Intervenção

Rede Nacional de Áreas Protegidas<br />Intervenção do Deputado Honório

Senhor Presidente da Assembleia Senhores Membros do Governo Senhoras e Senhores Deputados

Com o Decreto-lei 221/2002, de 22 de Outubro, com o qual altera regras essenciais para a constituição das Comissões Directivas das Áreas Protegidas, o Governo completa o que se pode designar por estratégia para controlar o funcionamento e para cercear o desenvolvimento, a curto e médio prazo, da Rede Nacional de Áreas Protegidas em Portugal.

Na realidade, no final do mês de Novembro, de forma algo inadvertida e inexplicável, assistimos aqui a um debate de urgência sobre as Áreas Protegidas promovido pelo PSD.

Esperar-se-ia que esse debate fosse aproveitado pelo Governo PSD/CDS para, no mínimo, anunciar uma programação para fazer dotar de planos de ordenamento todas as áreas protegidas em Portugal.

Esperar-se-ia também que o Governo PSD/CDS-PP anunciasse ao País como é que iriam ser elaborados esses Planos de Ordenamento, que tipo de discussão pública tencionava organizar em cada uma das mais de vinte áreas protegidas que continuam sem esses planos.

Como então referimos, o Governo não aproveitou esse debate de urgência para nada. Nada disse sobre o que pensava fazer nas Áreas Protegidas, limitou-se a enumerar críticas recorrente sobre a forma como o Governo PS deixara ultrapassar os períodos legais previstos para a aprovação dos Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas, esquecendo, também neste aspecto, responsabilidades idênticas de anteriores Governos do PSD.

Mas apesar do verdadeiro “flop” que, para o PSD e para o Governo PSD/CDS, constituiu esse debate de urgência, ele foi, no entanto, suficientemente explícito para confirmar (sem margem para dúvidas) que o Governo tenciona desinvestir de forma muito acentuada na Rede Nacional de Áreas Protegidas.

Durante o debate de urgência, nem o Governo, nem o PSD foram capazes de desmentir a intenção – aliás bem visível no orçamento de Estado que a Direita aprovou para 2003 – de desinvestir fortemente nas Áreas Protegidas em Portugal. De forma evidentemente cristalina, o debate de urgência confirmou que o investimento em 2003 será, quando muito, 65% do que ocorreu durante este ano.

O debate de urgência confirmou finalmente que dias muito negros podem vir a atingir a Rede Nacional de Áreas Protegidas em Portugal, e que as suas perspectivas quanto ao futuro podem vir a limitar-se a pouco mais do que a uma mera gestão corrente.

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Neste contexto, o Governo tinha que passar a controlar mais de perto as Comissões Directivas das Áreas Protegidas, e de forma muito especial teria que controlar de forma apertada a acção dos respectivos Directores. Com um tal controle, o Governo impediria que as Comissões Directivas, e em especial, os respectivos directores, levantassem “muitas ondas”, e se tornassem incómodos para a tutela, quiçá denunciassem publicamente o alheamento a que as Áreas Protegidas poderão ser votadas.

É, assim, com esses objectivos que o Governo altera o Decreto-lei 19/93 e determina que os Presidentes das Comissões Directivas das Áreas Protegidas passem a ser indicados pelo Senhor Ministro das Cidades, alterando a anterior formulação que determinava, tão somente, a nomeação desses Directores.

Para criar ilusões, o Governo acrescenta depois um ponto com o qual pretende mostrar que o processo até vai ser muito democrático e participativo, determinando que as Comissões Directivas (incluindo os respectivos Presidentes) passam a carecer de parecer prévio vinculativo das Câmaras municipais com jurisdição na área.

Só que, aquilo que (aparentemente) o Governo concede com uma mão, logo retira com a outra. É que se o parecer for negativo, há uma nova indicação ministerial e aí, mesmo que o parecer volte a ser negativo, já nada conta pois prevalecerá sempre a decisão afinal unilateral do Governo.

Isto é: se as Câmaras estiverem de acordo com a indicação do Governo, muito bem; se não estiverem, monta-se uma espécie de encenação, um artifício jurídico que o Governo encerra através da imposição da sua vontade, ou seja, do Director da sua plena e inteira confiança.

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Com a obsessão de controlar e de chamar a si a indicação dos Directores das Áreas Protegidas, o Governo esqueceu, porém, um pormenor importante.

É que os Directores das Áreas Protegidas estão equiparados a Directores de Serviços e manda a Lei (desta vez o Decreto-lei 49/99) que o recrutamento dos Directores de Serviços seja feito através de concurso.

Isto é, à face da Lei, o Governo não pode indicar os seus “homens de mão” para controlar as Áreas Protegidas. Pelo contrário, tem que fazer concursos e nomear quem tenha revelado, pelas suas aptidões e pelas suas competências técnicas, as capacidades mais adequadas para o exercício do cargo de Director de Áreas Protegidas.

O Decreto–lei 49/99 impede, assim, que o Governo rateie, entre os homens e mulheres com cartão laranja ou com cartão azul e amarelo, quantos lugares de Director de Áreas Protegidas pertencerão ao PSD e quantas irão pertencer ao CDS/PP, sendo certo que o única condição (para além da aparentemente óbvia origem partidária) para o exercício do cargo não é a da competência – pois se o fosse o concurso seria mantido -, antes será a capacidade para manter nas áreas protegidas direcções condenadas, pela ausência de meios, à gestão corrente sem projectos e sem ambição.

A obsessão de controlar é tanta que o governo legislou de forma tão superficial e precipitada que deu à luz um “impasse jurídico”.

O Governo quer controlar, indicando directores da sua total confiança.

O Governo quer submeter a gestão das Áreas Protegidas à vontade da tutela, isto é, à falta de vontade política do Ministério para defender a natureza e a necessidade da sua conservação.

O Governo quer garantir, logo à partida, o silêncio de Directores por ele indicados, impedindo que a opinião pública reconheça ao pormenor o permissível alheamento com que o Governo se prepara para tratar as Áreas Protegidas.

Mas, ao querer controlar tudo, o Governo esqueceu que os directores tinham que ser nomeados como resultado de um processo de concurso, que, em princípio, abre condições para nomear pessoas mais credíveis, sobretudo de pessoas que possam discordar das orientações genéricas de tutela, que possam contestar o mais que provável desinvestimento na Rede Nacional das Áreas Protegidas, que possam, enfim, não vender o seu silêncio por “dez reis de mel coado”.

É por isso que a presente apreciação parlamentar se justifica. Denunciamos os objectivos do governo, chamando a atenção para o impasse jurídico criado e visando repor um enquadramento que, despartidarizando o processo de nomeação dos Directores das Áreas Protegidas, garantia a sua indicação como resultado de um processo (sempre mais claro e transparente) de concurso.

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