Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Recomenda ao Governo que estabeleça as condições para a criação de um «contrato de transparência» no acesso ao ensino superior

(projeto de resolução n.º 245/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O CDS diz, no preâmbulo deste projeto de resolução, que os estudantes desistem do ensino superior por falta de informação. Diz também que o problema dos desempregados licenciados foi a falta de informação quando escolheram o curso. Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes, ou anda muito distraído ou, então, não conhece a realidade concreta do nosso País, porque o problema é que os jovens, hoje, desistem do ensino superior — e já o terão feito mais de 6000 estudantes desde o início do ano letivo — porque não têm dinheiro para pagar um direito constitucional que os sucessivos governos, ora do PS, ora do PSD e do CDS, transformaram num negócio.
O problema não se deve, portanto, a falta de informação, mas sim a falta de dinheiro para pagar 1000 € de propinas por ano, mais despesas de alojamento, mais despesas de transporte, mais despesas de alimentação. O problema, de facto, é este.
O problema é também o de mais de 420 000 jovens desempregados, aliás de mais de 35% de desempregados licenciados que engrossaram as filas dos centros de emprego em fevereiro. O problema não foi a falta de informação, mas a destruição do aparelho produtivo, a destruição da agricultura, a destruição das pescas.
Segundo o critério do CDS — mas podia ter sido do PSD ou do PS, porque esta ideia também não é muito nova, já o anterior Ministro Mariano Gago a apresentou, bem como o PSD, na X Legislatura —, esta ideia de fazer corresponder a escolha do curso à sua empregabilidade é uma escolha muito fácil, mas é uma opção muito errada.
O que o Sr. Deputado aqui vem dizer aos estudantes que, por exemplo, hoje estão a estudar engenharia naval no Técnico é que não vale a pena estudarem engenharia naval porque o seu Governo vai destruir os Estaleiros Navais de Viana do Castelo ou porque o seu Governo contribuiu para o encerramento dos Estaleiros Navais do Mondego.
Ou, então, vem dizer aos estudantes que estão hoje a estudar engenharia agrónoma na Universidade de Évora ou no Instituto Politécnico de Beja que não vale a pena estudarem engenharia agrónoma porque o seu Governo destruiu a nossa agricultura e, portanto, não vai haver emprego para eles.
Não podemos estar mais em desacordo no que diz respeito à perspetiva que o CDS aqui nos vem trazer.
Para o PCP, os problemas centrais do ensino superior não se devem a falta de informação, mas a falta de financiamento. É o subfinanciamento crónico que tem levado o Estado a violar a Constituição e a obrigar as famílias a pagarem cada vez mais.
O problema deve-se ao aumento das propinas e ao corte nas bolsas. E não ouvi o Sr. Deputado dizer nem uma palavra sobre a situação de mais de 8000 jovens estudantes que terão perdido a bolsa de estudo com o seu Governo! Para estes jovens, não houve uma palavra.
Qual é a liberdade de escolha para quem não pode pagar?!
Não se trata de segunda nem de terceira escolha; não podem é ir, sequer, à primeira. Já há milhares de jovens que vão para o ensino profissional porque — dizem-nos — não vão ter dinheiro para pagar propinas querem acabar o curso para começarem a trabalhar, para ajudarem a família. Já não têm o sonho de ir para o ensino superior porque a política de direita seguida pelos sucessivos governos o roubou.
Termino, Sr. Presidente, dizendo apenas o seguinte: o CDS, o PSD e o PS querem fazer corresponder às elites intelectuais as elites económicas. Infelizmente, a violação da Constituição tem sido o caminho seguido. O que o PCP propõe é o cumprimento da Constituição, designadamente do seu artigo 74.º, que refere que todos têm direito à educação, independentemente das suas condições económicas para a pagarem.
O problema não é a falta de informação, o problema é a falta de dinheiro, Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes.

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