Projecto de Resolução N.º 1308/XIII

Recomenda ao Governo medidas para a promoção do envelhecimento com direitos

Recomenda ao Governo medidas para a promoção do envelhecimento com direitos

I
O envelhecimento da população portuguesa, em virtude do aumento da esperança média de vida deve ser entendido como uma conquista civilizacional, associado que está ao desenvolvimento da sociedade e, de forma inequívoca, à criação e desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde, conquista do 25 de Abril.

Habitualmente ligadas às questões do envelhecimento da população surgem preocupações com a diminuição de nascimentos e de população jovem – preocupações legítimas, mas que não resultam diretamente do aumento da esperança média de vida. O envelhecimento da população, o aumento da esperança média de vida não tem que ser acompanhado de menos população infantil e jovem. Importa sim, a este propósito identificar e agir diretamente sobre as causas (múltiplas) que estão na origem da diminuição da natalidade.

Encarando o envelhecimento como fator de progresso civilizacional, importa também garantir que mais anos de vida são acompanhados de melhores condições de vida para os viver, garantindo-se o direito a envelhecer com direitos e dignidade.

Inseparável da garantia de uma vida autónoma, independente e digna para os reformados, pensionistas e idosos é a valorização das pensões (atuais e futuras) e o reforço das prestações sociais, conforme o PCP tem defendido e intervindo em vários momentos.

A este propósito importa também considerar a imperiosa necessidade de melhorar as condições de trabalho, nomeadamente valorizando os salários, combatendo a precariedade e garantindo uma melhor distribuição da riqueza, bem como concretizando uma efetiva valorização das longas carreiras contributivas.

O direito a envelhecer com direitos e dignidade passa por garantir aos trabalhadores o seu direito à reforma em tempo útil de vida, de forma a que usufruam do mesmo com saúde e autonomia; passa pelo reforço da proteção social e do acompanhamento social desta população; passa pelo pleno acesso à saúde – tratamentos, medicação, terapias e outros – sem que a situação económica e social da população idosa seja entrave (como tem sido em muitos casos) para acederem a este direito constitucional.

Não podemos falar do envelhecimento com direitos sem falar do direito à mobilidade, eliminando-se barreiras arquitetónicas, melhorando a rede de transportes públicos e garantindo condições sociais de acesso à mesma, bem como do direito à habitação, especialmente num momento em que idosos continuam a ser expulsos das suas casas e das cidades onde vivem para que cresça a face gananciosa do turismo – devem ser criadas condições para que este grupo social tenha uma habitação condigna, segura e estável.

O enriquecimento cultural, a aquisição de novas competências que permitam a integração no meio social onde vivem, a criação de condições propícias ao desenvolvimento integral das pessoas ao longo da sua vida e o justo direito à fruição cultural e à ocupação dos tempos livres com atividades saudáveis, a participação ativa na vida social e política são fatores essenciais para um envelhecimento com direitos e dignidade.

O combate a todas as formas de isolamento, exclusão e segregação social dos idosos, a todas as formas e expressões de violência contra as pessoas idosas é matéria que tem que merecer a atenção e intervenção concreta e atempada para que não tenha lugar.

II
Fruto da criação do Serviço Nacional de Saúde em 1979 e a disseminação dos cuidados de saúde por todo o país foi possível Portugal obter ganhos em saúde muito significativos e que hoje se traduzem no aumento da esperança média de vida.

No trabalho académico de Carla Coelho, 2016, é defendido que “a política de saúde tem influência no perfil epidemiológico e nos indicadores de saúde da população, sobressaindo que o investimento do Estado na saúde é determinante para o efeito, uma vez que os maiores ganhos em saúde foram conseguidos quando o Estado assumiu a quota-parte mais significativa da responsabilidade da saúde da população”.

Pese embora esta constatação, por opção política de sucessivos Governos da política de direita, tem-se assistido a uma desresponsabilização do Estado nas funções sociais do Estado e, obviamente, na saúde diminuído a resposta do Serviço Nacional de Saúde por via da transferência para os grandes grupos económicos que operam no setor ou através das convenções e acordos de cooperação estabelecidos com o setor social (IPSS’s, Misericórdias).

Neste sentido, sucessivos Governos PS, PSD e CDS desresponsabilizaram-se de prestar cuidados em diversas áreas, designadamente na promoção da saúde e prevenção da doença onde os cuidados de saúde primários assumem um papel relevante, assim como na área da medicina física e da reabilitação, dos cuidados continuados integrados e dos cuidados paliativos, pelo que urge inverter este rumo e aumentar a resposta pública nestas áreas.

