&quot;Contra a constituição europeia&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Comércio do Porto&quot;<span class="titulo2"><span class="titulo2"><span class="titulo2">

É conhecido que, no Parlamento Europeu, damos particular atenção às implicações das políticas comunitárias em Portugal e na vida quotidiana das pessoas, procurando apresentar propostas alternativas, após diálogo com os sectores interessados, na defesa da produção portuguesa, da identidade cultural e da soberania de Portugal, dos direitos de quem trabalha, de serviços públicos de qualidade, da participação democrática e popular na construção de uma Europa mais solidária, de paz, progresso e desenvolvimento. É o nosso empenhamento que mantém a luta contra as deslocalizações de multinacionais, pela defesa dos direitos dos trabalhadores e do desenvolvimento das zonas atingidas pelo flagelo do desemprego, seja na têxtil, vestuário e calçado, seja no material eléctrico, na metalurgia ou nas componentes para a indústria automóvel. Foi a nossa firmeza na luta pelos dos direitos de pesca no Continente e nas Regiões Autónomas, pelo apoio aos pescadores e pela manutenção da nossa soberania na ZEE que mantém na ordem do dia a revisão de medidas injustas de liberalização do acesso às águas e aos recursos pesqueiros, depois da brutal redução do esforço de pesca a que os pescadores portugueses estiveram sujeitos. Tal como mantemos na ordem do dia a luta na defesa do sector têxtil, da indústria naval, do apoio aos produtores do leite, do vinho, do azeite, das frutas e legumes, da promoção da agricultura familiar e do pequeno comércio. Novas lutas se avizinham, mas, no imediato, queria chamar a atenção para a dita constituição europeia. Temos denunciado o projecto de novo Tratado, por discordarmos do projecto de sociedade que ali se defende, de aprofundamento do capitalismo cada vez mais agressivo, definindo um ordenamento neoliberal da sociedade, mercantilizando tudo, desvalorizando cada vez mais as pessoas, secundarizando os aspectos sociais que dizia defender. Em Portugal, estamos ainda longe do debate alargado e pluralista que se impõe e que um referendo sobre o novo Tratado facilitaria. Infelizmente, o que se está a preparar é, no mínimo, uma farsa. A pergunta aprovada na Assembleia da República é totalmente incompreensível para a esmagadora maioria dos portugueses. Esta questão que, de facto, inclui três perguntas sem ligação directa, sobre aspectos muito parcelares, exige um conhecimento comparativo e pormenorizado dos Tratados, o que a generalidade da população não tem. Mas, para além disso, deixa de fora questões essenciais, designadamente: as competências exclusivas e partilhadas da União, onde se insere a problemática central do primado do direito e, por exemplo, toda a polémica recente da competência exclusiva na conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas. Ficam igualmente de fora questões tão importantes como: políticas e acções internas, incluindo a política de concorrência e as nossas conhecidas privatizações; as políticas monetárias e o conhecido Pacto de Estabilidade com as consequências desastrosas no desemprego e degradação de serviços públicos; espaço de liberdade, segurança e justiça e as tentativas de limitar liberdades e direitos das pessoas, incluindo dos imigrantes; política externa e de segurança comum e a crescente militarização da União Europeia; a política comercial comum e os graves problemas do liberalismo comercial nos sectores industriais portugueses como os têxteis, vidro e cristalaria, ou mesmo no vinho e no leite. Como se vê, trata-se de temas que incluem aspectos essenciais, com consequências especialmente perigosas para a defesa dos interesses portugueses. Assim, resta saber o que pretendem o PSD, o PS, e o CDS com a tal pergunta. Baralhar os portugueses? Desmobilizar as pessoas da participação no referendo? Provocar a declaração de inconstitucionalidade, para que não haja qualquer referendo? Os próximos tempos vão clarificar um pouco os seus objectivos. Mas, para já, trata-se de uma autêntica farsa, que pode ter implícita uma verdadeira fraude face à vontade manifesta da maioria dos portugueses de se querer pronunciar, através de um referendo, sobre o conteúdo global da dita constituição europeia, de uma forma clara e precisa. Para o que bastaria terem aceite as propostas que o PCP tem apresentado, incluindo na revisão constitucional. Por isso, a luta do esclarecimento sobre o que se está a passar na União Europeia é da maior importância para impedir que se subalternize ainda mais o nosso país, se percam mecanismos fundamentais de defesa dos interesses do povo e do País. Pela nossa parte, continuaremos a juntar a nossa voz para estimular e favorecer a intervenção popular, a solidariedade internacionalista e a luta por uma alteração profunda das orientações e das políticas comunitárias, para dar prioridade absoluta ao emprego com direitos, à dinamização da nossa produção, à defesa do aparelho produtivo nacional, ao investimento e a serviços públicos de qualidade.

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