Projecto de Resolução N.º 437/XII

Recomenda a intervenção na concorrência pela utilização do espaço marítimo garantindo a salvaguarda das pescas

Recomenda a intervenção na concorrência pela utilização do espaço marítimo garantindo a salvaguarda das pescas

Preâmbulo

Crescem os conflitos e disputas pela utilização do espaço marítimo, particularmente nos limites das águas territoriais, mas também com possíveis e futuras utilizações e usos da totalidade da plataforma continental.

São exemplos recentes os problemas ligados: (i) à colocação de equipamentos para exploração energética, caso da energia das ondas, tendo sido criada uma área piloto em Peniche, ou da instalação de torres eólicas, ainda que a título experimental, na área sob tutela da Capitania da Póvoa do Varzim; (ii) aos problemas decorrentes das atividades de pesquisa e prospeção de petróleo e gás natural (offshore), que provocam prejuízos nas embarcações de pesca na área entre Aveiro e Nazaré e na costa Algarvia; (iii) à multiplicação de equipamentos e ocupação de espaços marítimos com explorações de aquacultura, quer em estuários (exemplo da instalação de plataformas fixas para exploração de bivalves), quer em zonas costeiras para explorações piscícola, como é exemplo a instalação de infraestruturas para exploração aquícola junto às ilhas da Armona e da Culatra que restringiu as áreas de pesca a metade; (iv) até mesmo a outras limitações como acontece com a delimitação de grandes espaços para o exercício/manobras militares da marinha de guerra, a criação de áreas protegidas, como no caso do Parque Marinho Luís Saldanha, junto à Serra da Arrábida, ou ainda eventuais restrições pela realização de provas desportivas.

Todas estas e outras utilizações, que tendem a crescer exponencialmente, conflituam, à medida que se multiplicam as áreas abrangidas, com a atividade tradicional da pesca artesanal e costeira - utilizadora histórica desse espaço.

Crescem os protestos contra os prejuízos verificados na atividade pesqueira e as reclamações de indemnizações. Não podemos olvidar que enquanto para muitas das empresas envolvidas nas prospeções/concessões/experimentações estamos perante uma sondagem para extensão de áreas de negócio, para os pescadores a atividade que desenvolvem no mar representa o seu sustento e por essa via a sua própria sobrevivência e das suas famílias.

As várias intervenções efetuadas por este Grupo Parlamentar para garantir a justa indeminização de quem viu a sua atividade limitada ou até mesmo suspensa, tiveram sempre resposta negativa por parte do governo, com prejuízo para quem deixou de trabalhar e com benefício para quem viu a sua atividade sobrepor-se a outra previamente existente.

A generalidade da utilização do espaço marítimo é (ou devia ser) realizada por concessão/autorização das autoridades públicas, dado serem espaços sob domínio público, nos termos constitucionais. Os planos e projetos lançados para uma economia do mar, só farão ampliar o problema.

O que se constata, no entanto, são grandes indefinições e ambiguidades na abordagem destas questões, nomeadamente na informação atempada e adequada a armadores e pescadores, na ausência de avaliação prévia de impactos económicos e ambientais, e muito particularmente quando se trata de proceder a indemnizações compensatórias de prejuízos verificados na atividade pesqueira.

A situação exige uma evidente clarificação em matéria de enquadramento legislativo pelas estruturas do Estado responsáveis pelo acompanhamento dos projetos e problemas decorrentes e pelo estabelecimento de salvaguardas que preservem e defendam, de forma operativa e atempada, possíveis prejuízos para atividades que devem continuar a ter a prioridade absoluta na utilização do espaço marítimo. Por exemplo, não deveriam avançar novos projetos sem um estudo prévio de avaliação de impacto ambiental e a fixação rigorosa dos limites e condicionalismos da sua operacionalização, tendo como objectivo central a salvaguarda da pesca costeira artesanal.

Após várias décadas de “abandono” do mar em que, com a cumplicidade e até com a ação dos governos, a economia nacional foi desmantelando os instrumentos que lhe permitiam a utilização do mar como recurso económico, veja-se a destruição da frota pesqueira e a redução a um contingente residual de frota mercante, o “retorno” ao mar faz-se com prejuízo do único setor que nunca lhe virou costas - o setor das pescas – e que teimosamente foi resistindo ao rumo traçado. Não é justo nem legítimo que, agora que se entendeu explorar outras valências do espaço marítimo português, se vitimem os pescadores e armadores.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de Resolução:

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República:

1. A criação de um Grupo de Trabalho no âmbito dos Ministérios da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, da Economia e do Emprego e da Defesa Nacional que, em articulação com as associações de pescadores e armadores, sindicatos e representantes das comunidades piscatórias, proceda em 90 dias a uma urgente análise e tipificação das situações e problemas existentes, no sentido de criar regulamentação para o estabelecimento de mecanismos de avaliação e atenuação de impactos e indemnizatórios da atividade piscatória;
2. Que sejam tomadas medidas prévias a qualquer nova autorização/concessão que salvaguardem a atividade tradicional da pesca e a constituição obrigatória de depósito/ caução pelo promotor para indemnização de possíveis prejuízos;
3. Que, relativamente aos processos em curso - energia, prospeção de combustíveis fósseis, aquacultura - seja feita uma rápida avaliação e identificação de impactos, tomadas as medidas necessárias para a sua redução/atenuação e estabelecimento de processos de indemnização de armadores e pescadores decorrentes de interrupção temporária ou permanente da faina da pesca, e de outros possíveis prejuízos provenientes daquelas atividades, a suportar pelos promotores.

Assembleia da República, em 19 de julho de 2012

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Assembleia da República