A Resolução do Conselho de Ministros nº 35-A/2015, de 8 de junho de 2015, autoriza a “Marinha a realizar a despesa relativa à aquisição de dois navios-patrulha oceânicos da classe “Viana do Castelo”. Nesta resolução está previsto que a construção dos referidos dois navios seja efetuada “até ao montante máximo de 77 000 000, 00 EUR”, valor que será acrescido de “IVA à taxa legal em vigor”. Para tanto, está a Marinha autorizada a recorrer ao “procedimento por negociação sem publicação de anúncio, com consulta às sociedades comerciais WEST SEA S.A., e EDISOFT S.A., em regime de consórcio a construir no momento de adjudicação.” Ou seja, o que esta resolução determina é que o concurso seja efetuado por ajuste direto à empresa a quem o Governo entregou o que restou dos ENVC.
Esta decisão torna ainda mais atuais e pertinentes as conclusões que o PCP fez no final dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito para Apuramento das Responsabilidades pelas Decisões que Conduziram ao Processo de Subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo de que a opção do Governo de cancelar as encomendas para a Marinha Portuguesa (seis NPO e cinco lanchas de fiscalização costeira), foi uma decisão deliberada e foi determinante para o encerramento dos ENVC.
No âmbito da Lei de Programação Militar, e com o objetivo de dotar a Marinha de Guerra com os meios indispensáveis para a defesa e patrulhamento das águas territoriais nacionais e da vasta zona económica exclusiva portuguesa, foi encomendada aos ENVC a construção de oito navios de patrulha oceânica (NPO), sendo dois deles de combate à poluição, com opção por mais três, bem como de cinco lanchas de fiscalização costeira. O contrato foi assinado em 2009, e ascendia ao montante de 500 milhões de euros. Por dificuldades relacionadas com a execução do projeto, não apenas imputáveis aos ENVC, os prazos de entrega dos primeiros NPO não foram cumpridos e o custo da respetiva construção foi largamente excedido, sem que os ENVC tenham sido ressarcidos desse aumento de custos.
A construção dos navios Viana do Castelo e Figueira da Foz foi deficitária para os ENVC. Porém, existe o reconhecimento unânime da excelência desses navios e de que, passadas as dificuldades da construção do protótipo, a empresa ficou em condições de construir os navios seguintes em termos lucrativos.
Foi também reconhecida a forte possibilidade de construir NPO para outros países, dada a evidente excelência dos navios construídos. Aliás, haviam sido adquiridos materiais para prosseguir com a construção de mais NPO, e também de navios de combate à poluição. Porém, em setembro de 2012, o Governo PSD/CDS, pela mão do Ministro da Defesa o Dr. Aguiar Branco, decidiu cancelar a encomenda dos seis NPO em falta (e também dos NPC, os navios de combate à poluição) e das cinco lanchas de fiscalização costeira, que implicariam pagamentos aos Estaleiros da ordem de 57 milhões de euros em 2013 e de 38 milhões em 2014.
Esta decisão constituiu um rude golpe para os ENVC, na medida em que correspondeu ao cancelamento da maior encomenda de que a empresa dispunha. E constituiu um duro golpe para o país, na medida em que as vastas águas territoriais e zona económica exclusiva carecem de uma fiscalização que os atuais meios da Marinha não estão em condições de assegurar, sendo reconhecido o défice de fiscalização da vasta área adjacente às regiões autónomas.
O PCP sempre defendeu que o Governo nada fez para defender e preservar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, nomeadamente no capítulo das Ajudas de Estado/ Auxílios Estatais e a resposta enviada pela Comissão Europeia a uma pergunta dirigida pelos Deputados do PCP ao Parlamento Europeu confirma-o mais uma vez. A resposta é clara “ as autoridades portuguesas [no âmbito do procedimento formal de investigação ] não invocaram o artigo 346º, nº 1, alínea b) do TFUE, nos termos do qual qualquer Estado-Membro pode tomar as medidas que considere necessárias à proteção dos interesses essenciais de segurança e que estejam relacionadas com a produção ou comércio de armas, munições e material de guerra”, acrescentando que “tais medidas não devem alterar as condições de concorrência interna no que diz respeito aos produtos não destinados a fins especificamente militares.”
Para o PCP a Defesa Nacional, a fiscalização dos espaços marítimos sob jurisdição e salvaguarda da vida humana constitui parte da missão da Marinha. Assim como defendemos que a necessidade de navios capazes para o desempenho de tais atribuições poderia constituir uma oportunidade para revitalizar os ENVC e alcançar o indispensável reequilíbrio financeiro e desta feita ter-se viabilizado uma empresa fundamental para a região e para o país.
A decisão de entregar agora, nesta negociata sem concurso público, a construção dos dois NPO, aos privados que ficaram com a subconcessão dos ENVC, vem provar que, não só eles são necessários, como ao decisão do Governo de adiar a sua construção teve o deliberado objetivo de criar uma situação dita inevitável nos ENVC, não utilizando todos os mecanismos de defesa que tinha ao seu dispor.
O PCP esteve na primeira linha da defesa da construção naval em Portugal pela manutenção e viabilização dos ENVC.
O PCP considerou então que a defesa dos ENVC como empresa pública, bem como a defesa dos seus postos de trabalho e a consideração do valor estratégico único desta empresa para a economia nacional, não eram compatíveis com mais hesitações e delongas.
A manutenção dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo como empresa pública, a defesa dos seus postos de trabalho e a consideração do valor estratégico para a economia nacional terão que ser os objetivos centrais de um Plano de Viabilização dos ENVC.
Com esta decisão apressada por parte do Governo, confirma-se que as encomendas militares podem ser a base para a sua consolidação e evolução, a par da necessária melhoria da frota pesqueira e mercante do nosso país, bem como a penetração em outros mercados.
Neste sentido e nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo que
1.Proceda à resolução da subconcessão dos ENVC à Empresa West Sea, estabelecido ao abrigo do Decreto-Lei n.º 98/2013, de 24 de julho;
2. Proceda, no prazo máximo de 60 dias, à identificação das condições necessárias à reintegração dos ENVC na esfera pública;
3- Elabore um Plano de Viabilização e de Reestruturação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo a partir da construção dos NPO para a marinha.
Assembleia da República, em 3 de julho de 2015