&quot;Literatura&quot;<br />Ruben de Carvalho no &quot;Diário de Notícias&quot;

Anda novamente o Dr. Santana Lopes nas bocas do mundo e, claro, já houve quem cruelmente recordasse o picaresco agradecimento a Machado de Assis pelo seu Dom Casmurro. Em rigor, penso contudo que este assunto tem sido tratado de forma pouco atenta.

A verdade é que Machado de Assis revelou algumas originalidades na construção do seu tempo literário, optando até por titular um seu primeiro capítulo de Óbito do Autor e ali escrever: «Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adoptar diferente método: a primeira é que não sou propriamente um autor defunto mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo».

O carácter involuntariamente póstumo do municipal agradecimento pode assim, com alguma generosidade, ser integrado no universo de Assis, subsistindo todavia uma dúvida: será que no educado gabinete presidencial alguém estará convicto de que As Memórias Póstumas de Brás Cubas - que abrem com aquele providencial excerto - são da autoria de José Saramago?...