&quot;O momento político&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Agora que já estão entregues as listas para as eleições legislativas de 20 de Fevereiro, depois dos episódios mais ou menos burlescos e discriminatórios que envolveram a formação de listas, com destaque para o episódio Pôncio Monteiro, nas listas do PSD, do Porto, o “esquecimento” de Sónia Furtozinho, responsável das Mulheres Socialistas, na lista do PS de Braga, os conhecidos “estrangeiros” em diversas listas do PS e PSD, e a recusa de Cavaco Silva em participar ao lado de Santana Lopes na fotografia do cartaz, importa dar toda a atenção à pré-campanha que está em marcha, sem esquecer alguns dos temas de maior interesse no plano comunitário.

Ora, tendo em conta que esta semana decorreu a sessão plenária de Estrasburgo, importa ter em conta dois factos, pelas consequências que irão ter no futuro: a nova Presidência Luxemburguesa e a campanha de mistificação em torno do novo Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa.

Relativamente à Presidência do Luxemburgo, que só não é uma completa desilusão porque já não tínhamos grandes expectativas sobre o seu conteúdo, lamentamos que tenha ignorado temas fundamentais. Não diz nada sobre o desemprego, apesar do seu agravamento. Não se compromete a fazer um balanço da aplicação do euro nos 12 Estados-Membros da zona euro, embora se agravem os problemas na generalidade destes países, designadamente com a valorização excessiva do euro. Não se compromete a insistir na revisão da liberalização do comércio dos têxteis e vestuário, ou, no mínimo, a utilizar cláusulas de salvaguarda em produtos mais sensíveis.

Relativamente à estratégia de Lisboa, não tira as devidas conclusões das consequências da situação actual, embora na intervenção em plenário o Primeiro-ministro do Luxemburgo tenha reconhecido que a burocracia comunitária é excessiva. Mas insiste no mesmo caminho das liberalizações e privatizações, do ataque aos serviços públicos, embora vá afirmando que não se pode aceitar dumping social. Também em relação ao Pacto de Estabilidade não propõe a sua revogação e substituição por um Pacto de Progresso Social e de Emprego, em conformidade com os objectivos de pleno emprego, de desenvolvimento económico sustentado e de coesão económica e social.

Quanto ao novo Tratado, relativamente ao qual se votou esta semana um relatório, inscrevendo-se no triste processo de mistificação e de propaganda em torno da dita constituição europeia, há que clarificar que o Parlamento Europeu não tem qualquer legitimidade para "aprovar" Tratados, como se pretende fazer crer num dos pontos da referida resolução.

Não ingenuamente, e irmanadas, a maioria de direita (PPE) e social democrata (PSE) do Parlamento procura, assim, fazer passar a falsa ideia que o projecto de Tratado foi "aprovado" pelo PE, como erradamente alguns órgãos de comunicação social noticiaram e, saliente-se, antes da realização de qualquer referendo nacional a este projecto.

A intenção é clara: que a votação realizada venha a ser utilizada como mais um meio de pressão e propaganda a favor da (mal) dita constituição europeia no processo de ratificação, ou NÃO!, por parte dos Estados, aliás, procurando interferir numa competência que só a estes pertence.

É inadmissível que esta votação tenha sido acompanhada de música, da largada de balões, da colocação de faixas e do desfraldar de bandeiras "com as referidas palavras-chave e "sim" em várias línguas", silenciando qualquer crítica a este projecto.

Das diversas razões da nossa oposição a este novo Tratado destaco o reforço do centralismo, do federalismo e da burocracia europeia, a insistência em políticas que se tornam únicas para todos os Estados que são membros da União, independentemente das suas situações concretas, o aprofundamento do neoliberalismo e da militarização da Europa.

As imposições cegas do Pacto de Estabilidade, do Banco Central Europeu e das políticas monetária e cambial únicas nos países da zona euro, independentemente da situação de cada país, têm como resultado o agravamento da situação social, o aumento das desigualdades decorrentes das privatizações de sectores estratégicos e de serviços públicos, acompanhadas de ataques sérios aos direitos de quem trabalha.

Também conhecemos a prática destas políticas neoliberais na agricultura, nas pescas e na política de comércio externo, com os retrocessos económicos, o desemprego e a destruição da produção de cada vez mais vastos sectores de países de economia mais frágil.

Mas não podemos, igualmente, estar de acordo com uma campanha de promoção do novo Tratado, pouco democrática e nada pluralista, baseada nos argumentos dos apoiantes, esquecendo as razões dos que são contra porque lutam por uma Europa social, mais democrática, baseada no princípio de Estados soberanos e iguais em direitos e empenhada na paz.