&quot;O desemprego e a ciência&quot;<br />Artigo de Bernardino Soares na &quot;Capital&quot;

1 - A propaganda do Governo para justificar o pacote laboral incluía frequentemente cínicas previsões de que as alterações legais ajudariam a criar mais emprego. Seriam mesmo indispensáveis para garantir o aumento do emprego.

Entretanto Portugal aparece na triste liderança do crescimento do desemprego nos últimos doze meses. De 4,4% para 7%, isto é, o mais alto crescimento da União Europeia. Para além disso regista-se uma tendência para o agravamento do desemprego entre as mulheres (sendo a taxa do desemprego feminino de 8,3%) e entre os jovens (14,3% dos menores de 25 anos).

O Governo teima em não responder a uma importante pergunta: se o código do trabalho iria servir, e era até indispensável para a criação de emprego, por que razão estando já aprovado na Assembleia da República, continuamos a assistir a sucessivas deslocalizações, falências, encerramentos de empresas e despedimentos?

Na verdade a demagógica cantilena de Durão Barroso e Bagão Félix era apenas areia deitada para os olhos de quem vai sofrer na pele as gravíssimas alterações à legislação laboral em curso, caso sejam promulgadas. Diziam por exemplo que o aumento de três para seis anos do limite máximo de contratação a prazo de um jovem ajudaria a diminuir o desemprego juvenil. Afinal este cresce de 8,7% para 14,3% num ano, mesmo com tais alterações à vista.

Com estas medidas o Governo aposta em manter um modelo económico e social assente cada vez mais em baixos salários e na restrição de direitos. Claro que isso promove apenas o investimento de empresas que assentam a sua produção na exploração da mão-de-obra barata e não na inovação tecnológica e organizacional.

2 - Se houver dúvidas sobre a política de vistas curtas do Governo e sobre o seu desprezo pelo desenvolvimento científico e tecnológico, as medidas até aqui tomadas na área científica são esclarecedoras. O estrangulamento financeiro a que foram sujeitos os laboratórios do Estado, a perda de autonomia que lhes criou graves dificuldades de funcionamento, por exemplo na cooperação internacional, ou a escassez sistemática e agravada de recursos humanos, são algumas das medidas que fragilizam um sector que devia ser um dos principais motores do desenvolvimento do país e que para além disso desempenha várias missões de interesse nacional.

O último capítulo conhecido desta política é a fusão do INETI e do IGM (Instituto Geológico e Mineiro) numa nova entidade (cuja natureza jurídica está ainda indefinida) aumentando a instabilidade e a incerteza em ambos os institutos. O que já se sabe do processo faz prever a continuação do sub financiamento e das carências de pessoal – correndo-se o risco de enveredar ainda pela dispensa de profissionais, que podem ser enviados para o quadro de supranumerários – pela restrição de competências e pela dispersão de núcleos de investigação.

A aposta nos baixos salários e na restrição de direitos e o desinvestimento na política científica são duas faces da mesma política económica e social cujos efeitos estão à vista.