Exposição de motivos
Reforçar o Serviço Nacional de Saúde, dotá-lo de capacidade, exige a contratação de trabalhadores na área da saúde, para assegurar o combate à epidemia e simultaneamente recuperar os atrasos na prestação de cuidados de saúde.
O Governo procedeu à contratação de trabalhadores de saúde, mas sobretudo através da promoção de vínculos precários. Dos trabalhadores contratados no âmbito das medidas excecionais de combate à epidemia, para além de terem sido insuficientes, somente uma minoria conseguiu a integração na carreira.
Inicialmente o Governo começou por contratar os trabalhadores da saúde com contratos de quatro meses, que poderiam ser prorrogados por mais quatro meses. Entretanto decidiu que quem perfizesse oito meses até 31 de março de 2021 seriam integrados na carreira com vínculo efetivo, deixando de fora os trabalhadores contratados a partir de 1 de agosto de 2020. Em janeiro de 2021 o Governo autorizou a contratação de trabalhadores da saúde, agora a termo incerto, isto é, podendo ser despedidos a qualquer momento.
Na semana passada foi publicado o Decreto-Lei n.º 54-B/2021, de 25 de junho, que autoriza a contratação de trabalhadores da saúde a termo incerto, até 31 de agosto, mas limitado aos trabalhadores que foram contratados no passado ao abrigo das medidas excecionais de combate à Covid 19 com contrato a termo certo ou incerto, impedindo a contratação de outros trabalhadores da saúde que são fundamentais dadas as exigências que se colocam com o aumento de novos casos de infeção e a recuperação dos atrasos na prestação de cuidados.
Deste modo o Governo não permite o aumento da capacidade de resposta do SNS, essencial para responder à atual situação epidemiológica, quando estão já identificados atrasos na realização dos inquéritos epidemiológicos e no rastreamento de contactos, quando é necessário aumentar a testagem e a capacidade dos centros de vacinação, para vacinar mais rapidamente a população, acompanhar os doentes com Covid 19 no domicílio e os doentes internados e prosseguir a recuperação dos atrasos na prestação de cuidados de saúde, que em bom rigor, até ao momento não se conseguiu. É indispensável assegurar o normal funcionamento dos centros de saúde e dos hospitais, que voltam a sentir constrangimentos dada a necessidade de alocar mais trabalhadores da saúde ao combate à epidemia.
Por outro lado, de acordo com os dados publicados no Portal da Transparência, em março de 2021, o Ministério da Saúde tinha um total de 148.235 trabalhadores e em maio de 2021 tinha 147.646 trabalhadores da saúde, isto é menos, em dois meses perderam-se 589 trabalhadores da saúde. Passado o período mais grave da epidemia que foram vividos nos meses de janeiro e fevereiro, no momento de maior alivio, o Governo perdeu a oportunidade e não tomou as medidas necessárias para assegurar que todos os trabalhadores contratados permaneciam no SNS, trabalhadores esses que são necessários face à atual situação epidemiológica e serão necessários no futuro para prestar os cuidados que ficaram por fazer.
Os trabalhadores da saúde estão exaustos, devido ao número elevado de horas extraordinárias e aos elevados ritmos de trabalho. Não é possível alargar a resposta à custa dos mesmos trabalhadores. Portanto qualquer ponderação de eventual impedimento de gozo de férias pelos trabalhadores da saúde é inaceitável.
A desvalorização profissional, social e remuneratória dos trabalhadores de saúde, a desvalorização das carreiras, o desrespeito dos direitos tem levado à desmotivação e a que muitos trabalhadores da saúde optem por abandonar o SNS.
Por isso, não se compreende que o Governo em vez de respeitar e garantir direitos, estabilidade, assegurar a integração na carreira com vínculo efetivo, contratar os trabalhadores necessários, opte por um lado por limitar essa mesma contratação sem tomar as medidas necessárias para pôr fim à precariedade e para garantir que todos os trabalhadores da saúde estão integrados numa carreira com vínculo público efetivo. Deste modo o Governo mais uma vez revela que está mais preocupado com o défice do que em garantir as condições de trabalho aos trabalhadores da saúde e reforçar a capacidade do Serviço Nacional de Saúde.
A solução para o combate à epidemia não passa por novos confinamentos, mas sim, como o PCP sempre afirmou, pelo reforço das equipas de saúde pública, pelo reforço da testagem e da vacinação, pelo reforço do Serviço Nacional de Saúde para recuperar os cuidados atrasados e para assegurar todos os cuidados a que os utentes têm direito, e para isto é condição essencial o reforço da contratação de trabalhadores da saúde, bem como a garantia de todos os seus direitos e de carreiras dignas.
Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do Artigo 166.º da Constituição, que adote as seguintes medidas:
- Proceda à conversão dos contratos de trabalho a termo resolutivo certo e incerto em contratos de trabalho com vínculo efetivo a todos os trabalhadores da saúde, contratados no âmbito das medidas excecionais de combate à epidemia da Covid 19, abrangendo aqueles cujo contrato, entretanto caducou e que já não se encontram no Serviço Nacional de Saúde (SNS);
- Altere a norma do Decreto-Lei n.º 54-B/2021, de 25 de junho, que impede a contratação de trabalhadores da saúde que não tenham sido previamente contratados com contrato de trabalho a termo resolutivo certo ou incerto, de molde a possibilitar as unidades de saúde de proceder à contratação dos trabalhadores da saúde que são efetivamente necessários para combater a epidemia da Covid 19 e recuperar os atrasos na prestação de cuidados ao nível dos cuidados de saúde primários e dos cuidados hospitalares;
- Proceda à integração dos trabalhadores da saúde com contratos de substituição, na carreira com contrato de trabalho com vínculo efetivo, considerando que desempenham funções permanentes, na prestação de cuidados de saúde aos utentes;
- Prorrogue a aplicação dos artigos 2.º a 7.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2021, de 2 de fevereiro, que que estabelece mecanismos excecionais de gestão de profissionais de saúde para realização de atividade assistencial, no âmbito da pandemia da doença COVID -19, na sua redação atual.
- Garanta a autonomia das unidades do SNS na contratação de trabalhadores da saúde, dando cumprimento à Lei n.º 87/2019, de 3 de setembro, dispensando-se a autorização do Ministério das Finanças.