profissional.
O Estatuto do Trabalhador-Estudante leva já quase 16 anos de
vigência. Durante este tempo
muito se alterou. Desde logo, a crescente precarização do emprego que
hoje atinge a maioria dos jovens e que lhes limita a aplicação do
Estatuto.
O Estatuto do Trabalhador-Estudante, passados todos estes anos
necessita obviamente de alguns acertos
para o adaptar à evolução das realidades. Mas não foi este o principal
obstáculo ao reconhecimento dos direitos dos trabalhadores-estudantes.
Foram sim a deficiente
ou inexistente regulamentação de tantos aspectos da lei, bem como a
ausência de fiscalização que garantisse o seu cumprimento, os
principais entraves a que o Estatuto cumprisse na plenitude as suas
funções.
Muitas das garantias e direitos seriam devidos aos
trabalhadores-estudantes foram negados e por isso
propomos nalguns casos a sua referência expressa. São exemplos o
direito à acção social escolar, a garantia do subsídio de refeição na
dispensa
para exames, ou a participação na gestão escolar e educativa dos
trabalhadores-estudantes.
Foi muitas vezes posto em causa o direito à acção social
escolar, esquecendo-se que
apesar de serem trabalhadores e portanto auferirem rendimento, têm
muitos deles carência económicas e sociais plenamente justificativas,
de uma explicitação legal que imponha a aplicação deste direito.
A lei actual garante já a manutenção da remuneração, e outros
direitos. Na prática, e como aliás denunciaram as organizações de
trabalhadores e de trabalhadores-estudantes foi frequentemente negado o
direito ao subsídio de refeição.
Daí que seja útil a clarificação inequívoca desta questão.
Por outro lado é necessária a criação de condições justas e
adequadas nos estabelecimentos de ensino, desde logo a própria
existência de ensino em horário adequado, o pós-laboral, mas também a
existência de serviços de apoio às aulas como a secretaria, a
biblioteca ou a cantina. Sem isso nãoestarão criadas as condições
necessárias para suprir as dificuldades dos trabalhadores-estudantes,
desde logo, por o serem, enfrentam. A sua participação
na gestão da escola acautela a criação destas condições, garantindo uma
maior sensibilização de quem dirige o estabelecimento de ensino.
De resto sucessivos Governos primaram pela ausência de uma política de desenvolvimento
do ensino, nomeadamente do pós-laboral.
As restrições orçamentais dos estabelecimentos de ensino, causa
directa da ausência de cursos do ensino nocturno e de condições dignas
para os trabalhadores-estudantes, a par da falta de orientações por
parte dos governos para o cumprimento do Estatuto levaram a um cada vez
mais difícil acesso, por parte dos trabalhadores
ao ensino.
Não há uma cobertura nacional de estabelecimentos de ensino,
que permita que em todo o país os trabalhadores possam ter acesso à
escola. No ensino superior as restrições ao financiamento empurram as
Escolas Superiores para a limitação dos cursos nocturnos. São
conhecidos casos como o do Instituto Superior Técnico ou do Instituto
Superior de Economia e Gestão em que se caminha, se não houver
intervenção em sentido contrário, para o desaparecimento do ensino
pós-laboral, em muitos casos impossibilitando até a conclusão dos
cursos por quem já os iniciou.
O actual Governo não mudou a política anterior e em ano e meio
nada se avançou
nesta matéria. A intenção anunciada no Programa do Governo de
aperfeiçoar a legislação referente aos trabalhadores-estudantes não
teve qualquer tradução prática. O Governo não intervém nesta matéria
deixando degradar uma situação já de si grave.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados:
O PCP ao apresentar este Projecto de Lei pretende aperfeiçoar os
direitos dos trabalhadores-estudantes nas empresas e alargar o seu
conteúdo. Desde logo alargando
a qualificação de trabalhador-estudante aos estudantes que trabalham
por conta própria, que estando desempregados se inscrevam nos Centros
de Emprego, que frequentem cursos de formação profissional ou de
ocupação temporária de jovens ou que estejam adstritos a qualquer
vínculo ao serviço militar.
Em tempo de vínculos precários e da flexibilidade horária que o
PS aprovou, mal se compreenderia que fosse de outra forma. O projecto
do PS, talvez com a má consciência que a mensagem do Senhor Presidente
da República sobre a lei da flexibilidade e da polivalência lhes
deixou, prevê em determinado momento um horário máximo de oito horas
diárias e 40 semanais para os trabalhadores-estudantes. Pareceria
positivo à primeira vista. Mas logo no número seguinte, o PS desfaz as
dúvidas prevendo que a entidade
empregadora possa afastar unilateralmente esta disposição em favor da
lei geral que flexibiliza os horários, com as consequências trágicas
para a frequência das aulas que esta norma traz para os
trabalhadores-estudantes.
O PCP propõe também a existência de um contingente especial no
acesso ao ensino
superior, enquanto existirem restrições quantitativas globais neste
acesso, isto é, enquanto se mantiver o regime de "numerus clausus" que
o PS prometeu combater.
Não é um privilégio injustificado mas sim um direito razoável
para quem está fortemente condicionado na sua avaliação por factores
extrínsecos à sua própria valia escolar.
Propomos ainda a existência de uma atenção especial no
plano pedagógico e programático aos trabalhadores-estudantes,
provavelmente com reflexos na preparação do corpo docente e na
adequação dos programas.
Consideramos igualmente que este Estatuto deve ser amplamente
divulgado junto dos estudantes uma vez que muitos não conhecem os seus
direitos. Conhecer os direitos é um passo fundamental para os exercer e
os defender. A obrigatoriedade da divulgação do Estatuto nas escolas
é fundamental para suprir esta lacuna.
Do balanço feito da aplicação do Estatuto e tendo em conta que
é nítido o propósito inicial de dar especial atenção ao reconhecimento
dos direitos no trabalho, resulta que foi também na escola que surgiram
dificuldades de aplicação do Estatuto.
A diversidade de procedimentos e de requisitos exigidos em cada
estabelecimento de ensino, muitas vezes ao arrepio do que a lei prevê,
tem dificultado o exercício dos direitos dos trabalhadores-estudantes.
E se no plano laboral a acção de fiscalização e actuação do Governo
poderá ser indirecta, é particularmente inadmissível que nos
estabelecimentos de ensino, especialmente nos públicos, que dependem
directamente do Ministério da Educação se criem entraves à aplicação da
lei.
Por isso se exige uma uniformização, salvaguardando os estudantes de uma certa discricionaridade existente.
Finalmente falemos do organismo previsto na lei para os
problemas dos trabalhadores-estudantes. A lei já o prevê, mas nunca foi
criado por nenhum governo e muito menos por este. Não se trata de mais
um serviço público a sobrecarregar a estrutura do Estado. Trata-se
sim de um instrumento fundamental para fiscalizar e denunciar os
incumprimentos, para propor regulamentações e melhorias, para garantir
no fim de contas a completa aplicação
do Estatuto. Por isso é fundamental a participação lado a lado do
Governo, dos estudantes e trabalhadores-estudantes e dos representantes
dos trabalhadores.
Falar dos trabalhadores-estudantes e do seu Estatuto é falar do
acesso de um grande número
de cidadãos, especialmente jovens, ao ensino. É falar do direito à
melhor formação pessoal e escolar. É falar da melhoria da nossa
sociedade e do
desenvolvimento do País.