Presentemente, em Portugal, o aumento da esperança de vida não é sinónimo de qualidade de vida, como aliás tem sido reconhecido por vários documentos da Direção Geral de Saúde. A este propósito e, fruto das condições de vida em que a esmagadora maioria dos idosos vivem (baixas reformas e pensões) é-lhes extremamente difícil providenciar uma alimentação equilibrada e diversificada, comprar integralmente a medicação, aquecer a casa e mantê-la aquecida. Por isso, não raras vezes assiste-se a idosos que chegam ao Serviço Nacional de Saúde muito fragilizados, com elevados níveis dependência e de desnutrição dificultando a recuperação.

Importa, de igual modo, referir que não são apenas os idosos que residem nas suas habitações que apresentam este estado também acontece aos que estão internados em estruturas residenciais para idosos ou outras instituições.

De forma a ultrapassar esta situação várias entidades têm vindo a defender a necessidade de haver um reforço e articulação entre os cuidados de saúde e as instituições sociais que acolhem pessoas idosas e acamados. Articulação que deve passar por um acompanhamento por parte das equipas dos cuidados de saúde primários dos utentes/doentes internados nessas unidades. Este acompanhamento poderá evitar que situações desta natureza ocorram, a que acresce o facto de poder responder a situações clínicas que podem e devem ser tratadas no domicílio desde que devidamente asseguradas pelos profissionais da instituição com supervisão das equipas dos cuidados de saúde do Serviço Nacional de Saúde evitando idas a serviços de urgência

III
O direito ao envelhecimento com direitos e dignidade depende de medidas transversais que elevem as condições de vida dos reformados, pensionistas e idosos, que concretizem direitos fundamentais, nomeadamente o artigo 72.º da Constituição da República Portuguesa que determina que “As pessoas idosas têm direito à segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o isolamento ou a marginalização social.”, bem como que “A política de terceira idade engloba medidas de carácter económico, social e cultural tendentes a proporcionar às pessoas idosas oportunidades de realização pessoal, através de uma participação ativa na vida da comunidade.”

A concretização de medidas que construam este caminho exige que o Estado assuma as suas responsabilidades nesta matéria, não transferindo para outros responsabilidades que são suas e cujo cumprimento garante a universalidade destes direitos.

O PCP apresenta esta iniciativa enquanto contributo para o debate e enquanto instrumento que aponte caminhos a percorrer.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do art.º 156.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

1. Proceda à criação de equipas multidisciplinares que tenham a responsabilidade de acompanhamento e intervenção social de proximidade junto da população idosa, especialmente de franjas em situações de pobreza, exclusão e isolamento.

2. Planifique, em articulação com as associações e organizações de reformados, pensionistas e idosos, um alargado conjunto de medidas, calendarizando a sua concretização, tendo como objetivo, entre outras matérias, as seguintes:

a) Promoção de iniciativas e atividades que mantenham este grupo social ativo, intelectual e funcionalmente;

b) Combate ao isolamento e à solidão que atingem sectores deste grupo social tanto nas zonas urbanas, como nas zonas mais desertificadas, devendo adequar-se as medidas à realidade económica e social de cada região;

c) Criação de uma rede pública de respostas e equipamentos sociais (serviços de apoio domiciliário, centros de dia, centros de noite e residências para idosos);

d) Valorização do envolvimento e participação ativa dos reformados, pensionistas e idosos e o seu movimento associativo;

e) Promoção de uma rede pública de equipamentos e serviços de apoio à terceira idade.

f) Reforço da resposta pública com medidas efetivas de promoção da saúde e prevenção da doença pela aposta nos cuidados de saúde primários;

g) Reforço da resposta pública na área dos cuidados domiciliários, por via do incremento das unidades de cuidados na comunidade existentes em todos os centros de saúde;

h) Reforço da resposta pública na área dos cuidados de medicina física e de reabilitação, dos cuidados continuados integrados e dos cuidados paliativos;

i) Reforço, em número e diversidade, dos profissionais afetos às Unidades de Recursos Assistenciais Partilhados com o intuito de responder às necessidades operacionais das unidades funcionais que deles necessitam (USF, UCSP, UCC e USP) e melhorar a resposta à população idosa;

j) Promoção da articulação entre as diferentes unidades funcionais dos cuidados de saúde primários e as instituições que acolhem pessoas idosas (estruturas residenciais para idosos, centros de dia) de forma a adequar a prestação de cuidados de saúde a estes utentes.

Assembleia da República, 2 de fevereiro de 2018

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