&quot;A triste realidade portuguesa&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Sabemos que as condições de vida da população de um país não se medem apenas em função dos índices sócio-económicos. E se dúvidas houvesse sobre isso, o recente documento da Comissão Europeia sobre a situação social nos 25 Estados que são membros da União Europeia alargada demonstra como, apesar de níveis de rendimento mais baixos, nos países que recentemente aderiram há heranças sociais e culturais, resultantes de dezenas de anos de um sistema socialista, que ainda agora influenciam positivamente a sua situação. Assim, sendo verdade que, com o alargamento em Maio passado, a população da União Europeia aumentou de 20%, mas o PIB apenas cresceu de 4,5%, o que acentua as disparidades regionais na distribuição do rendimento e reforça a importância da necessária promoção da coesão económica e social, exigindo aumento do orçamento comunitário, pode-se também constatar que os níveis de pobreza relativa nos novos Estados membros tendem a ser moderados, ainda que os níveis de rendimento absoluto sejam baixos. Quando comparamos a situação portuguesa com a dos países que recentemente aderiram, ou mesmo com alguns candidatos, verificamos que o nosso país continua praticamente na cauda seja no que se refere aos níveis de educação, seja da pobreza relativa ou da baixa participação cívica, tornando claro que, apesar dos choques brutais que a população dos países da Europa de leste viveu, no início dos anos noventa, com a destruição do regime socialista, os ganhos sociais que tinham ainda hoje se reflectem positivamente na sua vida. Assim, por exemplo, no que se refere ao ensino secundário superior, Portugal tem a pior situação da União Europeia a 25 na população mais idosa e só é ligeiramente ultrapassado por Malta na faixa etária dos 25-34 anos. É espantoso verificar que cerca de 81% da população entre os 25-64 anos completou o ensino secundário superior nos dez novos Estados membros, contra apenas 65% na média dos países da União Europeia a 15, mas menos de 40% em Portugal, mesmo para o escalão 25-34 anos, não chegando a 15% nos que têm mais de 45 anos. Igualmente interessante é verificar que, apesar das críticas que o relatório da Comissão faz à heranças dos regimes socialistas nos novos Estados-membros, os dados reconhecem que a participação cívica nesses países (medida em termos de participação em qualquer forma de associação) é superior à que se vive nos países do sul da União Europeia a 15, com destaque para Espanha, Portugal e Grécia onde a participação cívica é mais baixa que nos países recém entrados, mantendo-se na cauda da União Europeia alargada. No entanto, em termos de saúde e de esperança de vida, importa sublinhar que a situação se agravou nos países onde o regime socialista e os seus sistemas de saúde, segurança e protecção social foram desmantelados. Veja-se o que diz o documento da Comissão Europeia sobre esta situação: “A partir de finais da década de 1980, quando os novos Estados-membros da Europa Central e Oriental iniciaram o período de transição, observou-se uma deterioração da esperança de vida. As diferenças entre os países da EU-15 e os novos Estados-Membros da Europa Central e Oriental agravaram-se de cinco anos, em 1990, para 7 anos, em 1994, e 6 anos, em 2000”. Isto significa que, ao contrário do que prometeram à população desses países quando desmantelaram parte dos seus sistemas sociais públicos, em vez de evoluírem, ainda agora estão com níveis inferiores aos que tinham no final dos anos oitenta, apesar de alguma recuperação após a entrada das ajudas comunitárias de pré-adesão. Claro que as diferenças nas condições de vida da União alargada se reflectem no nível de satisfação dos cidadãos e na forma como se sentem excluídos. Na União Europeia a 15, a exclusão social declarada pelas pessoas varia entre 7% na Dinamarca e Países Baixos e 15% em Portugal. Nos novos membros, a Eslovénia e a Polónia apresentam valores inferiores à média de 12% da União Europeia, o que não deixa de ser significativo da situação dramática que se vive em Portugal, onde a pobreza atinge efectivamente cerca de 20% da população, uma das situações mais graves da União Europeia alargada.Os recentes escândalos das pensões, ordenados e mordomias da elite portuguesa que transita entre governos e administrações de empresa públicas ou participadas, enquanto o desemprego e a pobreza crescem, apenas sublinham a profunda crise e a mais vil tristeza que se vive no nosso país, a exigir uma urgente viragem política.

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