&quot;O sector têxtil e as deslocalizações&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Sabe-se que a indústria têxtil e do vestuário continua a ser muito importante na União Europeia alargada, empregando cerca de 2,7 milhões pessoas, fundamentalmente mulheres, depois de ter perdido cerca de 850 mil empregos e muitos milhares de empresas, entre 1990 e 2001. Registe-se que é igualmente significativa a sua manutenção para milhares de outras empresas, designadamente em áreas industriais de maquinaria para o sector, como na Alemanha e em Itália.

Assim, a ameaça de supressão total das quotas de importação, em 1 de Janeiro do próximo ano, pode causar problemas sérios ao desenvolvimento e agravar o desemprego, sobretudo em zonas de grande concentração destas indústrias, como acontece em Portugal, com destaque para o Norte e as Beiras.

A deslocalização de multinacionais está já a criar problemas, como acontece, neste momento, com a Brax Portuguesa, de capitais alemães, que encerrou a sua fábrica em Vila Nova de Gaia, e enviou para o desemprego 450 trabalhadores, na sua maioria mulheres. É uma situação inadmissível que é necessário impedir. Mas outras multinacionais estão a tentar reduzir substancialmente o emprego, pressionando as trabalhadoras a aceitarem condições inadmissíveis, de não cumprimento dos seus direitos legais, como na Finex, na Maia.

Em geral, do que se trata é de uma deslocalização para países candidatos à adesão à União Europeia, onde lhes estão a ser atribuídos apoios comunitários.Tal como já defendemos no Parlamento Europeu, é urgente que se proíba, no plano comunitário, a concessão de novos apoios a multinacionais que actuaram ilegalmente noutro país da União Europeia.

Mas, igualmente, é preciso ter em conta que o sector têxtil é estratégico para a União Europeia, com grandes potencialidades no futuro, e que pode dar um enorme contributo para a coesão económica, social e territorial. Ou acontecerá o contrário, com mais desemprego e bloqueios ao desenvolvimento, se isto não for tido em conta.

Daí as propostas que apresentámos, na defesa da óptica da fileira produtiva, sendo todas as partes essenciais para manter um todo coeso, mantendo linhas de produtos de qualidade média e produtos de alto valor acrescentado, bem como o potencial de emprego.

Daí congratular-me com a inclusão, na Resolução do Parlamento Europeu, aprovada em 28 de Janeiro último, de duas das propostas que apresentei, e que penso serem importantes para apoiar o sector têxtil e do vestuário na União Europeia, em especial em Portugal:

- a criação de um programa comunitário específico para o sector - com adequados meios de apoio – particularmente para as regiões mais desfavorecidas dependentes do sector, de apoio à investigação, à inovação, à formação profissional, às PME e ao ambiente;

- a criação de um programa comunitário que incentive a criação de marcas e a promoção externa dos produtos do sector, nomeadamente nas feiras internacionais.

É fundamental que, agora, o Governo Português exija da Comissão Europeia a criação destes programas e um verdadeiro plano de acção que seja concreto, coeso e explícito quanto aos instrumentos, meios financeiros e ao calendário, defendendo uma óptica de fileira produtiva.

Sabendo-se que a reestruturação do sector já levou à deslocalização de muitas empresas para o leste da Europa, países africanos e asiáticos, com agravamento do desemprego na União Europeia, é indispensável uma avaliação completa dos impactos sociais, económicos e territoriais, quer dos acordos bilaterais já concretizados, quer de uma eventual maior liberalização, com o fim do actual Acordo Têxtil e Vestuário para o final do ano.

Impõe-se, igualmente, que nas negociações em curso na OMC, no âmbito da Agenda de Doha, se tenham em conta as especificidades do sector têxtil e vestuário, designadamente garantindo a reciprocidade no sector em futuros acordos e nas relações comerciais entre a União Europeia e terceiros países. Os têxteis europeus não podem continuar a ser usados como moeda de troca para outros negócios de sectores de serviços ou de alta tecnologia. A manutenção do emprego e do desenvolvimento de vastas zonas exige que se mantenham os actuais direitos aduaneiros na União Europeia, que já são dos mais baixos do mundo, não aceitando novas reduções nem a eliminação de obstáculos não pautais, a não ser numa base de reciprocidade no sector, partindo sempre da base real das tarifas aplicadas e não das que foram notificadas à OMC.

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